Em nossa publicação semanal de conteúdos compartilhados do Whitebook Clinical Decision falaremos sobre a doença meningocócica, em especial a meningite meningocócica. Fique por dentro das principais condutas médicas, procedimentos e profilaxia relacionados à doença.
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[box type="warning" align="aligncenter" class="" width=""]Este conteúdo deve ser utilizado com cautela, e serve como base de consulta. Este conteúdo é destinado a profissionais de saúde. Pessoas que não estejam neste grupo não devem utilizar este conteúdo. [/box]
Anamnese
Quadro clínico: As manifestações iniciam-se, em média, nos primeiros dez dias após contágio. O paciente apresenta-se, em geral, hipotenso e taquicárdico. A febre é um importante sinal da doença, apesar de ser bastante inespecífico.Meningite meningocócica: Corresponde a cerca de 50% dos casos de doença meningocócica e tem quadro inicial indistinguível das demais formas de meningites (febre, cefaleia, vômitos, irritabilidade, rigidez de nuca, fotofobia, letargia, tonteira, convulsão, sinais neurológicos focais), sendo o rash petequial ou purpúrico mais característico desse agente etiológico, porém ausente em 1/3 dos pacientes. Mais de 40% dos pacientes com meningite apresentam outros sinais de meningococcemia.
Meningococcemia: Isolada representa mais de 20% dos casos. Inicialmente, os sintomas são inespecíficos (febre, cefaleia, sonolência, mialgia, vômitos e dor abdominal), assim como o rash. Purpura fulminans ocorre em 15-25% dos casos. Com a progressão da doença, o paciente desenvolve choque com consequente disfunção orgânica.
Fatores de risco: Hipoesplenismo e hipogamaglobulinemia aumentam o risco. Condições que afetam o epitélio da nasofaringe contribuem para a colonização da bactéria e, consequentemente, aumentam o risco de doença invasiva, dentre elas: tabagismo ativo ou passivo e danos à mucosa nasofaríngea (por infecções respiratórias altas, baixa umidade do ar e escoriações induzidas por poeira).
Atenção! Sintomas de infecção de vias aéreas superiores precedendo a doença invasiva são comuns, uma vez que a bactéria coloniza a nasofaringe antes de cair na corrente sanguínea.
Exame Físico
Manifestações hemorrágicas: É fundamental despir o paciente à procura de petéquias ou equimoses. O rash (em 80% dos indivíduos), é inicialmente semelhante a um exantema viral (maculopapular). No entanto, ele se torna petequial ou francamente purpúrico (lesões >1 cm) após 12 horas de apresentação. As lesões petequiais são maiores e têm coloração mais azul-arroxeada do que as petéquias induzidas por trombocitopenia ou vasculites. Sinais de gravidade: Deve-se observar se há sinais de hemorragia em palato e conjuntiva palpebral. Nos casos de maior gravidade, ocorrem hemorragia cutânea e necrose secundárias à coagulopatia e à trombose intravascular, quadro denominado de purpura fulminans.
Exames laboratoriais de rotina: Hemograma; glicemia; marcadores de inflamação aguda; funções renal e hepática; eletrólitos; coagulograma e gasometria arterial; hemoculturas.Principais alterações: Leucocitose e aumento de marcadores inflamatórios (PCR, procalcitonina, VHS). Outros achados comuns: hipoglicemia, acidose, hipocalemia, hipocalcemia, hipomagnesemia, hipofosfatemia, anemia e coagulopatia.
Exames de imagem (TC/RNM de crânio): Indicados se risco de hipertensão intracraniana (imunossupressão, história de TCE recente, alteração do nível de consciência, papiledema, déficit neurológico focal) e pré-punção lombar.
Punção lombar: Na ausência de contraindicações (hipertensão intracraniana, coagulopatia, trombocitopenia, infecção cutânea local), deve sempre ser realizada para análise liquórica (celularidade, bioquímica, bacterioscopia, cultura e/ou PCR).
Confirmação diagnóstica: A confirmação diagnóstica é feita a partir do isolamento da N. meningitidis no sangue ou líquor do paciente. A bactéria também pode ser identificada pela análise histopatológica das lesões cutâneas.
Hemoculturas: Positivas em 50-60% dos casos, nos quais o antibiograma é essencial para a avaliação de resistência à antibioticoterapia empregada.
