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Pediatria15 novembro 2025

Tratamento do H. pylori em crianças: estratégia para prevenir câncer gástrico?

Veja o que estudos recentes dizem sobre tratar H. pylori em crianças e se isso pode influenciar o risco futuro de câncer gástrico.
Por Jôbert Neves

A infecção por Helicobacter pylori é uma das mais comuns em todo o mundo. Estima-se que cerca de um terço das crianças estejam infectadas, especialmente em países com menor renda e acesso limitado a saneamento básico. Embora muitas vezes não cause sintomas na infância, essa bactéria é reconhecida como um agente causador de câncer gástrico, o que levanta uma dúvida importante: devemos tratar crianças assintomáticas com H. pylori para prevenir complicações graves no futuro? 

Uma publicação recente no The Journal of the American Medical Association (JAMA), fomentou essa discussão, trazendo dados de estudos realizados em adultos  que demonstram que a erradicação da bactéria antes do surgimento de alterações na mucosa gástrica pode reduzir significativamente o risco de câncer.  Dentre eles, um estudo conduzido por Wong e colaboradores, que acompanhou pacientes por mais de duas décadas. Os resultados mostraram que o tratamento precoce em indivíduos sem lesões gástricas visíveis levou a uma redução consistente na incidência de câncer gástrico, reforçando a teoria que descreve uma progressão gradual da mucosa gástrica desde a inflamação crônica até o desenvolvimento de carcinoma invasivo. 

Na infância, a maioria dos pacientes infectados ainda não apresenta alterações estruturais na mucosa gástrica. Isso sugere que o tratamento nessa fase poderia interromper precocemente o processo de transformação celular que leva ao câncer. Além disso, a infecção por H. pylori está associada a outras condições clínicas relevantes, como gastrite, úlcera péptica e anemia por deficiência de ferro, que também podem justificar a intervenção. 

Apesar de todas essas discussões e evidências apresentadas, existem limitações importantes que precisam ser consideradas. Ainda não há estudos de longo prazo em crianças que confirmem os benefícios da erradicação em relação à prevenção do câncer. O tratamento envolve o uso de antibióticos, o que pode contribuir para o aumento da resistência bacteriana, especialmente em regiões onde essa resistência já é elevada,  e essa é uma preocupação alarmante. Também há o risco de reinfecção, principalmente em ambientes com condições sanitárias desfavoráveis, e dificuldades de adesão ao tratamento em crianças pequenas. 

Apesar dessas preocupações, estudos microbiológicos mostram que o H. pylori pode causar alterações epigenéticas e inflamatórias que persistem mesmo após o tratamento. Isso reforça a ideia de que quanto mais tempo a bactéria permanece no organismo, maior o risco de danos duradouros. A erradicação precoce pode reduzir esses efeitos e oferecer proteção a longo prazo. 

De forma prática: 

  • Avalie o contexto epidemiológico e o histórico familiar antes de decidir pelo tratamento; 
  • No Brasil, não há recomendação para tratamento de crianças assintomáticas de forma mandatória;  
  • O artigo publicado no JAMA sugere considerar tratar crianças assintomáticas com H. pylori quando houver fatores de risco relevantes; 
  • Garanta seguimento clínico e exames para confirmar a erradicação da bactéria. 

Autoria

Foto de Jôbert Neves

Jôbert Neves

Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa  de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).  Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).

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