A doença de Kawasaki (DK) é uma vasculite sistêmica de vasos de médio calibre, caracterizada por início agudo e autolimitado, com presença de febre alta e prolongada associada a outros sinais e sintomas, dentre eles a possibilidade de aneurisma de coronária. Estudos recentes relatam uma redução da incidência de DK durante a pandemia gerada pelo SARS-CoV-2, assim como apontam também para a redução dos quadros infecciosos no geral quando comparada a anos anteriores à pandemia.
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Relembrando os critérios para o diagnóstico de DK:
- Febre persistente por, pelo menos, 5 dias, associada a 4 dos 5 critérios abaixo:
- Alterações da cavidade oral e/ou dos lábios;
- Exantema polimorfo;
- Alteração de extremidades;
- Hiperemia conjuntival;
- Linfonodomegalia cervical, geralmente unilateral, ≥ 1,5 cm.
Com o objetivo de avaliar a incidência de DK durante a pandemia, estudiosos do Japão realizaram um estudo retrospectivo a partir de duas bases de dados importantes do país: uma direcionada a pacientes com DK, contemplando os dados clínicos e epidemiológicos dos pacientes em questão e uma base de dados de doenças infectocontagiosas, sendo elas a infecção causada pelo vírus sincicial respiratório (VSR) e a faringite por Estreptococo do grupo A. Foi realizada uma comparação e avaliação das características básicas dos pacientes diagnosticados durante 2020 com os pacientes que desenvolveram DK ou uma doença infecciosa durante 2017–2019.
Os resultados relevantes obtidos foram:
- De um total de 4.603 pacientes com DK identificados nesses hospitais, 4.596 pacientes foram incluídos:
- Um total de 868 (19%) tiveram diagnóstico de DK em 2020;
- Entre 2017-2019, cerca de 3.738 (81%) pacientes desenvolveram DK;
- Para sexo, não foram encontradas diferenças entre os dois grupos.
- As comparações das características de pacientes que desenvolveram DK em 2020 e 2017–2019 revelaram os seguintes achados:
- O acometimento de pacientes com idade < 1 ano foi significativamente maior em 2020 em comparação com a proporção em 2017–2019 (24% vs. 19%; p < 0,01);
- O número de pacientes com idade < 1 ano que desenvolveram DK em 2020 (n = 209) foi 12% menor quando comparado com 2017-2019;
- O número de pacientes com idade ≥ 1 ano com DK em 2020 (n = 649) foi 36% menor do que aqueles em 2017–2019.
- Quanto ao número de sinais e sintomas para o diagnóstico de DK, não houve diferença significativa: em ambos os grupos, os pacientes mantiveram a mesma proporção de diagnóstico de DK completa (5 ou mais critérios) e incompleta (4 ou menos critérios);
- Utilizando a correlação de Pearson, foi evidenciada também uma redução dos quadros respiratórios por VSR e faringite estreptocócica;
- O tempo desde o início dos sintomas da DK até a primeira visita ao hospital não diferiu significativamente entre os anos examinados.
Discussão e conclusão
O diagnóstico e manejo da DK durante a pandemia e fora dela continua sendo um desafio para o pediatra. O estudo em questão, através dos seus resultados, nos trouxe a percepção de que, apesar da diminuição expressiva dos diagnósticos realizados durante a pandemia comparada aos anos anteriores, os pacientes e seus familiares não deixaram de procurar atendimento médico para elucidar o quadro clínico, mesmo em período pandêmico. Os resultados também sugerem que quadros infecciosos podem participar do desencadeamento da DK, apesar dessa patogênese ainda não estar bem esclarecida.
Referências bibliográficas:
- Ruysuke AE, et al. Kawasaki Disease and Pediatric Infectious Diseases During the Coronavirus Disease 2019 Pandemic. The Journal of Pediatrics. 2021;21(00745-9). doi: 10.1016/j.jpeds.2021.07.053
- Sociedade Brasileira de Pediatria. Doença de Kawasaki – Departamento Científico de Reumatologia (2019-2021). Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/_22196c-DocCient_-_Doenca_de_Kawasaki.pdf (Acesso em 15/08/2021).
Autoria

Jôbert Neves
Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).
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