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Pediatria18 maio 2025

ESPGHAN 2025: Controvérsias em torno do Baby-Led Weaning (BLW)

O conceito de Baby-Led Weaning surgiu no Reino Unido no início dos anos 2000.
Por Jôbert Neves

A alimentação complementar é essencial não apenas do ponto de vista nutricional, mas também para o desenvolvimento motor, social e comportamental da criança. A forma como essa alimentação é introduzida faz diferença. O método conhecido como baby-led weaning (BLW) promove a autonomia do bebê para escolher o que e quanto comer, participando das refeições da família desde o início. 

Esse conceito surgiu no Reino Unido no início dos anos 2000 e, desde então, evoluiu para uma versão modificada conhecida como BLISS (Baby-Led Introduction to Solids), desenvolvida com o objetivo de mitigar riscos nutricionais e de engasgo. Com sua crescente popularidade nas redes sociais e entre os pais, é essencial que os profissionais da saúde conheçam essa abordagem e estejam preparados para orientar com base em evidências. As evidências mais atuais foram discutidas e apresentadas no congresso da European Society for Paediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition (ESPGHAN 2025).

Na base PubMed, vemos que o interesse pelo BLW aumentou significativamente nos últimos anos. No entanto, é importante destacar um ponto-chave: existem apenas três ensaios clínicos randomizados publicados sobre esse método até o momento. 

Princípios do Baby-Led Weaning (BLW) 

  • Iniciado após os 6 meses, em bebês saudáveis e sem comorbidades;
  • A criança participa das refeições da família, comendo os mesmos alimentos;
  • Dispensa o uso de papinhas e colher (menos de 10% da alimentação deve ser em forma de purê);
  • A alimentação é dirigida pelo bebê: ele decide o que e quanto comer;
  • A criança deve estar sentada de forma ereta e sempre supervisionada;
  • Alimentos pequenos, duros e arredondados devem ser evitados por risco de engasgo;
  • O leite materno continua sendo oferecido sob demanda; 

Principais preocupações com o BLW

Risco nutricional: 

  • Déficits de ferro, zinco e vitamina C
  • Ingestão excessiva de gorduras saturadas, sal e açúcar
  • Dificuldade em garantir a adequação nutricional

Risco de engasgo: 

  • Cerca de 1 em cada 3 bebês pode apresentar ao menos um episódio de engasgo
  • Pode haver confusão entre engasgos reais e o reflexo de vômito (gag reflex)

Variedade e estrutura das refeições: 

  • O bebê pode preferir sempre os mesmos alimentos, dificultando a diversidade
  • Pode haver dificuldade em estabelecer uma rotina alimentar diária 

O que é o BLISS? 

O BLISS, desenvolvido na Nova Zelândia, busca tornar o BLW mais seguro e nutricionalmente adequado. 

Modificações principais: 

  • Inclusão de alimentos ricos em ferro em todas as refeições
  • Orientações específicas aos pais sobre alimentos com risco de engasgo
  • Apoio adicional com materiais educativos e acompanhamento clínico

Os estudos mostram que o BLISS: 

  • Reduz o risco de deficiências nutricionais
  • Apresenta menor risco de engasgo comparado ao BLW original
  • Mostra resultados similares à alimentação tradicional quanto ao crescimento e à regulação do apetite 

Comparação entre BLW, BLISS e alimentação tradicional 

Em relação ao crescimento, os estudos são contraditórios: algumas pesquisas indicam menor IMC nas crianças em BLW, enquanto outras mostram valores semelhantes à alimentação tradicional. 

No que diz respeito à regulação do apetite, ainda há poucas evidências sólidas. Embora o BLW promova que a criança escute seus sinais internos de fome e saciedade, os dados são limitados. Quanto ao risco nutricional, o BLW original apresenta mais deficiências, principalmente de ferro e zinco. O BLISS, por sua vez, consegue mitigar esse risco com uma estrutura mais orientada. 

Sobre o risco de engasgo, o BLW levanta preocupações, mas o BLISS demonstrou uma melhora nesse aspecto, sem diferença significativa em comparação à abordagem tradicional. Por fim, a integração às refeições familiares é maior no BLW e BLISS do que na alimentação tradicional, o que pode favorecer aspectos sociais da alimentação. 

Considerações científicas e sociais 

  • Falta de evidência robusta: com apenas três estudos randomizados, muitos dos benefícios alegados ainda não foram confirmados
  • Viés socioeconômico: a maioria das famílias envolvidas nos estudos tem alto nível educacional e renda, o que pode influenciar positivamente os resultados 

As sociedades pediátricas da Europa e América do Norte adotam uma postura cautelosa quanto ao BLW, destacando os riscos nutricionais e de segurança. Em contraste, Austrália e Nova Zelândia são mais favoráveis à versão modificada (BLISS). 

Conclusão 

O BLW reflete o desejo crescente de muitos pais por uma alimentação mais natural, autônoma e integrada à rotina da família. Contudo, os dados disponíveis ainda são limitados e inconclusivos, principalmente quanto aos efeitos de longo prazo. Diante disso, recomenda-se uma abordagem personalizada, equilibrada e adaptada ao contexto de cada família. A versão modificada (BLISS) parece ser uma alternativa mais segura e nutricionalmente adequada. 

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