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Pediatria14 outubro 2025

Recomendações da FIGO sobre o manejo da sífilis na gestação

A FIGO publicou novas orientações para o manejo da sífilis na gravidez. Veja as recomendações de rastreamento e o uso essencial da penicilina benzatina.

Apesar da iniciativa de eliminação da sífilis em 2007 pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a doença causada pela bactéria Treponema pallidum continua sendo um grande problema de saúde global, especialmente na gestação. Infelizmente, a infecção materna não tratada leva à morbidade e mortalidade perinatais evitáveis. No mundo todo, cerca de 8 milhões de adultos em idade reprodutiva e 700.000 casos de sífilis congênita (SC) foram notificados somente em 2022, com desfechos fetais e infantis significativos. Como muitos recém-nascidos (RN) são assintomáticos ao nascer, a prevalência real está provavelmente subestimada. 

Visando se alinhar à meta da OMS de reduzir a taxa de transmissão vertical da sífilis para abaixo de 0,05%, a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (International Federation of Gynecology and Obstetrics – FIGO) desenvolveu uma orientação baseada em evidências para o manejo da sífilis durante a gravidez. O artigo Syphilis in pregnancy: A practical guide for prenatal care providers foi publicado recentemente no periódico International Journal of Gynecology & Obstetrics e pontos relevantes desta publicação estão sintetizados a seguir. Segundo a FIGO, os profissionais de assistência pré-natal são essenciais na prevenção da SC por meio do rastreamento e tratamento precoces de gestantes. Infelizmente, oportunidades perdidas incluem atraso ou ausência de atendimento pré-natal, falta de testes e tratamento inadequado. Portanto, a educação desses profissionais é fundamental para melhorar o diagnóstico e o manejo, como demonstrado pelo programa brasileiro MOOC (massive open online course) sobre sífilis, que aprimorou o conhecimento e os resultados profissionais. A FIGO apoia diretrizes baseadas em evidências, as metas de eliminação da OMS e o acesso universal ao rastreamento pré-natal gratuito da sífilis. 

Veja também: Critérios de mãe adequadamente tratada para sífilis na gestação

sífilis na gestação

Recomendações da FIGO quanto ao rastreamento e testagem para sífilis 

  • Para todas as gestantes, o rastreamento inicial deve ser realizado durante o primeiro trimestre, de preferência na primeira consulta pré-natal; 
  • O rastreamento deve ser obrigatório no parto, independentemente da presença de fatores de risco, para permitir a identificação de casos de SC devido a infecção ou reinfecção durante a gravidez em países que não atingiram a meta de erradicação da OMS; 
  • Um rastreamento intermediário por volta das 28 semanas de idade gestacional (IG) deve ser considerado, dependendo da taxa de incidência da sífilis; 
  • Se a prevalência ou o acesso a serviços laboratoriais forem escassos, o rastreamento baseado na estratégia reversa, com testes rápidos no local, quando disponíveis, é uma forte recomendação; 
  • Qualquer gestante com qualquer sinal ou sintoma de sífilis deve ser testada, independentemente da IG;  
  • O teste da gestante é fortemente recomendado em casos de natimorto/morte fetal; 
  • Uma gestante com teste positivo para sífilis deve ser submetida a exames para outras infecções sexualmente transmissíveis (IST). 

