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Ortopedia10 julho 2025

Usabilidade de medidor eletrônico na perfuração ortopédica

Medidor eletrônico de profundidade melhora eficiência, mas exige treinamento para evitar erros na escolha do parafuso.

A medição precisa da profundidade óssea é fundamental na cirurgia ortopédica para garantir o correto posicionamento dos parafusos e evitar complicações, como lesão de tecidos moles ou fixação inadequada. Tradicionalmente, essa medição é feita com medidores manuais de profundidade, mas esses são sujeitos a erros humanos e variabilidade entre cirurgiões, além de demandarem mais tempo, especialmente em ossos osteoporóticos ou fraturas cominutivas. 

Com o avanço tecnológico, dispositivos eletrônicos como o Stryker CD NXT surgiram como alternativa. Esse equipamento combina ferramenta motorizada e medidor eletrônico de profundidade, exibindo em tempo real a profundidade óssea medida quando o perfurador atravessa as duas corticais do osso. Ele também mostra a profundidade máxima atingida, auxiliando no treinamento cirúrgico ao reduzir o risco de perfuração excessiva e dano aos tecidos moles. 

Apesar do seu potencial em aumentar a precisão e eficiência cirúrgica, os benefícios e limitações do uso de medidores eletrônicos de profundidade ainda não foram bem estudados na prática ortopédica. 

Um estudo pré-clínico, randomizado, controlado e cruzado foi realizado por Engbjerg et cols., no Departamento de Ortopedia do Aarhus University Hospital, com o objetivo de comparar a usabilidade, aceitação e eficiência de um medidor eletrônico de profundidade versus o medidor manual tradicional para definição do comprimento de parafusos em fixações internas ortopédicas. Foi verificado, em um cenário pré-clínico, se cirurgiões ortopédicos consideram útil o uso do medidor eletrônico de profundidade em comparação ao método manual tradicional. 

medidor eletrônico de profundidade ortopédico

METODOLOGIA 

Sendo assim, foram selecionados 45 voluntários com diferentes níveis de experiência clínica, sendo14 médicos ortopedistas seniores, 8 ortopedistas assistentes, 11 médicos residentes, e 12 estudantes de medicina. 

Cada participante realizou 8 perfurações, 8 medições de profundidade e inseriu 8 parafusos: ordem de uso dos instrumentos (eletrônico → manual ou manual → eletrônico) e do protetor de partes moles (com → sem ou sem → com) foi aleatorizada. 

Foram utilizados modelos ósseos sintéticos (Sawbones) de fêmur proximal, fêmur e tíbia, com espuma cobrindo a cortical oposta para impedir avaliação visual ou tátil. O equipamento eletrônico utilizado foi o Stryker CD NXT. As medições com o aparelho eletrônico foram comparadas àquelas feitas com medidor manual (Stryker 705012), com o display do eletrônico ocultado. 

Foi avaliada a eficiência por meio do tempo gasto entre a perfuração e a escolha do parafuso em cada método. 

A fim de avaliar a usabilidade, foi aplicado o System Usability Scale (SUS), questionário validado com 10 itens em escala Likert. Os participantes também responderam sobre sua disposição em pagar pelo uso do dispositivo, estimando o valor equivalente ao custo de parafusos. 

Após o estudo, descobriu-se que o fabricante recomenda adicionar 2 mm à profundidade medida com o medidor eletrônico. 

Essa informação não foi informada aos participantes durante o experimento, e os dados foram posteriormente corrigidos para considerar esse ajuste, aceitando uma protrusão aceitável de 0 a 3 mm como adequada. 

Análise Estatística 

Não foi feito cálculo prévio de tamanho amostral devido à ausência de dados prévios sobre o efeito esperado. 

Diferenças no tempo de medição entre grupos foram analisadas com Mann-Whitney, e demais dados com ANOVA e teste post-hoc de Tukey, conforme a distribuição dos dados. 

O estudo foi cuidadosamente desenhado para avaliar, em condições padronizadas e realistas, o desempenho de um medidor eletrônico de profundidade ortopédico em comparação ao método manual, com foco em eficiência, precisão, aceitação pelos usuários e aplicação prática. 

Não houve necessidade de aprovação ética formal conforme a legislação dinamarquesa e aprovado pelo comitê regional (REF 161/2024). Todos os participantes consentiram com o uso de seus dados pseudonimizados. 

RESULTADOS PRINCIPAIS 

Troca de Parafusos 

Após a correção pós-hoc, que consistiu na adição de 2 mm aos valores medidos pelo medidor eletrônico de profundidade, não foi observada diferença significativa entre o uso do medidor eletrônico e do medidor manual em relação à taxa de trocas de parafusos. No total, 20% dos parafusos (65 de 331) estavam fora da faixa considerada aceitável de penetração (0 a 3 mm). 

A experiência clínica dos participantes teve influência significativa sobre a taxa de trocas de parafusos (p = 0,03). Estudantes de medicina trocaram 26% dos parafusos, enquanto residentes trocaram 13% — uma taxa significativamente menor em comparação aos estudantes. Já os consultores ortopédicos apresentaram uma taxa de 19% de trocas. 

