As diretrizes PANDEM de 2022 da Society of Critical Care Medicine (SCCM) recomendam a implementação do bundle ABCDEF (“A–F”) em Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP), mas estudos mostram que essa implementação é um desafio devido à sua complexidade e às barreiras institucionais, como tempo, pessoal e recursos financeiros limitados. Entre 2018 e 2020, um estudo conduzido em duas UTIP no Canadá destaca esses obstáculos. Uma análise de custos foi realizada posteriormente em uma dessas unidades para identificar os recursos necessários e comparar os gastos ao nível de paciente e unidade antes e após sua adoção. O artigo Early Rehabilitation Bundle in a Canadian PICU: Cost Analysis of Implementation in 2018–2020 foi publicado em outubro de 2025 no jornal Pediatric Critical Care Medicine.

Metodologia
A análise de custos foi conduzida como parte de um estudo de implementação do bundle A-F na UTIP do McMaster Children’s Hospital, em Hamilton, Canadá, entre 2018 e 2020. Os objetivos dessa avaliação foram determinar os recursos e custos necessários para implementar o bundle A-F e comparar o seu impacto nos gastos pré e pós-implementação.
Os custos da UTIP foram determinados pela soma de todas as despesas médicas e não médicas diretas dos pacientes admitidos e que receberam alta durante os períodos do estudo. Os gastos médicos diretos cobriram os serviços de assistência ao paciente, como medicamentos e enfermagem, enquanto os gastos não médicos incluíram despesas gerais e operacionais. A análise abrangeu múltiplos centros de custo, incluindo a UTIP, farmácia, serviços de saúde complementares, serviços de alimentação, laboratório, exames de imagem, diagnósticos e serviços adicionais utilizados durante as internações na UTIP, como o centro cirúrgico e a sala de recuperação pós-anestésica. Como o bundle A-F promove o conforto do paciente, a otimização da sedação, a mobilização precoce e o envolvimento da família, o estudo levantou a hipótese de que as diferenças de custo decorreram, principalmente, do tempo de internação e do uso de sedativos. Dessa forma, os gastos com medicamentos foram analisados utilizando dados de custo por caso, complementados por uma abordagem de microcusteio para estimar as despesas com analgésicos e sedativos antes e depois da implementação. As doses totais de opioides, benzodiazepínicos, alfa-2-agonistas, propofol, cetamina e indutores do sono foram registradas prospectivamente e os custos unitários foram obtidos a partir das listas de preços de genéricos fornecidas pelas farmácias.
De 2018 a 2020, as estimativas de recursos para todas as atividades de implementação foram calculadas a partir dos custos com materiais e das horas despendidas pelos profissionais, multiplicados pelos salários. Os custos da UTIP e do paciente antes (de janeiro de 2019 a março de 2019) e após a implementação do pacote (de janeiro de 2020 a março de 2020) foram comparados utilizando dados de custeio de casos. Os pesquisadores descreveram que optaram por comparar esses dois períodos no inverno, pois a acuidade e os volumes dos pacientes são influenciados pela sazonalidade, e as políticas de lockdown da pandemia de covid-19 foram instituídas no Canadá em 16 de março de 2020.
Os custos são reportados em dólares canadenses (CAD). A regressão linear foi utilizada para analisar os custos transformados em logaritmo, ajustados para idade, sexo e pontuação de gravidade da doença.
Veja também: ABCDEF (A-F) bundle em Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica
Resultados
Ao longo de dois anos de implementação do bundle, 907 horas foram dedicadas, com um custo estimado de CAD 50.813. Os médicos contribuíram com o maior número de horas, seguidos pelo educador de enfermagem e pelo farmacêutico. Os custos com materiais foram de CAD 860.
No período pré-implementação, foram analisados 141 pacientes e o custo médio ajustado por paciente na UTIP foi de CAD 17.342. No período pós-implementação, foram analisados 84 pacientes e o custo médio ajustado por paciente na UTIP foi de CAD 20.310, correspondendo a uma diferença média (intervalo de confiança de 95% [IC 95%]) 17% maior (IC 95%, de 6,3% menor a 46% maior). Antes da implementação, o custo médio ajustado de farmácia por paciente foi de CAD 834 e, após, foi de CAD 827, representando uma diferença média 0,8% menor no pós-implementação (IC 95%, de 27% menor a 35% maior).
Conclusão
Entre 2018 e 2020 na UTIP do McMaster Children’s Hospital, a implementação do bundle A-F exigiu tempo e colaboração significativos das principais partes interessadas. Em uma análise dos custos de 2019 vs. 2020 (pré vs. pós-implementação), os pesquisadores não observaram nenhum impacto do bundle nos custos da UTIP ou do paciente. No entanto, esse período para análise de custos foi limitado pelo início da pandemia de covid-19. Como a escassez de informações sobre custos foi citada como uma barreira à implementação do bundle e uma limitação da pesquisa de implementação, os pesquisadores consideraram que o estudo atual fornece evidências para outras UTIP que buscam implementar o bundle A-F. Ademais, segundo os pesquisadores, o estudo informa quaisquer estudos futuros sobre reabilitação precoce em UTIP, que devem incluir análises de custos que incorporem importantes desfechos de saúde de longo prazo e centrados no paciente para determinar se essa intervenção é, em última análise, custo-efetiva.
Autoria

Roberta Esteves Vieira de Castro
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra
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