Para muitos de nós, profissionais de saúde, a comunicação com os pacientes e seus familiares pode causar desconforto, ansiedade, angústia e frustração. No entanto, por vezes ela é leve, divertida, interessante e reconfortante. Estudar comunicação é um caminho para desenvolver conversas desse segundo tipo. Além disso, algumas conversas difíceis podem ser previstas, ou mesmo evitadas, com a abordagem correta. Através da comunicação efetiva, construímos uma relação de confiança com os pacientes desde o momento inicial.
Algumas pessoas parecem nascer com o dom da comunicação, mas essa habilidade pode ser aprendida e cultivada por qualquer pessoa. Este texto inaugura uma série de artigos sobre como melhorar a comunicação com seus pacientes nos mais diversos cenários. Aqui, conversaremos sobre o valor inestimável dessa habilidade e porquê devemos desenvolvê-la.
Como a comunicação interfere no dia a dia?
Toda conversa é uma via de mão dupla. Um bom médico deve ser capaz de ouvir, identificar o que realmente importa para o seu paciente, transmitir a ele suas principais preocupações, e conciliar ambos interesses. Dessa forma, o paciente fica aliviado por ter suas preocupações ouvidas e mais propenso a seguir as recomendações fornecidas. Da mesma forma, o médico se sente recompensado por estar fazendo a diferença para aquele indivíduo, observa resultados positivos, e trabalha mais feliz.
Se você se sente desconfortável ao repassar uma notícia ruim, saiba que você não está sozinho. Isso pode ocorrer em diferentes contextos, seja na unidade básica de saúde ou na UTI. Você pode ser o clínico que explica ao paciente diabético que ele precisa de insulinoterapia, o nefrologista que precisa conversar sobre hemodiálise, ou a ginecologista que identifica um câncer de colo de útero. Quando a comunicação não é adequada, tanto o médico quanto o paciente sofrem. Assim, com o tempo, o acúmulo de experiências ruins na interação médico-paciente pode levar você ao burnout.
Nos tempos atuais, enfrentamos uma grande heterogeneidade na formação médica do país. Além disso, exemplos de maus profissionais são diariamente divulgados e podem gerar desconfiança da população quanto à classe médica como um todo. Assim, mais do que nunca, devemos desenvolver nossa capacidade de comunicação para criar uma base sólida de mútua confiança entre médico e paciente.
O que faz um médico ser bom?
Note que até o momento não entramos no mérito da capacidade técnica. Isso porque a comunicação é tão importante quanto o conhecimento científico e as habilidades práticas. Não adianta, por exemplo, saber todas as recomendações do último guideline de dislipidemia, se o seu paciente não compreendeu o potencial malefício da hipercolesterolemia. Não é suficiente decorar um livro texto de Clínica Médica, se você não conseguir obter a confiança do seu paciente para lhe contar os seus sintomas. Aprender Comunicação não serve apenas como uma habilidade “extra” que irá melhorar sua prática médica. Ela é um pré-requisito fundamental para que você se torne um bom profissional.
A comunicação efetiva tem três componentes: verbal, não-verbal e paraverbal 3. O componente verbal envolve a escolha de palavras para lidar com o conteúdo da mensagem, como informações sobre doença, prognóstico e opções de tratamento. O domínio não-verbal inclui linguagem corporal, expressões faciais e distância espacial. Por sua vez, o componente paraverbal envolve tom, ritmo, e volume da voz. Apesar da maior parte das pessoas focarem no componente verbal, apenas 10% da mensagem é fornecida com palavras. Os componentes não-verbal e paraverbal contribuem com os outros 90% da mensagem 3,11.
Benefícios da boa comunicação
Grandes trabalhos mostram que a maior parte dos médicos superestimam sua capacidade de comunicação 1,2. Dessa forma, ainda que sua auto percepção seja de que suas habilidades são adequadas, existe grande probabilidade de elas ainda poderem melhorar.
Uma boa relação possui diversos benefícios para o médico e seu paciente:
- Melhora as capacidades diagnósticas do médico por entender melhor o paciente 5.
- Redução de distúrbios psiquiátricos, estresse e burnout em médicos 6.
- Melhora da satisfação do paciente com o tratamento oferecido 8.
- Maior aderência do paciente ao tratamento proposto 9.
- Melhora da qualidade de vida do paciente, adaptação à doença, redução de sintomas físicos e psicológicos 10.
- Redução de processos contra médicos por má prática 3,4,7.
Os pacientes possuem cada vez mais acesso à informação. Além disso, os avanços tecnológicos na medicina tornam a tomada de decisão mais complexa. Assim, pacientes e suas famílias precisam de auxílio do médico para interpretar informações pré-concebidas, com base no conhecimento técnico, julgamento clínico e experiência 12. Além disso, o médico deve integrar o conhecimento técnico com as prioridades e valores do paciente 12. O profissional que possui essas capacidades se destaca dos demais.
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Mensagem final
Aprender sobre comunicação certamente não impede que conversas difíceis aconteçam, mas pode transformá-las em boas experiências. Conforme dito anteriormente, existe uma via de mão dupla, onde o médico deve constantemente adaptar sua mensagem conforme a sua percepção do paciente e o feedback que recebe, verbal e não-verbal, a cada instante. O aprendizado formal de técnicas de comunicação, aliado à prática desses conceitos e experiência, irão fornecer a flexibilidade e as ferramentas necessárias para tomar decisões conscientes durante uma conversa. Ao final desta série esperamos ajudar você nesse processo.
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