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Psiquiatria16 dezembro 2024

Chemsex: o que os profissionais de saúde precisam saber?

Chemsex é a prática de atividade sexual sob o efeito de substâncias psicoativas, que é bastante difundida na comunidade gay e bissexual
Por Tayne Miranda

Chemsex é a prática de atividade sexual sob o efeito de substâncias psicoativas, que é bastante difundida na comunidade gay e bissexual, particularmente em cidades grandes ao redor do mundo. No chemsex o uso de substâncias psicoativas ocorre imediatamente antes ou durante a atividade sexual, com o objetivo de facilitar, prolongar ou mesmo intensificá-la. O uso de substância permite que os usuários pensem, sintam e façam coisas que não fariam quando sóbrios. 

As substâncias mais utilizadas nessa prática são mefedrona, MDMA (ecstasy), metanfetamina, cocaína (essas substâncias potencializam o desempenho físico e sexual, intensificam a excitação sexual e proporcionam um aumento temporário na autoestima e na sensação de autoeficácia.), GHB (possui efeito desinibidor, ajudando a relaxar) e cetamina (modifica os sentidos, aumentando a percepção do toque, cheiro, audição e gosto). Inibidores de fosfodiesterase podem ser usados concomitantemente para aumentar e estender a performance sexual e superar a disfunção erétil que acompanha o uso de metanfetamina.  

Para além da busca por prazer, há razões ligadas as vulnerabilidades e preconceitos sofridos pela população LGBTQIA+ que estão associadas à prática do chemsex em algumas pessoas. O preconceito aumenta o risco de homonegatividade internalizada, que se desdobra em sentimentos de marginalização e solidão, levando a um medo da rejeição que torna difícil para homens gays e bissexuais desenvolver, sustentar e alimentar relacionamentos íntimos. Nesse contexto, o chemsex se torna um meio atraente de escapar desses estressores, funcionando como uma estratégia de enfrentamento.  

Leia mais: Uso de metanfetamina no Brasil associado ao chemsex

O ambiente do chemsex também se configura como um espaço libertador, onde minorias sexuais podem escapar da heterossexualidade compulsória e da heteronormatividade e assim, lidar com isso. O chemsex fornece uma saída na qual homonegatividade internalizada pode ser compartimentada, colocada de lado na estrutura de identidade, e uma intimidade e conexão pode ser estabelecidas nas relações, mesmo que temporariamente. O chemsex pode servir ainda como uma forma de escapar dos sentimentos negativos gerados pela pressão social para se adequar a padrões de corpo, aparência física e normas de masculinidade. 

O chemsex, portanto, é também reforçado pelas funções psicológicas que possui, levando muitas pessoas a não mais se satisfazerem com sexo sóbrio e serem incapazes de se envolver em sexo sem substâncias.  

Além do risco de uso abusivo ou dependência de substâncias e das interações entre elas, vários estudos mostram uma associação entre chemsex e aumento do risco de transmissão de infecções sexualmente transmissíveis, uma vez que ele muda o comportamento sexual dos praticantes, levando a uma maior probabilidade de sexo anal desprotegido (barebacking), sexo em grupo, maior propensão a práticas sexuais arriscadas, como fisting, sexo transacional compartilhamento de brinquedos sexuais e uso de drogas injetáveis. Por fim, praticantes do chemsex estão em maior risco de experienciar práticas sexuais sem consentimento, particularmente por conta das alterações da consciência promovidas pelas substâncias.  

É frequente que pacientes não revelem tais comportamentos ou não busquem ajuda quando necessário pelo receio do julgamento ao revelar o envolvimento práticas sexuais não hegemônicas e uso de substâncias ilícitas. Mesmo em serviços especializados no uso de substâncias impera o desconhecimento sobre chemsex. É imprescindível que os profissionais de saúde conheçam as suas nuances, de modo a promover comportamentos sexuais mais seguros. Tal prática impacta as pessoas de forma diferente e é importante não patologizar, culpar ou estigmatizá-la, revitimizando uma população já estigmatizada em nossa sociedade. Devemos notar ainda que parte homens gays e bissexuais que praticam chemsex conseguem manejar o seu envolvimento nesta prática e não desenvolvem problemas de saúde.  

Para aqueles que têm implicações negativas do chemsex em sua saúde sexual e mental, é necessária uma abordagem multidisciplinar, que considere os fatores sociológicos, culturais, psicológicos e biológicos envolvidos na prática. Embora a associação entre chemsex e dependência não seja claramente compreendida, a literatura relata semelhanças com transtornos por uso de substâncias. Para pacientes com uso problemático de substâncias, a abordagem deve priorizar a redução de danos, oferecendo um espaço onde as pessoas possam falar sobre suas experiências com chemsex e serem tratadas sem julgamentos de valores e com dignidade, compaixão e respeito. É necessário ainda orientar sobre as formas de prevenção de todas as ISTs, sendo que a Prolifaxia Pré-Exposição (PrEP) possui um papel fundamental como uma estratégia de redução de danos durante o chemsex para limitar o risco de transmissão do HIV. 

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Referências bibliográficas

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