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Oncologia19 dezembro 2025

Desempenho do trastuzumabe deruxtecana no mundo real em câncer de mama

Estudo de mundo real avalia eficácia e segurança do TDXd em câncer de mama HER2-low HR-negativo agressivo.

Nos últimos anos, a classificação HER-2low mudou a forma como tratamentos as pacientes com câncer de mama. Durante décadas, tumores HER-2negativos eram tratados de forma uniforme até que estudos como DESTINY-Breast-04 provaram que aqueles com HER2 +1 ou 2+ respondem a terapias anti-HER2, especialmente ao trastuzumabe deruxtecana (TDXd). 

O problema é que praticamente todos os grandes estudos focaram em mulheres hormônio-positivas, que são a maioria do grupo HER2-low. Já as pacientes HR-negativas, especialmente aquelas com doença agressiva, múltiplas linhas prévias e metástases no SNC representam um desafio clínico, pois apresentam respostas mais baixas, sobrevida encurtada e menos opções eficazes na falha de quimioterapias convencionais. 

Este artigo chinês busca preencher exatamente essa lacuna, de como o TDXd se comporta na realidade em mulheres HR-negativas e HER-2low, que sabidamente é um grupo raramente estudado e de pior prognóstico. Ele busca avaliar eficácia e toxicidade em um cenário mais próximo do consultório do que os ensaios clínicos controlados. 

trastuzumabe

Metodologia 

O estudo é uma coorte retrospectiva, multicêntrico, reunindo dados clínicos de quatro instituições chinesas entre maio de 2022 e maio de 2025. Os critérios de inclusão foram: mulheres com câncer de mama metastático confirmado, com HR-negativo/ HER2-low e pelo menos ter recebido uma dose de TDXd. As pacientes haviam recebido uma mediana de 3 linhas prévias, muitas delas usando taxanos, platina, capecitabina ou imunobiologico. 

O tratamento seguiu a prática padrão: TDXd a cada 21 dias mantido até progressão, toxicidade ou escolha médica. A resposta foi analisada retrospectivamente por RECIST 1.1. 

Os desfechos avaliados foram: Taxa de resposta objetiva (ORR); Controle da doença (DCR); Sobrevida livre de progressão na prática real (rwPFS); Sobrevida global (OS); Toxicidades segundo CTCAE 5.0. 

Um ponto interessante foi a inclusão de painéis de NGS em 28 pacientes para buscar biomarcadores de resistência. 

População envolvida 

As 64 mulheres incluídas representam um retrato muito agressivo da doença: 

  • Idade mediana de 47 anos (mais jovens que a média internacional) 
  • 73% com metástases viscerais (quase metade com fígado comprometido) 
  • 17% com metástases cerebrais (um grupo normalmente excluído de ensaios) 
  • Duas em cada três estavam em terceira linha ou mais 
  • 15% já tinham usado um ADC antiTrop2 (sacituzumabe govitecano), um detalhe crucial para interpretação dos resultados 
  • Metade era HER2 +1 e metade HER2 +2, o que permitiu comparações úteis 

Trata-se de uma coorte vida real, de difícil manejo, bem diferente das pacientes mais selecionadas do DESTINY-Breast-04. 

Resultados 

  • Eficácia 

Mesmo em um cenário tão adverso os números foram clinicamente relevantes: 

  • ORR 35,9% 
  • DCR 75? 
  • rwPFS 5,0 meses 
  • OS 14,9 meses 

Esses resultados são menores que os do DESTINYBreast-04, mas devem ser lidos com cuidado: no DB04, as HR-negativas eram menos tratadas, tinham menos doença cerebral e não tinham passado por ADC prévio. 

  • Diferenças por intensidade de expressão HER2 

Os dados reforçam um padrão que vem aparecendo em estudos menores: as pacientes HER2 +2 tiveram melhor rwPFS que as HER2 +1 (6,0 vs 3,9 meses; HR 0,54). 

Essa diferença sugere que o nível de expressão pode influenciar diretamente na eficiência de internalização do ADC e entrega da quimioterapia. 

