A oncologia cutânea passou por transformação substancial na última década. Embora o melanoma permaneça o paradigma de inovação terapêutica, o manejo do carcinoma espinocelular cutâneo (CEC) e do carcinoma basocelular (CBC) avançado também evoluiu de forma decisiva. A incorporação de imunoterápicos e terapias-alvo expandiu as possibilidades de controle sustentado da doença, ao mesmo tempo em que trouxe novos desafios: manejo de toxicidades imunomediadas, acompanhamento prolongado e necessidade de reorganização de fluxos assistenciais.
Do ponto de vista histórico, a abordagem sistêmica do câncer de pele avançado era limitada. Quimioterápicos como cisplatina e taxanos ofereciam respostas modestas e transitórias. O surgimento dos inibidores de checkpoint trouxe uma mudança radical: pacientes antes classificados como paliativos passaram a apresentar sobrevida prolongada, com curvas que, pela primeira vez, sugeriram platôs compatíveis com controle duradouro da doença.

Melanoma avançado: sobrevida prolongada e novos paradigmas
O estudo CheckMate 067 permanece um marco. O seguimento estendido demonstrou mediana de sobrevida global acima de 70 meses com a combinação nivolumabe + ipilimumabe, contra 36,9 meses com nivolumabe isolado. Uma proporção significativa dos pacientes mantém resposta duradoura mesmo após suspensão do tratamento. Esses resultados posicionam a combinação como estratégia de maior potencial curativo, embora acompanhada de maior toxicidade (cerca de 55% de eventos grau 3–4).
O advento de relatlimabe, inibidor de LAG-3, ampliou o arsenal terapêutico. A combinação nivolumabe + relatlimabe mostrou melhora em sobrevida livre de progressão com toxicidade intermediária entre anti–PD-1 isolado e a clássica dupla PD-1/CTLA-4. Para pacientes com contraindicação relativa à combinação mais agressiva, trata-se de alternativa relevante.
Em paralelo, o uso de terapia-alvo com dabrafenibe + trametinibe continua a desempenhar papel central nos tumores com mutação BRAF V600, tanto em cenário metastático quanto adjuvante. A discussão entre imunoterapia e terapia-alvo como tratamento inicial permanece individualizada, considerando carga tumoral, velocidade de progressão, sintomas e perfil molecular.
CEC avançado: consolidação do anti–PD-1
O carcinoma espinocelular cutâneo, embora frequentemente curado cirurgicamente em estágios iniciais, pode ter comportamento agressivo em pacientes imunossuprimidos, transplantados ou com doença avançada localmente. O estudo pivotal com cemiplimabe demonstrou taxa de resposta objetiva próxima de 50%, com respostas duráveis e tolerabilidade adequada, mesmo em pacientes idosos e fragilizados, um perfil que predomina na epidemiologia do CEC avançado.
Os dados subsequentes reforçam que o benefício se estende a subgrupos complexos, como pacientes com neoplasias hematológicas associadas e indivíduos com extensa invasão perineural. A radioterapia mantém papel relevante, especialmente como adjuvante em tumores de alto risco ou como tratamento definitivo quando a cirurgia não é viável.
Com a ascensão das imunoterapias, emerge uma população inédita de long survivors, exigindo abordagem sistemática de vigilância. O oncologista passa a lidar não apenas com a remissão oncológica, mas também com sequelas tardias, toxicidades irreversíveis e prevenção de novos tumores cutâneos.
Os eventos adversos imuno-relacionados (irAEs) representam a principal limitação das imunoterapias. Algumas toxicidades são reversíveis, outras deixam sequelas permanentes.
As toxicidades mais frequentes incluem endocrinopatias (hipotireoidismo, hipofisite, insuficiência adrenal), colite imunomediada, pneumonite e hepatite imunomediada.
A abordagem ideal requer protocolos institucionais claros, com exames regulares nas primeiras 12–16 semanas, período de maior risco de eventos. Em pacientes com histórico prévio de autoimunidade, a decisão de iniciar imunoterapia exige discussão aprofundada, com envolvimento de especialistas.
O Dezembro Laranja reforça a importância de prevenção e diagnóstico precoce, mas a oncologia deve ir além da campanha anual, estruturando educação, protocolos e fluxos interdisciplinares.
Autoria

Lethícia Prado
Médica formada pela Universidade Federal do Ceará ⦁Residência em Clínica Médica pelo Hospital Federal dos Servidores do Estado - RJ ⦁ Residência em Oncologia Clínica pelo INCA.
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