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Oncologia23 outubro 2025

Expressão da proteína HER2 e amplificação do gene ERBB2 no carcinoma urotelial

Estudo mostra alta prevalência de expressão de HER2 e amplificação do ERBB2 em carcinoma urotelial avançado.

O carcinoma urotelial avançado, especialmente em sua forma metastática, continua sendo um desafio terapêutico na oncologia. Apesar dos avanços recentes, como a imunoterapia, muitos pacientes ainda têm opções limitadas de tratamento após a falha das terapias de primeira linha. Nos últimos anos, a busca por biomarcadores que possam guiar terapias-alvo tornou-se uma área de intensa investigação. Entre eles, o receptor do fator de crescimento epidérmico humano 2 (HER2) ganhou destaque, especialmente com o desenvolvimento de novas terapias, como os conjugados anticorpo-fármaco (ADCs), que demonstraram atividade em tumores com expressão mesmo baixa de HER2. 

Em câncer de mama e gástrico, a avaliação de HER2 já é rotina e bem padronizada, mas no carcinoma urotelial, essa prática ainda não está estabelecida. Estudos anteriores eram limitados por amostras pequenas, heterogeneidade metodológica e falta de consenso na classificação. Este artigo preenche uma lacuna crucial ao fornecer dados robustos sobre a prevalência de expressão proteica e amplificação gênica de HER2 em uma coorte ampla e diversificada, oferecendo subsídios para a prática clínica e para o desenho de futuros estudos. 

Veja também: Estudo estima que mortes por câncer devem crescer em 75% até 2050

carcinoma urotelial

Desenho metodológico 

Os pesquisadores realizaram um estudo transversal utilizando 2.024 amostras de tecido de carcinoma urotelial avançado (sítio primário ou da metástase), fixadas em formol e incluídas em parafina. As amostras foram obtidas de fontes comerciais na América do Norte, Europa e Ásia, com critérios rigorosos de inclusão: fixação adequada, pelo menos 35% de células tumorais e não mais que 20% de necrose. 

A expressão da proteína HER2 foi avaliada por imuno-histoquímica (IHC), utilizando o anticorpo monoclonal 4B5, seguindo protocolo semelhante ao usado em câncer de mama. A amplificação do gene ERBB2 foi detectada por hibridização in situ dupla (DISH), que permite visualizar simultaneamente o gene e o centrômero do cromossomo 17. 

Os patologistas envolvidos foram treinados e certificados, e as leituras foram realizadas de forma cega para evitar viés. A classificação do status de HER2 seguiu critérios consolidados em outras neoplasias: 

– HER2-zero: IHC 0 (sem expressão) 

– HER2-low: IHC 1+ ou IHC 2+ sem amplificação no DISH 

– HER2-positivo: IHC 3+ ou IHC 2+ com amplificação no DISH 

Além disso, os autores avaliaram a heterogeneidade da expressão entre diferentes cortes do mesmo bloco de tecido e entre amostras primárias e metastáticas pareadas. 

População envolvida 

A coorte foi composta por 2.024 amostras, sendo a grande maioria (1.968) de tumores primários e 56 de metástases. A idade mediana dos pacientes foi de 68 anos, com ampla variação (22-107 anos), refletindo a faixa etária típica do carcinoma urotelial. Houve predomínio do sexo masculino (79,2%), consistente com a epidemiologia conhecida da doença. 

Quanto à origem geográfica, 58,2% das amostras eram da Europa, 18% da América do Norte e 23,8% da Ásia. A distribuição racial, quando informada, mostrou maioria de brancos (60,4%) e asiáticos (39,2%). Em relação ao estádio, 42,7% eram estágio II, 49,4% estágio III e 7,9% estágio IV. A maioria das amostras primárias foi obtida por ressecção cirúrgica (83,6%), e o restante por ressecção transuretral. 

