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Oncologia17 junho 2025

Quimioterapia neoadjuvante com docetaxel e cisplatina no carcinoma nasofaríngeo

Estudo mostra que a intensificação do tratamento ao adicionar quimioterapia antes da quimiorradioterapia melhora o desfecho de sobrevida global do paciente.

O carcinoma nasofaríngeo é uma neoplasia maligna que tem o seu manejo ainda desafiador, ainda mais por representar apenas 0,6% dos casos oncológicos totais no mundo, com maior incidência no sudeste asiático e no sul da China. Quando ele é diagnosticado com comprometimento nodal N2-3 (27,2-37,6% dos casos), apresenta alto risco de metástases à distância e alto risco de falha terapêutica.  

Apesar dos avanços nas técnicas de radioterapia e de quimioterapia concomitantes, que melhoraram o controle locorregional, o controle sistêmico permanece desafiador.  

A hipótese de micrometástases pré-existentes fundamenta a necessidade de abordagens terapêuticas mais intensivas, como a proposta nesse estudo. 

Ainda existe uma lacuna no conhecimento sobre o regime ideal de quimioterapia neoadjuvante para este câncer. A investigação de um regime eficaz, economicamente viável (portanto, que não seja caro) e com toxicidade manejável representa uma necessidade na prática oncológica, particularmente em regiões com recursos limitados, como os paises em desenvolvimento e subdesenvolvidos, onde a incidência é maior. 

Carcinoma

Método do estudo 

Trata-se de um ensaio clínico randomizado, multicêntrico, de fase 3, realizado em seis centros na China entre 2016 e 2019, comparando: 

Grupo intervenção: Quatro ciclos de quimioterapia neoadjuvante (docetaxel 75 mg/m² no dia 1 e cisplatina 37,5 mg/m² nos dias 2-3, a cada três semanas) seguidos de quimiorradioterapia concomitante 

Grupo controle: Quimiorradioterapia tradicional concomitantte 

A randomização foi estratificada por estágios N (N2 e N3) na proporção 1:1.  

Após dois ciclos de quimioterapia neoadjuvante, realizou-se avaliação da resposta (critério RECIST 1.1): pacientes com resposta parcial/completa receberam mais dois ciclos; aqueles com doença estável iniciaram quimiorradioterapia imediatamente; pacientes com progressão foram retirados do estudo. 

A quimiorradioterapia concomitante consistiu em radioterapia de intensidade modulada (IMRT) com cisplatina semanal (40 mg/m²). 

Os desfechos primários foram sobrevida livre de metástase à distância e sobrevida global em cinco anos. Desfechos secundários incluíram sobrevida livre de recidiva locorregional, sobrevida livre de doença, toxicidades e qualidade de vida. 

O tamanho amostral foi calculado para detectar um aumento na sobrevida livre de metástase à distância em cinco anos de 68,8% para 84,8% e na sobrevida global de 74,0% para 89,2%, com poder de 80% e significância bicaudal de 0,05. 

 

População envolvida 

O estudo incluiu 186 pacientes (93 em cada grupo) com carcinoma nasofaríngeo estágio T1-4,N2-3,M0, com as seguintes características: 

 

  • Critérios de inclusão:

– Idade ≤ 70 anos 

– Diagnóstico patológico de carcinoma nasofaríngeo não tratado em estágio T1-4N2-3M0 

 

  • Critérios de exclusão:

– Escore de Karnofsky ≤ 70 

– Metástase à distância pré-tratamento 

– Disfunção grave de órgãos vitais 

– Doenças neurológicas, mentais ou endócrinas graves 

– História de outros tumores malignos 

– Tratamento prévio com radioterapia, quimioterapia ou terapia alvo 

– Gravidez ou lactação 

 

  • Características demográficas:

– Predomínio do sexo masculino (74% vs 72%) 

– Idade mediana: 48 anos (intervenção) vs 44 anos (controle) 

– Excelente estado funcional: 92% vs 95% com Karnofsky 90-100 

– Distribuição N2: 74% vs 76%; N3: 26% vs 24% 

 

Resultados 

Após acompanhamento mediano de 76,9 meses, o grupo intervenção demonstrou superioridade significativa na: 

 

  • Sobrevida livre de metástase à distância em cinco anos:

– Grupo intervenção: 91,3% (IC 95%: 85,4%-97,2%) 

– Grupo controle: 78,2% (IC 95%: 69,8%-86,6%) 

– Razão de risco: 0,41 (IC 95%: 0,19-0,87); P=0,02 

 

  • Sobrevida global em cinco anos:

– Grupo intervenção: 90,3% (IC 95%: 84,2%-96,4%) 

– Grupo controle: 82,6% (IC 95%: 75,0%-90,2%) 

– Razão de risco: 0,38 (IC 95%: 0,18-0,82); P=0,01 

Os resultados representam redução de 59% no risco de metástase à distância e 62% no risco de morte. 

 

  • Adesão ao tratamento:

– 84% dos pacientes completaram quatro ciclos de quimioterapia neoadjuvante 

– 91% apresentaram resposta parcial/completa após dois ciclos 

– 98% e 97% dos pacientes que iniciaram radioterapia nos grupos intervenção e controle, respectivamente, completaram o tratamento 

 

  • Toxicidade:

– Toxicidades agudas grau 3/4: 65% vs 51% (P=0,05) 

– Neutropenia grau 3/4: 47% vs 11% (P<0,001) 

– Sem diferença significativa em toxicidades tardias 

– Tendência a melhor qualidade de vida após cinco anos no grupo intervenção 

 

Mensagem prática 

Esse estudo nos fornece evidência robusta de que quatro ciclos de quimioterapia neoadjuvante com docetaxel e cisplatina, seguida de quimiorradioterapia concomitante, devem ser considerada tratamento padrão para os pacientes com carcinoma nasofaríngeo estágio N2-3. 

 

  • Considerações práticas para implementação:

 

  1. Seleção adequada: O benefício foi demonstrado especificamente em pacientes com doença N2-3, que apresentam maior risco de metástases à distância.

 

  1. Manejo da toxicidade: A neutropenia grau 3 ou 4 foi significativamente mais frequente no grupo intervenção (47% vs 11%). O clínico deve estar atento a essa complicação e orientar o paciente a procurar ajuda médica no caso de febre.

 

  1. Avaliação após dois ciclos: A abordagem dinâmica permite identificar precocemente pacientes não-respondedores ao tratamento neoadjuvante e ajustar o tratamento.                                                                                  
  1. Considerações econômicas: O regime docetaxel-cisplatina é relativamente acessível comparado a regimes triplos, sendo importante essa análise em locais com recursos financeiros limitados.                                                    
  1. Acompanhamento prolongado: O estudo demonstrou benefícios sustentados após mais de seis anos, destacando a importância do seguimento rigoroso.                                                                                                                
  2. Impacto na qualidade de vida: A melhoria na qualidade de vida após cinco anos sugere que o controle eficaz da doença sistêmica beneficia o bem-estar geral do paciente a longo prazo.

Em suma, esse estudo apoia uma mudança de paradigma no tratamento do carcinoma nasofaríngeo estágio N2-3, mostrando que ele deve ser considerado uma doença com alto risco de disseminação sistêmica, exigindo uma abordagem terapêutica intensificada que inclua quimioterapia neoadjuvante seguida de tratamento locorregional definitivo com quimiorradioterapia. 

 

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Referências bibliográficas

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