Durante o Congresso Mundial de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (WCPGHAN 2024), foram discutidas as diferentes condições clínicas relacionadas à sensibilidade ao trigo e ao glúten, incluindo a alergia ao trigo mediada por IgE, anafilaxia induzida por exercício dependente de trigo e sensibilidade ao glúten/trigo não celíaca. Trazendo os desafios em diagnosticar com precisão essas condições, particularmente a sensibilidade ao trigo não celíaca. De uma forma mais objetiva, segue uma visão de da uma destas condições abaixo:

Alergia ao trigo mediada por IgE:
- Uma condição alérgica relevante em crianças.
- Suspeitar quando estiver com um forte histórico de atopia (outras alergias alimentares, urticária, dermatite atópica, asma).
- Os sintomas (pele, respiratórios, GI – gastrointestinais) variam com a idade, com crianças mais novas mais propensas a ter sintomas GI e crianças/adultos mais velhos mais propensos a ter anafilaxia.
- Anticorpos IgE específicos para alergias frequentemente desaparecem até os 7 anos; níveis mais baixos de anticorpos são mais propensos a resolver a alergia.
Anafilaxia induzida por exercício dependente de trigo:
- Condição rara, vista principalmente em adultos, embora alguns casos em adolescentes tenham sido relatados.
- Anafilaxia ocorre 10-60 minutos após o exercício, com ingestão de trigo 4 horas antes.
- A gravidade dos sintomas se correlaciona com as concentrações séricas do principal alérgeno, a omega-5-gliadina.
Sensibilidade ao glúten/trigo não celíaca:
- Descrita desde os anos 1970-80, mas mais reconhecida em crianças no século 21.
- Prevalência estimada em 1-10%, possivelmente em ascensão.
- Agente ofensivo não claro – pode ser o glúten ou outros componentes do trigo (por exemplo, frutanos, fibras).
- Sintomas incluem GI (semelhante à Síndrome do Intestino Irritável – SII) e não GI, como fadiga.
- A fisiopatologia não é bem compreendida, mas pode envolver aumento da permeabilidade intestinal, ativação imunológica e hipersensibilidade visceral.
- O diagnóstico é desafiador, pois os sintomas podem se sobrepor a outras condições como a SII.
Doença Celíaca vs. Sensibilidade ao Glúten/Trigo Não Celíaca:
- A doença celíaca possui critérios diagnósticos claros (HLA, anticorpos, histologia).
- A sensibilidade ao trigo não celíaca não possui testes diagnósticos definitivos, podendo representar um “cesto de lixo” de condições.
- A natureza transitória vs. vitalícia das condições não é clara.
Abordagem aos Anticorpos Celíacos Positivos:
- Importância de entender por que o teste foi solicitado (rastreamento vs. sintomático).
- Significado dos níveis de anticorpos – níveis mais altos são mais preditivos de doença celíaca.
- Cautela com anticorpos isolados positivos contra gliadina deaminada, pois podem ser transitórios.
Mensagem prática:
- O diagnóstico preciso das condições clínicas relacionadas ao glúten é crucial para evitar dietas sem glúten desnecessárias.
- A doença celíaca é uma condição vitalícia, enquanto a alergia ao trigo e a sensibilidade ao trigo não celíaca podem ser transitórias.
- A interpretação precisa dos testes sorológicos relacionados ao glúten é essencial;
- Mais pesquisas são necessárias para melhor entender a fisiopatologia e os critérios diagnósticos para a sensibilidade ao trigo não celíaca
Confira a cobertura completa do WCPGHAN 2024.
Autoria

Jôbert Neves
Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).
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