Resultados  

Os resultados revelam que mais da metade dos tumores (52,5%) apresentou algum grau de expressão de HER2: 

– 14,7% foram classificados como IHC 1+ 

– 24,6% como IHC 2+ 

– 13,2% como IHC 3+ 

A expressão foi semelhante entre tumores primários e biópsia das metastáses, com uma leve tendência de maior expressão nas metástases (60,7% vs. 52,2%), mas sem significância estatística. Curiosamente, amostras obtidas por ressecção transuretral tiveram maior taxa de expressão (65%) do que as cirúrgicas (49,7%), possivelmente refletindo viés de seleção ou características tumorais. 

A amplificação do gene ERBB2 foi detectada em 11,6% dos casos. Houve uma forte correlação entre a intensidade da expressão imuno-histoquímica e a amplificação gênica: 

– IHC 0: 2,7% amplificados 

– IHC 1+: 3,7% amplificados 

– IHC 2+: 9,6% amplificados 

– IHC 3+: 56,2% amplificados 

Isso significa que, mesmo entre os tumores com IHC 0 ou 1+, uma pequena parcela apresenta amplificação gênica, o que pode ter implicações clínicas. 

Quando classificados conforme o status clínico de HER2: 

– 47,5% foram HER2-zero 

– 36,9% HER2-low 

– 15,6% HER2-positivo 

A análise de heterogeneidade mostrou boa concordância intra-bloco e entre sítios primário e metastático, sugerindo que a biópsia primária pode ser suficiente para orientar a terapia, embora em alguns casos a reavaliação da metástase possa identificar alterações. 

Considerações clínicas e implicações para a prática 

Este estudo confirma que uma proporção significativa de pacientes com carcinoma urotelial avançado expressa HER2 em nível detectável, abrindo portas para terapias dirigidas. Quase 40% dos tumores se enquadram nas categorias HER2-low ou HER2-positivo, que são alvos em estudos com ADCs como trastuzumabe deruxtecano. 

Na prática clínica, isso significa que: 

Testar HER2 deve ser considerado em pacientes com doença avançada, mesmo que a amplificação gênica não seja detectada, já que a expressão proteica baixa (IHC 1+ ou 2+) pode ser suficiente para beneficiar-se de algumas terapias. 

A imuno-histoquímica é um método válido e acessível para triagem, mas em casos de IHC 2+, o teste de amplificação (DISH ou FISH) é necessário para definir HER2-positivo. 

A heterogeneidade é um desafio, mas a concordância entre sítios sugere que a amostra primária é geralmente representativa. Ainda assim, na progressão metastática, pode valer a pena reavaliar o status de HER2. 

Este trabalho também alerta para a necessidade de padronização dos critérios de avaliação de HER2 no carcinoma urotelial, assim como ocorreu em mama e estômago. Enquanto diretrizes específicas não forem estabelecidas, oncologistas e patologistas devem adotar os critérios atuais com cautela, interpretando os resultados à luz do contexto clínico. 

Destaca-se que quase 3% dos tumores IHC 0 tinham amplificação gênica, que mostra um grupo que poderia ser negligenciado se apenas a IHC fosse realizada. Isso reforça a importância de, em contextos de pesquisa e em casos selecionados, considerar testes genômicos complementares. 

Autoria

Foto de Gabriel Madeira Werberich

Gabriel Madeira Werberich

Possui graduação em Medicina pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2009). Residência de Clínica Médica pela UERJ/Hospital Universitário Pedro Ernesto(HUPE)/Policlínica Piquet Carneiro(PPC). Residência Medica em Oncologia Clínica pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA). Fellowship (R4) de Oncologia Clínica no Hospital Sírio Libanês (2016). Concluiu a residência médica de Radiologia e Diagnóstico por Imagem no HUCFF-UFRJ e R4 de Radiologia do Centro de Imagem do Copa Dor, com ênfase em Ressonância Magnética de Medicina Interna, e mestrado em Medicina na UFRJ concluído em 2023. Tem experiência na área de Clínica Médica, Oncologia Clínica e Diagnóstico por Imagem em Tórax, Medicina Interna e Radiologia Oncologica. Pos-Graduação em curso de Inteligencia Artificial aplicada a Saúde.

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