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Radiologia31 julho 2025

Meios de contraste iodados: novas diretrizes para prevenir reações

Novo consenso desestimula pré-medicação em reações leves a contraste iodado e orienta conduta em casos graves.
Por Leandro Lima

Os meios de contraste iodados (MCI) são amplamente empregados na radiologia, especialmente nas tomografias computadorizadas (TCs).  

Apesar das reações adversas terem se tornado infrequentes após a incorporação dos agentes hipoosmolares, os eventos de hipersensibilidade imediata ainda ocorrem em 0,3 a 1,4% dos pacientes, sendo potencialmente graves.  

A maioria das reações, contudo, são leves a moderadas, de forma que as fatalidades são raras (0,0006%). Logo, toda clínica de radiologia deve observar os pacientes por tempo mínimo de 15 a 30 minutos após a administração do MCI e estar preparada para o tratamento da anafilaxia. 

Diante da inconsistência de estudos prévios e dos posicionamentos de diferentes sociedades de radiologia e alergologia, um painel de dez renomados especialistas do American College of Radiology (ACR) e American Academy of Allergy, Asthma & Immunology (AAAAI) revisou criticamente a literatura sobre as reações aos MCI endovenosos. 

Registrar detalhadamente as reações em prontuário 

Qualquer reação adversa ao MCI deve ser minuciosamente registrada em prontuário, incluindo elementos como: 

  • Descrição dos sintomas; 
  • Gravidade da reação; 
  • Tempo de latência (reações imediatas < 1h, a maioria não mediada por IgE; e reações tardias > 1h após a administração do contraste); 
  • Meio de contraste especificamente empregado. 

Tais informações são essenciais para orientar a conduta em exames futuros, permitindo a escolha de agentes mais seguros e a elaboração de estratégias de profilaxia. 

É importante notar que nem todas as reações são de hipersensibilidade. As reações não alérgicas podem ser classificadas em: 

  • Leves: náuseas, vômitos, cefaleia, ansiedade, disgeusia, flushing isolado, calafrios, sensação de aquecimento corporal e tontura;  
  • Moderadas: dor torácica e reação vasovagal com síncope; 
  • Graves: arritmias, convulsões e emergências hipertensivas.  

Pré-medicação: quando está indicada? 

Uma das principais mudanças desse novo paper foi relativa à restrição do uso rotineiro de pré-medicação (anti-histamínicos + corticoides). 

Os esquemas de corticoides mais empregados incluem: 

  • Prednisona 50 mg/dose em 3 doses, antecedendo a administração do MCI em 13, 7 e 1 hora; 
  • Metilprednisolona 32 mg/dose em 2 doses, antecedendo a administração do MCI em 12 e 2 horas. 

Na presença de histórico de reações leves e imediatas ao MCI (urticária localizada, prurido ou rinorreia) não mais se recomenda a pré-medicação. Nesses casos, a simples substituição do meio de contraste é considerada uma intervenção suficiente. 

Por outro lado, diante de histórico de reações graves (anafilaxia, angioedema com dispneia, broncoespasmo ou hipotensão), recomenda-se considerar exames alternativos e sem uso de contraste iodado. Na indisponibilidade de alternativas viáveis, a pré-medicação ainda é indicada, e o exame deve ser realizado em ambiente hospitalar, assistido por equipe treinada e com disponibilidade de suporte avançado imediato dedicado à anafilaxia. 

Nas reações moderadas (urticária com rápida disseminação para ≥ 50% da superfície corporal total ou angioedema sem comprometimento respiratório), a recomendação é pela decisão compartilhada entre o médico e o paciente. 

Troca do meio de contraste: uma estratégia eficaz 

A substituição de um meio de contraste previamente implicado em reação de hipersensibilidade leve a moderada, por outro agente da mesma classe, tem se mostrado uma estratégia profilática superior à pré-medicação, com base em dados de estudos retrospectivos e meta-análises.  

Manejo da anafilaxia 

O tratamento da anafilaxia é pautado nos seguintes pontos: 

  1. Interrupção imediata da infusão do agente suspeito; 
  1. Adrenalina IM (0,01 mg/kg de uma solução a 1:1.000 – em indivíduos > 50 kg, 0,5 mL da ampola de 1 mg/mL), preferencialmente no músculo vasto lateral da coxa, podendo ser repetida em 5-10 minutos se for necessário. A adrenalina endovenosa pode ser necessária na anafilaxia protraída; 
  1. Expansão volêmica e posição supina com elevação dos membros inferiores (Trendelenburg) devem ser realizadas em caso de hipotensão arterial; 
  1. Oxigenoterapia suplementar se houver hipoxemia ou sintomas respiratórios; 
  1. Anti-histamínicos (úteis nas alterações cutâneas, como urticária e prurido), corticoesteroides (o emprego rotineiro tem sido questionado pelo início de ação lento e possível ineficácia em prevenir a anafilaxia bifásica, caracterizada pela recorrência dos sintomas nas primeiras 72 horas) e broncodilatadores podem ser administrados após a estabilização clínica inicial.  
  1. Tempo de observação mínimo de 6 horas. 

Reações tardias e uso de corticosteroides 

As reações tardias ao contraste iodado, a maioria cutânea, são menos comuns e, em sua maioria, leves. Não há evidência de que a pré-medicação seja útil para evitá-las.  

Nos casos em que tenha ocorrido reações tardias graves (síndrome de Stevens-Johnson ou DRESS), o uso do meio de contraste iodado deve ser evitado. 

Mitos comuns: alergia a frutos do mar, iodo e povidona-iodo (PVPI) 

Alergia a mariscos (crustáceos e moluscos) ou ao iodo não representa um fator de risco para reações ao meio de contraste iodado. Essas associações, embora arraigadas na prática clínica, são equivocadas e desprovidas de respaldo fisiopatológico ou epidemiológico.  

Testes cutâneos: quando são úteis? 

Os testes cutâneos (prick e intradérmico) com meios de contraste são potencialmente úteis na investigação de pacientes com histórico de reações graves, especialmente quando se depara com a necessidade de um novo exame contrastado.  

Apesar da limitada sensibilidade, um teste negativo pode orientar na escolha de um agente alternativo. Contudo, a disponibilidade de testes cutâneos e a padronização dos protocolos ainda são limitadas. 

Mensagens práticas 

  • O consenso da ACR/AAAAI de 2025 representa um avanço importante na padronização de condutas frente a pacientes com histórico de reações a meios de contraste iodados (MCI).  
  • As falsas contraindicações ao uso de MCI foram novamente desmistificadas, sobretudo a alergia relatada a frutos do mar ou iodo. 
  • O uso rotineiro da pré-medicação foi desestimulado diante de reações leves, sendo preferível apenas a troca do agente específico. A pré-medicação mantém a sua indicação na profilaxia de reações graves, quando não houver disponibilidade de exames de imagem alternativos. 
  • Há de se ressaltar que que muitas das recomendações foram baseadas em estudos heterogêneos e de baixa qualidade metodológica, embora seja inegável que o consenso representa um passo relevante para uma prática clínica. 

Leia também: Radiologia e Inteligência artificial

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Referências bibliográficas

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