O diagnóstico da atresia de vias biliares (AVB) em pediatria ainda é realizado de forma tardia, tendo grandes repercussões para evolução clínica do paciente e com impacto relevante na qualidade de vida do paciente e familiares, além de elevar os custos dos sistemas de saúde. Sendo assim, o rastreamento neonatal para atresia biliar pode facilitar um diagnóstico e intervenção mais precoce para melhores desfechos clínicos.

Método
Para melhor elucidar essa hipótese, Gopal e colaboradores realizou uma revisão sistemática seguida de metanálise sobre a precisão das estratégias de rastreamento populacional para atresia biliar (AVB) em recém-nascidos com até 6 semanas de vida, seguindo as diretrizes PRISMA-DTA, com base em estudos de coorte ou transversais. Os testes de rastreamento realizados incluíram o cartão de cor das fezes (CCF), dosagem de ácidos biliares sulfatados na urina (USBA), ácidos biliares séricos, carnitina livre e a dosagem de bilirrubina direta/conjugada (BD/BC). O diagnóstico foi considerado para os pacientes que foram submetidos a colangiografia intraoperatória e/ou histopatologia antes da cirurgia de Kasai. Estudos que não eram de base populacional e aqueles que não abordavam triagem, foram excluídos.
Resultados
Foram identificados cerca de 8.926 registros em pesquisas de banco de dados, resultando na inclusão apenas de 15 estudos, dos quais 7 avaliaram o CCF, 5 analisaram o rastreamento com BD/BC e 1 sobre USBA, outro sobre ácidos biliares séricos e mais um sobre carnitina livre. A maioria dos estudos foi realizada na Ásia, onde a incidência de AVB é mais alta.
Evidências fortes sugerem que a BD/BC após o nascimento tem uma sensibilidade de 100% (IC 95% 100,100) e especificidade de 98,8% (98,8, 98,9) (5 estudos, 662.141 participantes). Evidências moderadas sugerem que o rastreamento CCF aos um mês de idade teve sensibilidade de 79,6% (IC 95% 70,6, 86,4) e especificidade de 99,9% (IC 95% 99,9, 99,9) (7 estudos, 996.262 participantes).
Já os testes de rastreamento avaliados apenas em um estudo cada, relataram as seguintes sensibilidades e especificidades: o USBA teve uma sensibilidade de 100% (IC 95%, 0,03–1,0) e uma especificidade de 96% (IC 95%, 0,95–0,97); os ácidos biliares séricos tiveram uma sensibilidade de 64% (IC 95%, 0,31–0,89) e uma especificidade de 99% (IC 95%, 0,99–0,99) e carnitina livre teve uma sensibilidade de 86% (0,42–1,00) e uma especificidade de 85% (0,85–0,85).
Conclusão e mensagem prática
O rastreamento com BD/BC é altamente sensível e específico para detecção de AVB, além de ser facilmente implementado nas maternidades ou consultórios pediátricos. O CCF tem alta especificidade, porém a sua sensibilidade é moderada. Mas uma vantagem é que ambos são minimamente invasivos. A variável temporal de realização dos testes varia entre os estudos, com BD/BC e ácidos biliares realizados próximas ao nascimento, já o CCF é feito nas primeiras semanas de vida.
Os resultados deste estudo corroboram a prática clínica hoje realizada no Brasil, que é o rastreio com base na dosagem de BD para crianças com icterícia com característica patológica e/ou acolia fecal. Além disso, o CCF está presente em toda a caderneta da criança, sendo uma potente ferramenta para orientação às famílias e alerta para o diagnóstico precoce da AVB.
Autoria

Jôbert Neves
Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).
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