  • Doença cerebral 

Pacientes com metástases cerebrais tiveram resultados claramente piores:  

  • rwPFS 3,6 meses 
  • OS 8,6 meses 

Esse dado confirma a dificuldade de ação plena do TDXd no SNC, o que já havia sido observado em outras coortes. 

  • Uso prévio de sacituzumabe govitecano (SG) 

Talvez o achado mais importante: Nenhuma das 10 pacientes previamente tratadas com SG alcançou resposta ao TDXd. A rwPFS caiu para 3,1 meses. 

Isso alimenta a discussão sobre resistência cruzada entre ADCs, possivelmente pela semelhança dos payloads e mecanismos de internalização. 

  • Biomarcadores (NGS) 

Os genes mais alterados foram TP53, PIK3CA, MYC e PTEN. 

  • Segurança 

O perfil de toxicidade foi parecido com o dos ensaios clínicos: Náuseas 72%; fadiga 39:; neutropenia 31%; vômitos 26%; trombocitopenia 17%. As toxicidades grau 3 ou 4 ocorreram em 14% das pacientes principalmente neutropenia (9,4%); trombocitopenia (7,8%) e doença intersticial pulmonar (em 3 pacientes, sendo um caso grave). 

Um ponto relevante é que mesmo com antiemese tripla, a náusea seguiu muito prevalente. O estudo cita os dados recentes do ERICA Trial, mostrando que a inclusão de olanzapina reduz a incidência de náusea tardia. 

Mensagem prática 

Este estudo responde a perguntas que enfrentamos frequentemente no consultório ao tratar pacientes com doença agressiva e poucas opções: 

  1. OTDXdfunciona em HR-negativas e HER2-low? 

Aparentemente sim. Mas devemos levar em conta que se trata de um estudo retrospectivo e com número pequeno de pacientes. Funciona mais como um levantador de hipóteses para estudos grandes do que uma resposta definitiva.  

  1. HER2 +2 parece melhor que HER2 +1?

Neste estudo sim, com diferença expressiva de rwPFS. Isso reforça que embora HER2-low seja um grupo contínuo, existe um gradiente biológico relevante. 

  1. Posso usarTDXddepois de sacituzumabe govitecano? 

Provavelmente o benefício é menor. A ausência de respostas nesse subgrupo é um alerta. Isso pode influenciar a ordem de uso dos ADCs na prática clínica. 

  1. Como manejar a náusea persistente?

Considere olanzapina como parte da profilaxia antiemética mesmo em pacientes já usando esquema tradicional 

  1. E quanto a biomarcadores?

Nada definitivo ainda. Alterações em BRCA1 e MYC merecem investigação adicional, mas não são úteis para tomada de decisão hoje 

  1. Que paciente se beneficia menos?

Metástases cerebrais, com pior prognóstico e quem teve exposição prévia a outros ADCs pode haver resistência cruzada e piorar o prognostico tambem. 

Este estudo preenche uma lacuna importante na literatura ao mostrar que o trastuzumabe deruxtecana tem atividade significativa na realidade mesmo em um cenário de doença muito agressiva. A eficácia é mais modesta que nos ensaios clínicos, mas totalmente compatível com a complexidade da população. 

Autoria

Foto de Gabriel Madeira Werberich

Gabriel Madeira Werberich

Possui graduação em Medicina pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2009). Residência de Clínica Médica pela UERJ/Hospital Universitário Pedro Ernesto(HUPE)/Policlínica Piquet Carneiro(PPC). Residência Medica em Oncologia Clínica pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA). Fellowship (R4) de Oncologia Clínica no Hospital Sírio Libanês (2016). Concluiu a residência médica de Radiologia e Diagnóstico por Imagem no HUCFF-UFRJ e R4 de Radiologia do Centro de Imagem do Copa Dor, com ênfase em Ressonância Magnética de Medicina Interna, e mestrado em Medicina na UFRJ concluído em 2023. Tem experiência na área de Clínica Médica, Oncologia Clínica e Diagnóstico por Imagem em Tórax, Medicina Interna e Radiologia Oncologica. Pos-Graduação em curso de Inteligencia Artificial aplicada a Saúde.

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