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Neurologia27 novembro 2025

Síndrome Miastênica de Lambert-Eaton (LEMS): O que precisamos saber? 

O conhecimento sobre a Síndrome Miastênica de Lambert-Eaton (LEMS) é crucial para o tratamento, incluindo malignidades associadas

Síndrome Miastênica de Lambert-Eaton (LEMS) é uma doença autoimune rara do nervo motor pré-sináptico, caracterizada pela tríade de fraqueza proximal, hiporreflexia e disfunção autonômica. 

Apesar de conhecida há décadas, o reconhecimento clínico precoce ainda é um desafio — especialmente porque seus sintomas podem simular outras miastenias, neuropatias e até miopatias. 

Fisiopatologia 

A LEMS é causada por autoanticorpos contra os canais de cálcio dependentes de voltagem (P/Q-type VGCC), presentes na membrana pré-sináptica da junção neuromuscular. Esses anticorpos reduzem a entrada de cálcio e, consequentemente, diminuem a liberação de acetilcolina (ACh), levando à falha na transmissão neuromuscular. 

Em condições normais, o potencial de ação promove a abertura desses canais, influxo de cálcio e liberação de vesículas de ACh. Na LEMS, esse processo é bloqueado — resultando em fraqueza muscular e disfunção autonômica. 

Até 60% dos casos estão associados a neoplasias, especialmente o carcinoma de pequenas células do pulmão (SCLC), caracterizando a forma paraneoplásica da doença. 

Síndrome miastênica de Lambert-Eaton (LEMS): O que precisamos saber? 

Imagem de rawpixel/freepik.

Epidemiologia e prognóstico: Síndrome Miastênica de Lambert-Eaton

A LEMS tem prevalência estimada em 10 casos por milhão, sendo cerca de 50 vezes menos comum que a miastenia gravis. O tipo paraneoplásico predomina em homens com média de idade entre 58 e 60 anos, enquanto a forma idiopática (não tumoral) é mais comum em mulheres na faixa dos 50 anos. 

O prognóstico depende da causa subjacente: 

  • Sem tumor: expectativa de vida normal, embora com sintomas crônicos que afetam a qualidade de vida. 
  • Com SCLC: sobrevida mediana de 18 meses, mas curiosamente maior do que pacientes com SCLC isolado, possivelmente por diagnóstico mais precoce devido à investigação neurológica. 

Manifestações clínicas 

A tríade clássica inclui: 

  1. Fraqueza proximal — predominante em membros inferiores, com progressão para membros superiores. 
  2. Hiporreflexia ou arreflexia — reflexos reduzidos ou ausentes, mas que melhoram após breve exercício, um achado quase patognomônico. 
  3. Disfunção autonômica — presente em até 80% dos casos, manifestando-se como boca seca, constipação, hipotensão ortostática, disfunção erétil e sintomas urinários.

fraqueza ocular e bulbar é geralmente leve (ao contrário da miastenia gravis), e o comprometimento respiratório é raro.  

A presença de ataxia, dismetria ou disdiadococinesia pode sugerir degeneração cerebelar paraneoplásica, observada em até 10% dos casos com SCLC. 

Diagnóstico e exames complementares  

O diagnóstico baseia-se na clínica e confirmação laboratorial/eletrofisiológica. 

  • Sorologia: 

Anticorpos contra VGCC tipo P/Q são positivos em cerca de 85-90% dos pacientes e são altamente específicos para LEMS. Anticorpos contra canais do tipo N e L podem estar presentes, mas têm valor diagnóstico limitado. 

  • Eletrofisiologia: 

padrão eletrofisiológico característico inclui a tríade: 

  1. Baixa amplitude do potencial de ação composto (CMAP) em repouso. 
  2. Decremento com estimulação repetitiva lenta (2–3 Hz). 
  3. Incremento ≥ 100% após exercício breve (10 s) ou estimulação rápida (50 Hz) — o chamado sinal de facilitação pós-exercício. 

Estudos mostram que reduzir o ponto de corte para 60% de incremento melhora a sensibilidade diagnóstica de 85% para 97%, sem perda de especificidade. 

single-fiber EMG também pode ser utilizado quando há alta suspeita e exames convencionais negativos. 

  • Busca por malignidade: 

Dada a forte associação com SCLC, recomenda-se rastreamento oncológico periódico (a cada 3–6 meses por 2 anos). 

DELTA-P score (Dutch-English LEMS Tumor Association Prediction) auxilia a estimar o risco de tumor oculto e guiar a frequência dos exames de imagem. 

Tratamento 

O tratamento combina manejo da causa de baseterapia sintomática e imunomodulação.  

  • Terapia sintomática: 

O fármaco de escolha é a 3,4-diaminopiridina (3,4-DAP), que bloqueia canais de potássio e prolonga a despolarização pré-sináptica, aumentando a liberação de ACh. 

Dose inicial: 10 mg três vezes ao dia, podendo ser titulada até 80 mg/dia (risco de crise convulsiva acima desse limite). 

O medicamento melhora força e fadiga em poucos dias, sendo considerado o tratamento padrão. 

  • Imunoterapia: 

Para casos graves ou refratários, indicam-se imunoglobulina intravenosa (IVIg)plasmaférese e imunossupressores (prednisona, azatioprina, rituximabe). Quando a doença é paraneoplásica, o tratamento do tumor é fundamental para o controle dos sintomas neuromusculares. 

  • Acompanhamento: 

Deve envolver oncologia, neurologia e fisioterapia. Mesmo após controle inicial, a recidiva é possível, justificando seguimento contínuo.  

Conclusão  

Síndrome Miastênica de Lambert-Eaton é um exemplo clássico de como um exame clínico atento e conhecimento fisiopatológico podem mudar o curso da doença.  Diante de fraqueza proximal com hiporreflexia que melhora após exercício, o neurologista deve pensar em LEMS — e agir rápido.  Diagnóstico precoce significa melhor resposta terapêutica, chance de identificar um tumor oculto e melhor prognóstico funcional e de sobrevida.

Autoria

Foto de Thiago Nascimento

Thiago Nascimento

Formado em Medicina pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) em 2015. Residência Médica em Neurologia no Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) Salvador - Bahia (2016-2019). Membro titular da Academia Brasileira de Neurologia (ABN). Mestrando em Ciências da Saúde pela UFBA (PPGCs - UFBA). Preceptor da Residência de Neurologia do HU- UFS - (Ebserh - Aracaju- SE). Médico Neurologista - Membro do Ambulatório de Neuroimunologia do HU- UFS - (Ebserh - Aracaju- SE). Professor na Afya Educação Médica.

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