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Pediatria26 janeiro 2023

Revisão aborda o uso de diuréticos em pediatria

Artigo analisou as indicações, mecanismos de ação, efeitos colaterais e fatos farmacocinéticos básicos dos diuréticos em pediatria.

Os diuréticos são medicamentos frequentemente prescritos para adultos e crianças. Sua utilização acarreta aumento da excreção de água e de sódio, reduzindo a sobrecarga de fluidos. A retenção de sódio e água pode derivar diretamente de sobrecarga hídrica, como lesão renal aguda, doença renal crônica, síndrome nefrótica e estados de vazamento capilar, por exemplo. Ademais, pode decorrer indiretamente de um volume circulante arterial efetivo reduzido e perfusão renal diminuída, que desencadeiam um estado de hiperaldosteronismo, como insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência hepática e síndrome nefrótica.

Um recente artigo de revisão publicado no periódico European Journal of Pediatrics analisa as indicações, mecanismos de ação, efeitos colaterais e fatos farmacocinéticos básicos dos diuréticos em pediatria.  Além disso, aborda questões atuais, como o manejo da resistência aos diuréticos, a recente controvérsia sobre a hidroclorotiazida e as novas classes vaptans e glifozins. Abaixo, destacamos as indicações de uso dos diuréticos e outros pontos relevantes da publicação.

Revisão aborda o uso de diuréticos em pediatria

Classes de diuréticos

  1. Diuréticos osmóticos: atuam no túbulo proximal e alça de Henle, apresentando efeito osmótico. Exemplo: manitol ← raramente prescrito em pediatria, mais indicado no edema cerebral;
  2. Inibidores do Co transportador de sódio e glicose 2 (SGLT2) (glifozins): agem no túbulo proximal, segmento S1, inibindo o transportador SGLT2 de baixa afinidade e alta capacidade, com efeito natriurético e glicosúrico. Exemplos: dapagliflozina, empagliflozina, canagliflozina, ipraglifozina, ertugliflozina e sotaglifozina.  O uso em pediatria é recente, ainda sendo muito raramente aplicado (principalmente em diabetes mellitus tipo 2 e doença de armazenamento de glicogênio tipo Ib);
  3. Inibidores da anidrase carbônica: possuem ação no túbulo proximal, inibindo a anidrase carbônica (CA II). Exemplos: acetazolamida e topiramato. Raramente são prescritos em pediatria;
  4. Diuréticos de alça: agem no ramo ascendente espesso da alça de Henle e mácula densa, através do carreador Na–K-2Cl:NKCC1 e 2 (sítio Cl−). Exemplos: furosemida, bumetanida, tor(a)semide e ácido etacrínico. São frequentemente utilizados em pediatria;
  5. Diuréticos tiazídicos: seu sítio de ação é o túbulo contorcido distal, por meio do carreador de membrana Na+Cl:NCC (sítio Cl-). Exemplos: hidroclorotiazida, clorotiazida e metolazona. São frequentemente utilizados em pediatria;
  6. Diuréticos poupadores de potássio: possuem ação no néfron distal (túbulo coletor e ducto). Podem atuar como bloqueadores dos canais epiteliais de Na+ (por exemplo, amilorida e triamtereno) ou como antagonistas diuréticos da aldosterona no receptor de mineralocorticoide (por exemplo, espironolactona, eplerenona, finerenone e canrenone). São frequentemente utilizados em pacientes pediátricos, muitas vezes em associação com diuréticos tiazídicos ou de alça;
  7. Aquaréticos ou vaptans: atuam no duto coletor como antagonistas dos receptores de vasopressina (diurese hídrica seletiva). Exemplo: tolvaptano e conivaptan, Aumentam a excreção de água, bloqueando o receptor de vasopressina nas células tubulares, levando à diluição da urina produzida. Seu uso pode ser interessante na resistência diurética e, principalmente, diante da sobrecarga de volume concomitante à hiponatremia, como às vezes é encontrado na insuficiência cardíaca e em alguns casos de síndrome nefrótica. Também são propostos em alguns tipos de hiponatremia (como a síndrome inapropriada do hormônio antidiurético). Finalmente, o tolvaptano retarda a progressão da doença em pacientes adultos com doença renal policística autossômica dominante e há esperança de ver resultados semelhantes em crianças. Raramente são usados em pediatria;
  8. Aminofilina/teofilina: agem na mácula densa e nos vasos renais. Na mácula densa, promovem bloqueio do receptor de adenosina (em dose baixa). Já nos vasos renais, agem inibindo a fosfodiesterase tipo IV (em dose alta). Exemplo: Aminofilina (o sal de etilenodiamina de teofilina). Muito raramente são usados em pediatria.

Leia também: Comunicação de más notícias: como fazer na pediatria?

