AAP 2024: CMV Neonatal - aspectos clínicos e de triagem
A infecção por citomegalovírus (CMV) ocorre em aproximadamente 1 a 2% de todos os nascimentos vivos nos Estados Unidos (EUA), tornando-se uma das infecções virais congênitas mais comuns. Estima-se que cerca de 20.000 a 30.000 crianças nascem anualmente com a doença congênita sintomática por CMV nos EUA. Apesar desta prevalência, cerca de até 10-15% de todos os nascimentos vivos podem estar infectados com CMV e não apresentar sintomas ao nascimento. Durante o encontro anual da Academia Americana de Pediatria (AAP 2024), foram discutidos pontos em relação ao diagnóstico de CMV durante o período neonatal.
A Dra. Karen M. Puopolo, da Universidade da Pensilvânia, abriu a sessão de discussão trazendo a relevância epidemiológica e as implicações de saúde pública do tema, onde ainda apresentou dados de incidência no Brasil, durante 2005-2006, de cerca de 97% soroprevalência em adultos, além de dados dos EUA mostrando a variação da prevalência em diferentes regiões do país. Um dos destaques da apresentação foi a ênfase em fatores de risco para tal infecção, tais como:
- Idade Materna
Mães jovens (geralmente menores de 25 anos) têm maior probabilidade de serem infectadas pelo CMV, logo, de serem imunes durante a gestação;
- Baixo Status Socioeconômico
Famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica podem ter maior exposição ao CMV;
- Número de Filhos
Mães que já têm outros filhos podem ter maior risco de infecção, pois CMV é comum em crianças e pode ser transmitido a mães durante a gravidez de crianças mais velhas que possam estar infectadas;
- Raça/etnia materna
Reconhecida como uma construção social derivada do racismo histórico e estrutural;
- Risco por idade gestacional:
Bebês prematuros, de muito baixo peso (PN <1500 gramas) possuem risco maior de serem infectados.
Confira a cobertura completa do AAP 2024
Manifestações Clínicas do CMV Congênito
- Sintomas ao nascimento, devido a infecção intraútero
- Supressão da medula óssea – mais comumente trombocitopenia
- Hepatite
- Microcefalia: pode estar associada a alterações de desenvolvimento cerebral
- Icterícia/Colestase neonatal
- Hepatoesplenomegalia
- Baixo peso ao nascer
- Calcificações cerebrais
- Complicações a longo prazo
- Perda Auditiva: Pode ser a manifestação mais comum a longo prazo, afetando até 60-70% dos bebês com CMV congênito sintomático
- Atrasos no Desenvolvimento: Pode ocorrer uma série de déficits no desenvolvimento motor e cognitivo, com algumas crianças apresentando dificuldades de aprendizagem
- Alterações Comportamentais: Algumas crianças podem experimentar problemas de comportamento e percepção social ao longo do tempo
- Convulsões
O desafio do manejo do paciente com CMV ainda é a grande dificuldade de realizar o diagnóstico, que costuma ser feito de forma atrasada. Parte deste atraso se dá pelas manifestações clínicas tardias, do ponto de vista auditivo, por exemplo, e pela falta de conscientização em relação à prevalência desta infecção.
Vantagens e desvantagens das triagens para Infecção Congênita por CMV segundo a AAP
Triagem baseada em manifestações clínicas:
Triagem de recém-nascidos com critérios específicos
- Peso < 10 percentil
- Anormalidades laboratoriais (colestase, alterações de transaminases, plaquetopenia)
- Manifestações clínicas sugestivas de CMV
Vantagens:
Uso direcionado de recursos para recém-nascidos
- Potencialmente mais fácil para os pais aceitarem testes com base em achados clínicos;
- A identificação de bebês com doença leve permite acompanhamento auditivo e de desenvolvimento neurológico
Desvantagens:
- Identifica, na melhor das hipóteses, 10% dos bebês infectados
- Identificação de bebês com indicação incerta para tratamento
Triagem baseada em potenciais alterações auditivas:
Bebês que se referem à triagem auditiva neonatal
- Triagem falhada em 1 ou ambos os ouvidos
- Triagem universal para prematuros que não triados com <21 dias de vida
Vantagens:
Uso direcionado de recursos para recém-nascido
- Identificação de bebês com perda auditiva atribuível ao CMV permite administração oportuna de terapia antiviral e acompanhamento auditivo.
Desvantagens:
- A maioria dos bebês que se referem à triagem auditiva para recém-nascidos acabam tendo audição normal
- Identificação potencial de infecção por CMV sem indicação de tratamento
Triagem universal: para todos os recém-nascidos
Vantagens:
- Identificação de TODOS os bebês com CMV;
- Identificação de todos os bebês que podem se beneficiar da terapia antiviral para CMV.
Desvantagens:
- Impacto significativo em recursos para recém-nascidos;
- Pelo menos 80% dos bebês identificados não têm indicação para terapia;
- Ansiedade dos pais em relação ao diagnóstico e impacto incerto desta condição para o futuro.
Mensagem prática
Diferentes abordagens para triagem estão sendo defendidas e promulgadas nos EUA. É fundamental que os profissionais de saúde estejam preparados para aconselhar os pais sobre a importância da triagem para infecção congênita por citomegalovírus (CMV) no momento em que o recém-nascido é encaminhado para a triagem auditiva. Durante essa conversa, deve-se discutir com os pais o risco associado à infecção congênita por CMV e as possíveis sequelas que essa infecção pode causar. Além disso, é essencial que os profissionais compreendam o tipo de triagem de CMV que está sendo realizada em sua região, tendo em mente suas vantagens, desvantagens e senso crítico para interpretação.
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