O câncer de sítio primário oculto (CSPO) é uma entidade incomum, representando menos de 4% de todas as malignidades e com uma taxa de incidência mundial que não supera 15 casos: 100.000 pessoas-ano.
A apresentação mais corriqueira é a doença metastática multiorgânica, na ausência de pistas óbvias sobre o sítio primário, o que pode ser atribuído às pequenas dimensões ou regressão tumoral no local de origem, impondo um grande desafio diagnóstico.
Os principais fatores de risco são o tabagismo, etilismo, diabetes e história familiar oncológica positiva.
Os tipos histológicos mais frequentes são:
- Adenocarcinoma (60%);
- Carcinoma pouco diferenciado ou indiferenciado (30%);
- Carcinoma de células escamosas (10%).
Em relação aos sítios de metástases, nota-se acometimento multiorgânico em um terço dos casos, hepático em 25% e linfonodal em 7%.
Fatores de mau prognóstico |
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A pesquisa do sítio primário, sempre que viável, deve ser realizada de forma sistemática, mas sem infringir a janela de oportunidade para a intervenção oncológica.
- Entrevista médica cuidadosa (contemplando as exposições e histórico familiar);
2. Exame físico minucioso (incluindo exame pélvico, mamas, região anal, cavidade oral e fundoscopia);
3. Exames laboratoriais:
Hemograma, painel metabólico completo (função renal e hepática, glicemia e eletrólitos), LDH, EAS e marcadores tumorais (PSA, alfafetoproteína, beta-HCG, CEA, CA 19-9, CA 15-3, CA-125 e Cromogranina A);
4. Exames radiológicos pertinentes:
TC ou RM contrastada do tórax, abdome e pelve ou PET scan, se disponível;
Mamografia, US ou RM de mamas;
US de bolsa escrotal (sobretudo entre homens jovens com linfadenopatia de linha média).
5. Exames endoscópicos pautados na suspeição clínica:
Endoscopia digestiva alta e colonoscopia;
Laringoscopia e broncoscopia;
Cistoscopia.
Leia também: A origem de metástases em pacientes com câncer pode ser genética?
Dicas para a identificação do sítio primário:
- Homem > 40 anos com metástases blásticas e PSA elevado: próstata;
- Mulher com carcinoma seroso peritoneal: ovário;
- Mulher com carcinoma e linfadenopatia axilar isolada: mama;
- Carcinoma de células escamosas e linfadenopatia cervical: cabeça e pescoço;
- Imunofenotipagem com CK20+ e CDX2+: trato gastrointestinal inferior ou colorretal.
A meta terapêutica, em geral, é paliativa, em decorrência da natureza disseminada da condição. Entretanto, o tratamento cirúrgico ou radioterápico podem ser dotados de potencial curativo se as metástases estiverem em sítio único ou limitado.
O sítio primário, quando pode ser inferido, é o guia que direcionada a terapia oncológica. Todavia, na maioria dos casos, a apresentação é atípica, de forma que uma quimioterapia empírica deve ser considerada, a exemplo da combinação entre uma platina (carboplatina ou cisplatina) e paclitaxel ou gencitabina. Ademais, as terapias guiadas por biomarcadores e com eficácia comprovada, são encorajadas.
A indefinição do sítio primário pode ser contornada, em muitos casos, com a imunofenotipagem em amostra tecidual tumoral, preferencialmente obtida por core biopsy, pois essa modalidade preserva a arquitetura tissular.
Além da imunofenotipagem, deve-se buscar a determinação do perfil molecular e genético do tumor, com vistas às terapias alvo-molecular, com exemplificado na tabela abaixo:
Alteração molecular |
Terapia alvo |
Mutação BRAF V600E |
Dabrafenibe + trametinibe. |
Amplificação HER2 |
Trastuzumabe. |
Deficiência de reparo ou instabilidade microssatélite |
Anticorpos anti-PD1 e PD-L1 |
Alta carga de mutações |
Pembrolizumabe |
Conclusão e Mensagens práticas
- O carcinoma de sítio primário oculto (CSPO) é uma condição rara, agressiva e que impõe um grande desafio diagnóstico. A investigação é pautada na entrevista médica, exame físico, exames laboratoriais, imaginológicos, endoscópicos, histopatológicos e imuno-histoquímicos. Os principais tipos histológicos implicados são, em ordem, adenocarcinoma, carcinoma indiferenciado e carcinoma de células escamosas. A gravidade clínica muitas vezes impõe a necessidade de instituição de quimioterapia empírica sem que um sítio primário tenha sido identificado. Já nos casos em que o sítio primário pode ser inferido em tempo hábil, o tratamento oncológico deve ser individualizado.
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