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Pediatria17 maio 2025

ESPGHAN 2025: Evolução da doença perianal na Doença de Crohn pediátrica

Estudo a incidência de DP e sua associação com desfechos clínicos relevantes, como cirurgias abdominais, câncer anal e mortalidade.
Por Jôbert Neves

A Doença de Crohn (DC) é uma condição inflamatória crônica do trato gastrointestinal, frequentemente diagnosticada durante a infância ou adolescência. A doença perianal (DP) representa uma manifestação particularmente agressiva da DC, caracterizada por inflamação na região anal que pode se apresentar como fissuras, estenoses, fístulas ou abscessos. Essas complicações não só aumentam a complexidade do tratamento como também contribuem significativamente para a morbidade, interferindo na qualidade de vida dos pacientes.

Em adolescentes, a presença de DP pode ter implicações emocionais e sociais importantes, afetando autoestima, imagem corporal e relações interpessoais. No entanto, dados populacionais amplos sobre a incidência, evolução clínica e impacto de longo prazo da DP em pacientes com DC de início pediátrico ainda são limitados. Neste contexto, durante a plenária de gastroenterologia do Congresso Europeu de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (ESPGHAN 2025), foi apresentado dados de um estudo que teve como objetivo avaliar, em uma coorte nacional dinamarquesa, a incidência de DP e sua associação com desfechos clínicos relevantes, como cirurgias abdominais, câncer anal e mortalidade.

Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo baseado em dados dos registros nacionais de saúde da Dinamarca. Foram incluídos pacientes com diagnóstico de Doença de Crohn antes dos 18 anos de idade, entre os anos de 1980 e 2018. A definição de doença perianal considerou registros clínicos ou cirúrgicos relacionados a estenose anal, fissura, fístula ou abscesso.

Dentre os resultados, temos os seguintes destaques:

A coorte total incluiu 2.356 pacientes com diagnóstico de Doença de Crohn em idade pediátrica. Desses, 769 pacientes (33%) desenvolveram doença perianal ao longo do seguimento, enquanto 1.587 não apresentaram manifestações perianais.

A idade mediana ao diagnóstico da DC foi de 15 anos em ambos os grupos. Já o surgimento da DP ocorreu em média aos 17,6 anos de idade.

Tempo de seguimento

O tempo mediano de acompanhamento foi de 18,5 anos entre os pacientes com DP e de 12,3 anos entre aqueles sem DP, permitindo uma avaliação robusta dos desfechos ao longo do tempo.

Incidência e manifestações clínicas da DP

A incidência da DP foi de 29 casos por 1.000 pessoas-ano. Durante o período de estudo (1980–2022), observou-se uma incidência cumulativa de 14% após 1 ano, 21% após 5 anos, e 28% após 10 anos do diagnóstico de Crohn.

As manifestações mais frequentes da DP foram:

  • Abscessos perianais, identificados em 60% dos pacientes com DP;
  • Fístulas perianais, presentes em 52% dos casos;
  • Outras manifestações incluíram fissuras e estenoses.

Intervenções cirúrgicas

Entre os pacientes com DP, 82% foram submetidos a algum tipo de cirurgia perianal ao longo do seguimento. Essas intervenções incluíram drenagem de abscessos, fistulotomias e procedimentos mais complexos em casos refratários.

Tendência temporal

Ao analisar a incidência acumulada de DP ao longo das décadas, observou-se uma redução anual de aproximadamente 2% na incidência de DP nos primeiros 5 anos após o diagnóstico de DC. Esse dado pode refletir uma evolução positiva no manejo da doença, com diagnósticos mais precoces e terapias mais eficazes.

Câncer anal

  • Não foi encontrada associação estatisticamente significativa entre a presença de DP e o desenvolvimento de câncer anal.

Conclusão

A doença perianal é uma complicação frequente e impactante na Doença de Crohn com início pediátrico, afetando aproximadamente um terço dos pacientes. Os dados demonstram que a DP está associada a um risco significativamente maior de intervenções cirúrgicas abdominais, especialmente aquelas envolvendo estoma, o que reforça a necessidade de vigilância precoce e manejo agressivo.

Apesar da ausência de associação clara com câncer anal e da incerteza quanto ao impacto sobre a mortalidade, a presença de DP representa um marcador de doença mais grave e de curso mais complexo. A redução progressiva da incidência de DP ao longo dos anos sugere que os avanços no tratamento da DC, como a introdução precoce de terapias biológicas, podem estar contribuindo positivamente para esse cenário.

Mensagens práticas

  • Alta frequência: Cerca de 1 em cada 3 crianças e adolescentes com DC desenvolve doença perianal, geralmente dentro dos primeiros 5 a 10 anos após o diagnóstico.
  • Morbidade elevada: A DP está fortemente associada à necessidade de cirurgias, com 82% dos pacientes necessitando de intervenção perianal e risco quase triplicado de estoma.
  • Tendência de melhora com o tempo: A incidência da DP tem diminuído ao longo das décadas, possivelmente devido ao uso mais precoce de terapias imunossupressoras e biológicas.
  • Câncer e mortalidade: Não foi observada associação com câncer anal; tendência à maior mortalidade em pacientes com DP, mas sem significância estatística.
  • Abordagem multidisciplinar essencial: A gravidade e o impacto psicossocial da DP exigem cuidados integrados, com atenção à saúde mental, planejamento cirúrgico e suporte familiar.

Confira os principais destaques do ESPGHAN 2025!

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