Mecanismos de resistência a diuréticos

Um novo estado de equilíbrio é rapidamente alcançado após a administração crônica de diuréticos. Esse estado é caracterizado por uma combinação de sódio distal aumentado e liberação de solutos, hipertrofia do néfron distal, ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e do sistema nervoso simpático. Nesse novo estado, a entrada e a saída de sódio são iguais, mas o ponto de ajuste é reduzido (em um volume de líquido extracelular menor) em comparação com a linha de base. Este novo equilíbrio caracteriza a eficácia de um tratamento diurético crônico, mas também representa a base para o desenvolvimento de resistência diurética. O tratamento da resistência diurética é complicado. Diuréticos em altas doses e infusões contínuas de diuréticos têm sido tradicionalmente usados. Reconhecendo que até ¾ da resistência diurética pode ser devido à ativação do transporte de NaCl no néfron distal, uma abordagem tentadora é bloquear a reabsorção de NaCl no néfron distal (por exemplo, com tiazidas), a abordagem do “bloqueio sequencial do néfron”. Curiosamente, também drogas de ação proximal, como o inibidor da anidrase carbônica acetazolamida (que atua no túbulo proximal inibindo a pendrina, um trocador de cloreto-bicarbonato) e os novos inibidores de SGLT2 têm sido usados com algum sucesso.

Indicações

  1. Lesão renal aguda
    • Objetivo do uso de diuréticos: Tratamento de oligúria, “salvamento renal” através do estímulo de diurese (pode parecer surpreendente que, diante de um rim em sofrimento agudo, uma diurese forçada acabe protegendo o rim, evitando as complicações da sobrecarga de fluidos).
    • Tratamento: Na lesão renal aguda, a retenção de líquidos por oligúria ou anúria pode se beneficiar da terapia diurética. Devido à sua eficácia e rapidez de efeito, os diuréticos de alça são geralmente a primeira escolha. Eles podem ser combinados com tiazídicos para uma natriurese mais forte através do bloqueio da reabsorção de sódio distal. 
  1. Doença renal crônica (DRC)
    • Objetivo do uso de diuréticos: a DRC reflete um declínio constante e muitas vezes progressivo da função renal. As complicações urêmicas geralmente ocorrem quando a taxa de filtração glomerular (TFG) é < 30 mL/min/1,73 m. Esta condição leva progressivamente a uma diminuição da capacidade de aumentar a produção de urina e, com alguma função renal residual, os diuréticos podem ser úteis.
    • Tratamento: os diuréticos de alça são a primeira escolha e podem ser combinados com tiazídicos para inibir a reabsorção compensatória de sódio distal. 
  1. Insuficiência cardíaca crônica
    • Objetivo do uso de diuréticos: diminuir a sobrecarga de volume e promover balanço negativo de NaCl e H2O.
    • Tratamento: (hidro)clorotiazida ou furosemida + Espironolactona ou Eplerenona. Considerar tolvaptano para casos resistentes. 
  1. Hipertensão pulmonar
    • Objetivo do uso de diuréticos: tratamento de sobrecarga hídrica.
    • Tratamento: diuréticos de alça ou tiazídicos + espironolactona. 
  1. Hipertensão arterial sistêmica (HAS)
    • Objetivo do uso de diuréticos: diminuir a pressão sanguínea arterial aumentando a perda de sódio e de fluidos.
    • Tratamento: os diuréticos não são drogas de primeira linha na HAS. No entanto, podem auxiliar na diminuição do volume do líquido extracelular e provavelmente são subutilizados. Os tiazídicos (menos propensos a mecanismos compensatórios distais) são a melhor classe de diuréticos neste contexto, e são a única classe de diuréticos que demonstrou consistentemente reduzir eficazmente a hipertensão arterial. Curiosamente, o efeito anti-hipertensivo dos diuréticos tiazídicos ocorre lentamente, com a maior parte da resposta aparecendo em 4 a 6 semanas. A adição de espironolactona (tanto como adição distal quanto como molécula poupadora de potássio) é frequentemente usada quando há hipocalemia. 
  1. Síndrome nefrótica
    • Objetivo do uso de diuréticos: tratamento do edema.
    • Tratamento: diuréticos de alça + espironolactona. Tiazidas se houver edema resistente. 
  1. Hipercalemia
    • Objetivo do uso de diuréticos: tratamento do edema.
    • Tratamento: diuréticos de alça. 
  1. Diabetes insipidus
    • Objetivo do uso de diuréticos: a perda (distal) de sódio estimula a reabsorção proximal de água (efeito antidiurético paradoxal).
    • Tratamento: diuréticos tiazídicos.
  1. Ascite
    • Objetivo do uso de diuréticos: excreção de líquido acumulado.
    • Tratamento: tiazidas ou diuréticos de alça + Espironolactona (base da terapia). 
  1. Edema cerebral pós-traumático
    • Objetivo do uso de diuréticos: diminuir o líquido intracraniano, prevenir o sangramento.
    • Tratamento: diuréticos osmóticos. 
  1. Hipertensão intracraniana idiopática (Pseudotumor cerebral)
    • Objetivo do uso de diuréticos: reduz a hipertensão intracraniana diminuindo o líquido intracerebral.
    • Tratamento: inibidores da anidrase carbônica.
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Referências bibliográficas

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