Tratamento e acompanhamento  

  • Após os resultados da triagem, o tratamento com penicilina benzatina deve ser iniciado o mais precocemente possível; 
  • A penicilina é o único antibiótico comprovadamente eficaz no tratamento da sífilis. Portanto, a terapia de primeira linha recomendada é a penicilina injetável, com o número de doses dependendo do estágio da infecção. No entanto, mais pesquisas são necessárias sobre a melhor dosagem e a duração do tratamento para a sífilis inicial; 
  • O tratamento mais recomendado é 1 dose de penicilina G benzatina 2,4 milhões de UI intramuscular (IM) para sífilis inicial (estágios primário, secundário ou latente inicial) e três doses semanais (total de 7,2 milhões de UI) para sífilis latente tardia ou com duração desconhecida; 
  • Testes de provocação podem ser apropriados, dependendo do tipo de reação e da história da ocorrência, em caso de suspeita de alergia à penicilina. A dessensibilização é recomendada se for comprovada a presença de alergia; 
  • Alternativas como penicilina procaína, doxiciclina ou ceftriaxona devem ser usadas somente quando a penicilina G benzatina não estiver disponível ou for contra-indicada devido à alergia grave; 
  • Os sintomas da reação de Jarish-Herxheimer devem ser conhecidos pela paciente. Embora não haja tratamento específico para essa condição, o manejo deve incluir alívio da febre/dor (por exemplo, paracetamol) e hidratação, segundo as diretrizes e protocolos locais; 
  • O manejo deve ser realizado pelo profissional de pré-natal, com o apoio, se necessário, de uma equipe especializada; 
  • A ultrassonografia (USG) deve, idealmente, preceder o tratamento pré-parto para detectar complicações fetais, como hidropisia. No entanto, o tratamento nunca deve ser adiado para aguardar a realização do exame; 
  • As gestantes devem ser acompanhadas uma vez por mês com um teste titulado não treponêmico para garantir a eficácia do tratamento ou identificar falha, tratamento inadequado ou reinfecção;  
  • Momentos de coleta de sorologia para sífilis: No início do tratamento (estabelecendo a linha de base do título), mensalmente até que um teste negativo ou platô seja alcançado, às 28 semanas de IG, no parto e 1 ano após o tratamento. Um aumento de quatro ou mais vezes nos títulos sugere uma nova infecção; 
  • Resposta adequada ao tratamento: é considerada quando há uma redução de 4 vezes ou pelo menos 2 diluições no título após 3 a 6 meses (no entanto, um estudo recente mostrou uma redução mais lenta do título de testes não treponêmicos entre gestantes); 
  • RN de mulheres diagnosticadas com sífilis devem ser avaliados adequadamente por meio de testes de reagina plasmática rápida (RPR) e exame clínico em busca de características de SC. Investigações e tratamentos adicionais, se necessários, devem ser orientados por especialistas pediátricos nesta área. Nesse caso, a FIGO orienta consultar as diretrizes de tratamento da OMS para SC; 
  • Os parceiros sexuais de pacientes com sífilis devem ser identificados, aconselhados e tratados sempre que possível. Se o teste do parceiro não for viável, recomenda-se tratamento empírico; 
  • A atividade sexual deve ser evitada até o término do tratamento e retomada somente após avaliação ou tratamento do parceiro, sendo recomendado o uso de preservativo para prevenir reinfecção; 
  • Todos os casos de sífilis devem ser notificados às autoridades de saúde pública, conforme exigido pelas regulamentações locais. 

Tratamento da sífilis durante a gestação segundo a OMS 

Recomendações Sífilis primária, secundária e latente precoce Sífilis latente tardia ou estágio desconhecido 
1 
  • Penicilina G benzatina 2,4 milhões UI 1x IM 
  • Penicilina G benzatina 2,4 milhões UI IM 1x por semana por 3 semanas consecutivas 
2 
  • Penicilina G benzatina 2,4 milhões UI 1x IM é preferível à penicilina procaína 1,2 milhões UI IM 1x ao dia por 10 dias 
  • Penicilina G benzatina 2,4 milhões UI IM 1x por semana por 3 semanas consecutivas é preferível à  penicilina procaína 1,2 milhões UI IM 1x ao dia por 20 dias 
3 
  • Ceftriaxona 1g IM, uma vez ao dia, por 10 dias quando a penicilina benzatina ou a penicilina procaína não puderem ser utilizadas (alergia à penicilina em casos em que a dessensibilização não seja possível) ou não estiverem disponíveis (falta no estoque). 
  • Doxiciclina: 100 mg por dose, duas ou três vezes ao dia, por 14 dias. Pode ser uma alternativa caso a penicilina e a ceftriaxona não estejam disponíveis, desde que haja uma decisão compartilhada quanto às incertezas envolvidas, incluindo dose adequada, segurança e prevenção da SC.  
  • Eritromicina 500 mg VO quatro vezes ao dia, por 30 dias quando a penicilina benzatina ou a penicilina procaína não puderem ser utilizadas (alergia à penicilina em casos em que a dessensibilização não seja possível) ou não estiverem disponíveis (falta no estoque). A SC já foi descrita após o uso de macrolídeos (como a eritromicina), devido à resistência bacteriana ou porque esses antibióticos não atravessam completamente a barreira placentária. Assim, caso a eritromicina seja utilizada, é indispensável o tratamento do neonato. 

Legenda: IM – intramuscular; SC – sífilis congênita; UI – unidades; VO – via oral. 

Fonte: Adaptado de Desjardins et al., 2025. 

 

Autoria

Foto de Roberta Esteves Vieira de Castro

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

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