Eficiência (Tempo de Medição) 

O medidor eletrônico de profundidade demonstrou maior eficiência em relação ao método manual, proporcionando uma economia de tempo superior a 10 segundos por parafuso em todos os níveis de experiência. Entre os participantes, os estudantes economizaram em média 21,3 segundos, os residentes 12,2 segundos e os consultores 13,5 segundos por medição. A economia de tempo foi significativamente maior entre os estudantes (p < 0,001), o que destaca a eficiência do dispositivo mesmo entre usuários com pouca ou nenhuma experiência prévia. 

Usabilidade 

A usabilidade do medidor eletrônico de profundidade foi altamente avaliada pelos participantes, com uma pontuação média de 87,5 na escala SUS (System Usability Scale), que vai até 100, indicando alta aceitação do dispositivo. Cerca de 84% dos participantes o classificaram como “excelente” ou “o melhor imaginável”, e nenhum o avaliou como “ruim”. 

Quanto à disposição para pagar pelo equipamento, a mediana das respostas foi equivalente ao valor de 2,5 parafusos, refletindo uma percepção positiva de custo-benefício. Apenas cinco participantes afirmaram que o hospital não deveria arcar com o custo do dispositivo. 

Os comentários dos participantes destacaram aspectos positivos e negativos do medidor eletrônico de profundidade. Entre os pontos positivos, ressaltaram o feedback visual imediato fornecido pelo dispositivo e a segurança do sistema, que emite alertas caso seja utilizado de forma incorreta.  

Por outro lado, entre os pontos negativos, foi mencionada a necessidade de ajuste manual do comprimento do parafuso ao utilizar placas de diferentes espessuras, o que pode limitar a praticidade do equipamento em algumas situações clínicas. 

Discussão 

A discussão do estudo destaca que o medidor eletrônico de profundidade foi bem aceito e demonstrou eficácia, especialmente entre os profissionais menos experientes. No entanto, a diferença de tempo economizado por parafuso, embora estatisticamente significativa, pode ser clinicamente irrelevante em procedimentos ortopédicos simples. 

A elevada taxa de troca de parafusos observada com o uso do medidor eletrônico antes da correção dos dados evidencia a importância de um treinamento adequado e do conhecimento prévio das instruções específicas do fabricante, como o ajuste necessário de +2 mm. 

Após a correção dos dados, não foram encontradas diferenças significativas na taxa de trocas entre os métodos eletrônico e manual, o que indica que o uso do medidor eletrônico não elimina necessariamente os erros clínicos. Ainda assim, a aceitação geral do dispositivo foi muito alta, superando inclusive outras tecnologias semelhantes que haviam sido avaliadas negativamente por alguns dos mesmos participantes em estudos anteriores. 

Limitações 

Entre as limitações do estudo, destaca-se a diferença entre a profundidade medida e o comprimento ideal do parafuso, que pode variar conforme o objetivo clínico, como compressão ou uso com placas de diferentes espessuras. O medidor eletrônico, por não incluir o offset de +2 mm presente no medidor manual, frequentemente indicou parafusos mais curtos, o que impactou inicialmente a precisão das escolhas. 

Além disso, a ausência de tecidos moles nos modelos ósseos (sawbones) pode ter facilitado o uso do medidor manual, tornando os resultados menos representativos da prática clínica real. Outra limitação importante está relacionada ao equipamento eletrônico atual, que não é compatível com brocas longas usadas em hastes intramedulares bloqueadas e é comercializado como dispositivo de uso único, ao contrário dos medidores manuais que podem ser esterilizados e reutilizados, o que impacta negativamente na sustentabilidade e no custo-benefício. 

O que podemos levar para casa? 

O estudo mostrou que o medidor eletrônico de profundidade é altamente aceito, melhora a eficiência de medição e tem potencial clínico — mas não elimina a necessidade de troca de parafusos sem treinamento adequado. São necessários mais estudos em ambientes reais para confirmar seu impacto clínico em cirurgias ortopédicas. 

Por outro lado, o estudo apresenta diversos pontos fortes. O desenho randomizado, controlado e cruzado contribuiu para a alta confiabilidade dos resultados. A inclusão de participantes com diferentes níveis de experiência clínica — consultores, residentes e estudantes — permitiu uma avaliação ampla da aplicabilidade do dispositivo. A padronização do protocolo, com instruções uniformes e coleta de dados concentrada em três dias, garantiu consistência metodológica.  

Além disso, o cego visual e tátil da cortical oposta, realizado com o uso de uma simulação de tecidos moles, simulou restrições reais de visibilidade durante procedimentos cirúrgicos, aumentando o rigor do estudo. 

O medidor eletrônico de profundidade foi considerado “excelente” por ortopedistas, residentes e estudantes, com alta pontuação de usabilidade (SUS). Demonstrou-se eficiente em termos de tempo, mas não reduziu significativamente a troca de parafusos em comparação ao método manual. 

Para uso clínico eficaz, é essencial treinamento adequado e conhecimento sobre o offset correto a ser aplicado (0, 2 ou 4 mm) conforme o sistema de implante utilizado. 

Veja também: Fatores de risco para infecção após cirurgia ortopédica de trauma

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Referências bibliográficas

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