Detecção por PCR: Método cujo resultado costuma ser mais rápido do que as culturas e que permanece positivo por alguns dias mesmo após o início de antibioticoterapia, além de ter maior sensibilidade e especificidade. Limita-se pela baixa disponibilidade.
Principais alterações:
- Celularidade: leucócitos >100/mm3 (com predomínio de polimorfonucleares);
- Glicose: hipoglicorraquia (<45 mg/dl);
- Proteínas: hiperproteinorraquia (>500 mg/dl);
- Bacterioscopia: diplococos gram-negativos;
- Cultura: positiva em 80-90% dos casos.
- O diagnóstico diferencial se estabelece com outras causas de sepse com rebaixamento do nível de consciência e/ou manifestações neurológicas ou hemorrágicas:
- Sepse grave por pneumococo, estreptococo, estafilococo ou bactérias Gram-negativas;
- Meningite por outros agentes etiológicos (pneumococo, hemófilos);
- Enterovirose;
- Vasculites;
- Desordens plaquetárias (PTI, efeito de drogas, infiltração neoplásica de medula óssea).
Indicações de internação: Indica-se internação em UTI quando o paciente apresenta desidratação grave e choque, alteração significativa do sensório, insuficiência respiratória, estado de mal epiléptico e/ou meningococcemia.Indicações de alta: Critérios para alta hospitalar incluem melhora do estado clínico, ausência de vômitos e aceitação alimentar, reversão da desidratação, e estabilização do quadro neurológico.
Escores clínicos para avaliação prognóstica:
- Mortalidade: Cerca de 10% dos pacientes morrem, mesmo quando submetidos às intervenções adequadas. As principais causas de óbito na meningococcemia são o choque séptico e a consequente disfunção orgânica, enquanto que a hipertensão intracraniana responde pela maioria dos óbitos na meningite.
- Complicações: A principal complicação (10% dos casos) é a cicatriz resultante da necrose de lesões cutâneas purpúricas, para a qual um enxerto pode ser útil. Os membros inferiores são os mais afetados, seguidos pelos membros superiores, tronco e face. Amputações são necessárias em 2% dos indivíduos devido à isquemia periférica ou síndrome compartimental. Aproximadamente 7% dos pacientes ficam com sequelas neurológicas (disfunção cognitiva, perda visual ou auditiva, dificuldade de aprendizagem, retardo no desenvolvimento, alterações comportamentais).
- Fatores associados a mau prognóstico: Choque, extremos de idade, coma, purpura fulminans, coagulação intravascular disseminada, trombocitopenia, leucopenia e acidose metabólica.
Suporte clínico: O manejo do paciente consiste em medidas de suporte (oxigenioterapia, ventilação mecânica, ressuscitação volêmica, aminas vasoativas, correção de distúrbios hidroeletrolíticos).Isolamento respiratório: Recomenda-se isolamento respiratório para gotículas por até 24 horas após início do tratamento.
Antibioticoterapia empírica:
- Adultos: ceftriaxona 2 g EV de 12/12 horas por 7 dias.
- Crianças: penicilina G cristalina 200.000-400.000 UI/Kg/dia de 4/4 horas por 5-7 dias; OU ampicilina 200-300 mg/Kg/dia EV de 6/6 horas por 5-7 dias; OU ceftriaxona 100 mg/kg/dia EV de 12/12 horas por 5-7 dias.
- Casos secundários (manifestações nas primeiras 48 horas a partir do caso suspeito/confirmado) são comuns entre contactantes de indivíduos infectados, e a profilaxia secundária com antibiótico é recomendada nesses casos o mais rápido possível (preferencialmente nas primeiras 48 horas após a exposição). A antibioticoprofilaxia é restrita a: contactantes íntimos ou domiciliares de indivíduos infectados, comunicantes de creches ou escolas e pessoas, podendo incluir profissionais de saúde, expostas a secreções respiratórias sem uso de EPI (até 24 horas após o início do tratamento):
- Rifampicina 5 mg/kg VO de 12/12 horas por 2 dias para crianças menores de 1 mês, 10 mg/kg (maximo de 600 mg/dia) VO 12/12 horas por 2 dias para crianças maiores de 1 mês e adultos;
- Ceftriaxona 125 mg IM dose única para menores de 12 anos, e 250 mg IM dose única para maiores de 12 anos;
- Ciprofloxacino 500 mg VO dose única, também pode ser usado como profilaxia para > 18 anos, com exceção de gestantes, lactantes e crianças pequenas.
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