Esse ano foi publicada a diretriz para manejo de pacientes acometidos por hemorragia intracraniana (ICH) pela American Heart Association (AHA) e American Stroke Association (ASA). No geral, é um documento extenso e muito bem detalhado nas recomendações para essa grave condição.
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O guideline fornece 10 recomendações como foco para o manejo de hemorragia intracraniana:
1) O desenvolvimento de sistemas regionais de cuidado e de capacitação para AVC são importantes para uma boa assistência primária assim como para garantir uma rápida transferência para cuidados neurointensivos e avaliação neurocirúrgica.
2) A realização de neuroimagem é crucial não apenas para a detecção do AVC hemorrágico como também para avaliação prognóstica. Em exames de rápido acesso como tomografia de crânio (TCC) há marcadores, sendo ou não contrastados, que podem indicar pior desfecho clínico visto que demonstram risco para expansão do hematoma.
A expansão do hematoma em hemorragias intracranianas pode ocorrer nas primeiras 24 horas do ictus. Alguns marcadores prognósticos em neuroimagem que sugerem risco para expansão do hematoma são:
▪ Em TCC com estudo de vasos: Presença de “spot sign”.
▪ Em TCC sem contraste: Presença de densidades heterogêneas do hematoma assim como irregularidade nas margens.
3) A hemorragia intracraniana, assim como outras formas de AVC, são consequências de patologias vasculares. Doenças como arteriosclerose, angiopatia amiloide cerebral e malformações vasculares estão entre as causas mais comuns. É importante identificar a patogêneses dessa hemorragia, seja micro ou macrovascular, visto que influencia na conduta médica e na informação prognóstica. A angiopatia amiloide cerebral, por exemplo, é condição que proporciona significativas chances de recorrência.
4) O manejo de pacientes com hemorragia intracraniana está atrelado ao controle pressórico. Afinal, o controle sustentado da pressão arterial possibilita redução nas chances de expansão do hematoma assim como melhor desfecho funcional. Sabe-se que pressão arterial elevada está associada à expansão do hematoma, à mortalidade e à dependência funcional.
As recomendações para controle pressórico são advindas de dois grandes ensaios clínicos, o INTERACT2 e o ATACH-2. Há recomendação de manter uma pressão arterial sistólica inferior a 130 e 140 mmHg para hemorragias intracranianas de estágio leve e moderado. Níveis inferiores de 130 mmHg para pressão arterial sistólica assim como pressão arterial elevada são potencialmente maléficas e devem ser evitadas.
5) Os pacientes que são anticoagulados e apresentam hemorragia intracraniana, geralmente, possuem elevado risco de morbimortalidade. Nessa diretriz, há recomendação para reversão aguda de anticoagulação após hemorragia intracraniana que irá variar com a classe de anticoagulante:
6) Algumas terapias intra-hospitalares historicamente utilizadas para pacientes com hemorragia intracraniana não apresentam benefício ou podem até causar malefício.
Em contexto de emergência ou cuidado intensivo de ICH, corticosteroides profiláticos ou terapia hiperosmolar não possuem benefícios em desfecho. A terapia com transfusão de plaquetas — que não esteja relacionado a contexto de trombocitopenia grave ou fora de contexto cirúrgico — aparenta piorar desfechos funcionais.
Drogas antiepilépticas prescritas, sem evidências de crises epilépticas, não melhoram controle de crise epiléptica a longo prazo e não apresentam melhora em desfecho funcional.
O uso de meias elásticas de compressão como monoprofilaxia de tromboembolismo venoso (TEV) não aparentam ser efetivas. Para profilaxia de TEV, os autores dessa diretriz recomendam uso de aparelhos de compressão pneumática desde o diagnóstico de hemorragia intracraniana. Em metanálise de 4 estudos provida por Paciaroni e colaboradores, o uso de profilaxia de TEV medicamentoso (com heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular) proporcionou redução de risco de embolia pulmonar quando iniciado entre 48 horas e 96 horas após início da hemorragia intracraniana sem aumentar de forma significativa expansão do hematoma.
7) Foi demonstrado redução de mortalidade a partir de abordagens cirúrgicas minimamente invasivas para drenagem de hematomas supratentoriais ou intraventriculares ao comparar-se com manejo conservador. Contudo, não há evidência clínica nesses casos para desfechos funcionais.
Para pacientes com hemorragia cerebelar, há recomendação nova de abordagem cirúrgica com ou sem derivação ventricular externa (DVE) para hematomas de grande volume (> 15 mL) além das outras indicações prévias como: deterioração neurológica, compressão de tronco encefálico e hidrocefalia.
8) A decisão de como e quando limitar tratamentos de suporte após uma hemorragia intracraniana permanecem complexos e altamente dependente de preferência individual.
Esta diretriz enfatiza que a decisão de atribuir o status em não realizar reanimação cardiopulmonar é totalmente distinta da decisão de limitar outras intervenções médicas e cirúrgicas. Sendo assim, essa recomendação não deve ser usada para decisões sobre limitação em reanimação cardiopulmonar.
Escalas de gravidade (como, por exemplo, o ICH score) podem ser úteis para prover medidas de gravidade da hemorragia, mas não devem ser utilizadas como base para limitação de terapias de suporte.
9) A reabilitação é fator determinante na melhora de desfechos e de qualidade de vida dos pacientes acometidos por hemorragia intracraniana.
Atividades como alongamento e terapias de tarefas funcionais devem ser consideradas entre 24 e 48 horas após ICH de estágio moderado. Casos de mobilização precoce agressiva dentro de 24 horas do ictus aparentam piorar desfecho de mortalidade em 14 dias.
10) Um bom manejo de pacientes acometidos por ICH também envolve a instrução e o acolhimento do cuidador. O guideline recomenda educação psicossocial, práticas de suporte e treinamento do cuidador para melhoria no equilíbrio nas atividades e, em geral, na qualidade de vida do paciente.
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