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Neurologia6 julho 2022

Esclerose múltipla e a terapia canábica

Atualmente, a ANVISA autoriza o uso da combinação THC/CBD para o tratamento de espasmos musculares moderados a graves na esclerose múltipla.

Por Ease Labs

Com curso crônico-degenerativo e abordagem terapêutica ainda limitada, a esclerose múltipla ainda é uma patologia desafiadora, sendo interesse científico contínuo em pesquisas para melhor entendimento da EM.  

A esclerose múltipla é uma doença autoimune e inflamatória caracterizado pela destruição dos oligodendrócitos, com consequente degradação da bainha de mielina, levando a lesões cerebrais e medulares, com sintomatologia e apresentação clínica compatível com o território neurológico afetado. Essa degradação do tecido neuronal leva a uma esclerose (cicatrização com formação de tecido conjuntivo fibroso) onde o tecido saudável é, ao longo do curso da doença, substituído por tecido não neuronal.  

Diversas hipóteses são relacionadas ao desenvolvimento da patologia, com associações complexas entre predisposição genética associada a fatores ambientais (estilo de vida, infecções virais) que originariam uma disfunção no sistema imunológico. Inicia-se então uma resposta imunológica mediada por linfócitos T CD4+ (como Th1 e TH17) que por sua vez ativam a produção de citocinas via macrófagos, levando a morte celular.

Sistema endocanabinoide e neuroinflamação

Com a descoberta do sistema endocanabinóide, diversas ações neuromoduladoras foram também definidas. Evidência in vivo e in vitro em mamíferos confirmam esses dados: os canabinóides podem alterar as atividades dos linfócitos T no sangue, através de receptores CB2, alterando a apresentação de antígenos, reduzindo a produção de citocinas pro-inflamatórias. Além disso, os endocanabinóides (canabinóides endógenos) teriam o papel de reduzir a apoptose das células da glia.

Esses efeitos foram confirmados em ensaios animais, em análises diretas e em culturas de células com oligodendrócitos. Através da indução de toxicidade por peroxinitritos e zinco, e antagonista dos receptores CB1 e CB2. Os animais sem tratamento, os sintomas clínicos iniciaram a partir do décimo dia, com escores clínicos estimados 3 a 3,5. Já os que receberam CB52 (agonista dos receptores canabinóides) retardaram o início, iniciando a partir do décimo terceiro dia, com escores clínicos, estando ao redor de 1,5.

Da pesquisa básica aos ensaios clínicos: evidências do tratamento com cannabis

As manifestações clínicas da esclerose múltipla podem ocorrer em padrões episódicos (com ciclos de sintomas e remissão) ou em caráter progressivo, com sintomas neurológicos leves ou graves. Os sintomas podem ser sensitivos ou motores, incluindo dor, espasticidade e rigidez muscular, disfunção vesical, além de sintomas cognitivos-funcionais. Atualmente a base do tratamento têm sido a redução de crises, retardar a progressão da doença bem como reduzir sintomas e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.

Diversos ensaios clínicos foram conduzidos com desde as descobertas dos potenciais terapêuticos da cannabis na esclerose múltipla. Dentre esses objetivos, destacam-se a abordagem da dor e espasticidade/rigidez muscular nos pacientes com EM. Além disso, vale ressaltar que muitos desses pacientes apresentam outras manifestações como insônia e ansiedade por exemplo, onde estudos não direcionados especificadamente aos pacientes portadores de EM já mostraram benefício nos extratos da cannabis.

Em uma metanálise publicado no periódico JAMA, a tolerabilidade e resposta da terapia canábica foi avaliada de acordo com as indicações para dor, disfunção vesical e espasticidade. A análise incluiu a diferença entre média padronizada, incluindo 17 ensaios clínicos randomizados duplo-cego controlado por placebo, com no mínimo duas semanas de tratamento e follow-up dos pacientes. Ao final da análise estatística, foram incluídos cerca de 3161. As intervenções propostas foram o uso de fitocanabinóides (extrato de cannabis oral, extrato de cannabis por mucosa oral e canabinóides sintéticos). A avaliação da espasticidade fora feito através de análise objetiva pela escala de Ashworth e através de avaliação subjetiva pelos dados fornecidos pelos pacientes. Os resultados mostraram diferenças estatisticamente significativas a favor do grupo cannabis vs placebo (avaliação subjetiva; sem alteração na escala de Ashworth) no extrato de cannabis oral (diferença média padronizada, -0,27 DP; IC 95%, -0,44 a -0,09 DP) e nabiximols (diferença média padronizada, -0,29 DP; IC 95%, -0,47 a -0,12 DP). Os resultados em dor apresentaram diferenças estatisticamente significativas a favor do extrato oral (diferença média padronizada, -0,33 DP; IC 95%, -0,50 a -0,16 DP) e nabilona (diferença média padronizada, -1,40 DP; IC 95%, -2,78 a -0,03 DP), e congruente a esses achados, o encontrado na disfunção vesical fora semelhante, com resultado positivo na terapia canabinóide.

Prescrição de cannabis na esclerose múltipla

Atualmente, a ANVISA autoriza o uso da combinação THC/CBD (27/25 mg por ml) para o tratamento de espasmos musculares moderados a graves na EM, com indicação nos pacientes que não apresentaram bons resultados após a utilização de outras medicações antiespásticas. Recomenda-se inicio da titulação gradual da medicação, observando os limites de dose máxima para THC e CBD, o que corresponde a 12 puverizações da apresentação spray (dados on-label). Outras apresentações orais com concentrações semelhantes de THC/CBD estão disponíveis, podendo ser uma perspectiva no tratamento da EM nesse perfis de pacientes. 

Esse conteúdo foi produzido em parceria com a Ease Labs.

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