A lesão renal aguda (LRA) é definida como a queda da função renal ou sua perda súbita. É caracterizada pelo acúmulo de produtos residuais, perda do equilíbrio hidroeletrolítico e alteração do equilíbrio ácido-básico.
Esta injúria renal é uma condição comum em recém-nascidos (RN) criticamente enfermos internados em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), sendo considerada um fator de risco independente no aumento da mortalidade e no tempo de internação.
A incidência relatada de LRA neonatal varia devido ao uso de diferentes critérios diagnósticos em RN, principalmente em prematuros. Porém, desde 2012, foi padronizada a classificação de KDIGO (Kidney Disease: Improving Global Outcomes) modificada para o período neonatal.
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Além disso, desde 2013, a Sociedade Internacional de Nefrologia publicou a iniciativa de zero mortes evitáveis por LRA até 2025, um programa chamado: “0 by 25”. Essa estratégia focou as atenções na identificação de fatores de risco para LRA, diagnóstico e intervenção precoces.
Apesar de vários estudos voltados para esse diagnóstico no período neonatal, sabemos que a detecção precoce é de difícil percepção, principalmente nos primeiros dias após a doença. E esse período inicial determina a progressão para a doença renal aguda e diminuição da função renal entre sete e noventa dias de vida.
Nesse ano, foi publicado numa revista pediátrica um importante estudo com o objetivo de descrever o curso clínico dos RN durante os primeiros sete dias após o diagnóstico de LRA em três UTIN.
Métodos
Para tal artigo, foi realizado um estudo de coorte observacional prospectivo multicêntrico com dados de junho de 2019 a dezembro de 2020 em três UTIN na cidade de Popayán, departamento de Cauca, no sudoeste da Colômbia.
Todos os RN entre 2 e 28 dias de vida admitidos na UTIN, diagnosticados pela primeira vez com LRA pela classificação de KDIGO durante a internação, foram incluídos e acompanhados por sete dias consecutivos.
Pacientes com anomalias cromossômicas, malformações renais maiores e cardiopatias congênitas complexas foram excluídos. As malformações renais unilaterais foram incluídas porque o rim contralateral pode suprir a função renal e porque as anormalidades congênitas do rim e do trato urinário eventualmente causam diminuição da função renal, mas não no período neonatal.
Paciente estágio II e III de KDIGO foram definidos como LRA grave.
Os desfechos primários do estudo foram a recuperação da função renal, a necessidade de terapia renal substitutiva e a incidência cumulativa de óbito durante o período de acompanhamento de sete dias nas UTIN. Os desfechos secundários foram a incidência cumulativa de LRA neonatal global e LRA grave, além da determinação do estágio máximo de KDIGO observado durante o seguimento.
Resultados
Ao longo desses 18 meses de estudo, 4.132 RN foram admitidos nas UTIN e 93 pacientes (2,25%) desenvolveram LRA neonatal. Desses, 59,1% eram prematuros e não houve diferença de gravidade de acordo com a idade gestacional. Todos os RN desenvolveram LRA entre o 2° e 26° dia de vida, e a maioria próxima ao 6° dia de vida.
Em 42% dos casos, o diagnóstico baseou-se em débito urinário inferior a 0,5 ml/kg/h como único critério de LR, ressaltando a importância do débito urinário em países subdesenvolvidos. Esse dado contrasta com relatos de países desenvolvidos, onde o diagnóstico foi baseado em um aumento da creatinina sérica em mais de 90% dos pacientes.
Durante o acompanhamento, o KDIGO foi de 64,5% para LRA estágio I, 11,8% para LRA estágio II e 23,7% para LRA estágio III.
A recuperação da função renal foi maior em pacientes com LRA estágio I em comparação com os estágios II e III. Cinco pacientes (5,4%) necessitaram de terapia de substituição renal por diálise peritoneal e 15 morreram (16,1%), sendo quatro pacientes em estágio I de IRA e 11 pacientes em estágios II e III.
Conclusões
Esse estudo encontrou uma baixa incidência de LRA. Acredita-se que uma das limitações que explicam esses achados é a probabilidade de subdiagnóstico durante os meses iniciais da pandemia pelo SARS CoV-2, devido ao menor recrutamento de pacientes, além da dificuldade de cateter vesical, dificuldade na dosagem de creatinina sérica e dificuldade adesão à classificação de KDIGO.
Diante dessas questões, é necessária atenção cuidadosa à creatinina sérica e à diurese em RN de qualquer idade gestacional admitidos na UTIN, principalmente entre dois e nove dias de vida, período em que a LRA ocorre com maior frequência.
Por fim, o estudo concluiu que RN internados em UTIN podem desenvolver lesão renal aguda (LRA) independente da idade gestacional, sendo mais frequente em prematuros entre o 2° e 9°dia de vida. Pacientes no estágio I se recuperam e têm menor mortalidade que pacientes em estágios II e III.
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