Publicamos recentemente um caso clínico sobre leucemia/linfoma de células T do adulto e HTLV I. Por isso, em nossa publicação semanal de conteúdos compartilhados do Whitebook Clinical Decision, vamos abordar a apresentação clínica e abordagem diagnóstica da infecção por HTLV.
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Infecção por HTLV
Anamnese e Exame Físico
Quadro clínico: A infecção aguda pelo HTLV é raramente observada ou diagnosticada, pois a maioria dos casos é assintomática (90%) e latente. Os padrões de manifestações clínicas variam entre os tipos de HTLV.
HTLV-1:
- Geralmente associado a leucemia de células T de adultos e mielopatia/paraparesia espástica tropical, sendo rara a associação das duas síndromes:
- Leucemia-linfoma de células T de adultos (ATL): Desenvolve-se em 2-4% dos indivíduos infectados pelo HTLV-1. Os sintomas são variáveis e podem se manifestar como fadiga, linfadenopatia, hipercalcemia, náuseas, vômitos, febre ou dor abdominal. Quatro subtipos clínicos são conhecidos:
- Forma aguda: Corresponde a 47-57% dos casos de ATL, caracterizada por linfocitose e linfadenopatia generalizada. Observa-se também um curso curto e agressivo (média de sobrevida de 6 meses), com hipercalcemia, lesões ósseas líticas, infiltrado pulmonar, hepatoesplenomegalia, lesões cutâneas (nódulos, úlceras, rash papular);
- Forma crônica: ocorre em 20% dos casos e tem melhor prognóstico (sobrevida de 2 anos). É caracterizada por linfocitose absoluta persistente por meses a anos, com predomínio de linfócitos T anormais. Linfadenopatia, hepatomegalia, esplenomegalia e envolvimento de pele ou do pulmão são possíveis. Não há manifestações em sistema nervoso central, ossos, trato gastrintestinal, ascite, hipercalcemia ou efusões pleurais;
- Forma oligossintomática: é o tipo menos comum (5% dos casos) e é caracterizada por linfócitos T anormais (até 5%) no sangue periférico, com contagem normal de linfócitos. Aparecem lesões de pele, podendo ocasionalmente ocorrer acometimento pulmonar também. A hipercalcemia, linfadenopatia ou outras manifestações viscerais não estão associadas a essa forma;
- Forma linfomatosa: ocorre em aproximadamente 20-25% dos casos e apresenta-se com linfadenopatia generalizada, hepatoesplenomegalia, lesões cutâneas, hipercalcemia e ausência de acometimento do sangue periférico (ausência de linfocitose);
- Mielopatia/paraparesia espástica tropical: Desenvolve-se em 1-2% dos indivíduos com infecção pelo HTLV-1, sendo mais comum em mulheres. Caracteriza-se por doença degenerativa progressiva insidiosa que acomete primariamente o trato corticospinal da medula espinal torácica, com quadro de inflamação perivascular e infiltração de parênquima por linfócitos T, levando à degeneração e fibrose local;
- O grau de infiltração é menor do que em outras infecções retrovirais (ex.: infecção pelo HIV), talvez devido à patogênese lentificada do vírus. É provável, também, a indução de processos autoimunes ou ataque citotóxico em células infectadas por esse vírus;
- Os pacientes evoluem com paresia, hipoestesia e rigidez de membros inferiores (geralmente, consiste no sintoma inicial em 60% dos pacientes), incontinência urinária e/ou grave lombalgia com irradiação para membros inferiores. Em alguns casos, polaciúria, urgência urinária, incontinência e retenção precedem paraparesia por vários anos;
- Os pacientes também podem apresentar sintomas de disfunção autonômica levando à constipação e, em alguns casos, à disfunção sexual;
- Uveíte/manifestações oculares: Decorre da presença do vírus no humor vítreo. Outras manifestações oculares correspondem à vasculite retiniana, coroidopatia e ceratopatia;
- Dermatite: Caracteriza-se por quadro crônico e grave, que se manifesta principalmente em crianças infectadas por transmissão vertical, geralmente com maior carga de provírus. Está associada ao quadro de mielopatia/paraparesia espástica tropical na adolescência, em 30% dos casos;
- Outras associações incluem síndrome de Sjögren, polimiosite e artropatia crônica inflamatória. As manifestações cutâneas adicionais incluem estomatite aftosa, eczema e verrugas não genitais;
- Manifestações orais: Em adição à síndrome de Sjögren, outras manifestações orais são comuns, como xerostomia, candidíase, fissura na língua e perda de papilas gustativas. Sugere-se também que a periodontite esteja associada à infecção pelo HTLV.
HTLV-2: Não há evidências conclusivas sobre a associação da infecção por HTLV-2 a alguma doença específica. Sugere-se que existam manifestações neurológicas semelhantes às complicações de HTLV-1, com exceção do quadro de mielopatia. As patologias já descritas como relacionadas à infecção pelo HTLV-2 são pneumonia, bronquite, artrite, asma e dermatite.
HTLV-3 e HTLV-4: Desconhece-se a associação a doenças específicas.
As complicações da infecção pelo HTLV ocorrem nos estágios mais tardios da evolução da doença e incluem:
- Estrongiloidiase (a profilaxia com Ivermectina ou Albendazol deve ser considerada);
- Pneumonia por Pneumocystis jiroveci (a profilaxia com Sulfametoxazol + trimetoprima deve ser instituída em caso de tratamento para leucemia-linfoma de células T em adultos);
- Meningite criptocócica;
- Infecções fúngicas;
- Infecções virais (citomegalovírus, herpes-zóster, herpes simples).
Fatores de risco: Aleitamento, transfusão sanguínea, contato sexual, transplantes ou uso de drogas intravenosas.
Abordagem diagnóstica
Os exames diagnósticos incluem sorologia por ELISA e confirmação por Western blot, imunofluorescência ou reação de polimerização em cadeia (PCR) quantitativa para HTLV. Para os pacientes diagnosticados com infecção pelo HTLV-1 ou HTLV-2, deve-se submetê-los à sorologia para HIV, hemograma com exame morfológico das células linfoides, dosagem de LDH e cálcio sérico.
Recomenda-se também realizar sorologia para hepatites (A, B, e C), VDRL, prova tuberculínica, e exame parasitológico de fezes (com pesquisa de larvas – Strongyloides stercoralis).
Os exames radiológicos de imagem devem ser utilizados na avaliação de acometimento pulmonar, cervical, abdome e pelve, especialmente na avaliação de infecções oportunistas. A punção lombar para avaliar o liquor para anticorpos anti-HTLV-1 (e/ou carga de provírus HTLV) pode ser útil para estabelecimento do diagnóstico de mielopatia/paraparesia espástica tropical.
Estudos histopatológicos de material de biópsia de linfonodos ou citologia são úteis na avaliação de malignidade periférica relacionada às células T.
Exames de rotina: Sorologia por ELISA e confirmação por Western blot, imunofluorescência ou reação de polimerização em cadeia (PCR) quantitativa para HTLV, sorologia para HIV, hemograma, dosagem de LDH e cálcio sérico, sorologia para hepatites (A, B, e C), VDRL, prova tuberculínica, exame parasitológico de fezes (com pesquisa de larvas – Strongyloides stercoralis), EAS.
Deve-se também solicitar mielograma com análise morfológica dos linfócitos, imunofenotipagem do sangue periférico (com painel mínimo para CD3, CD4, CD7, CD8 e CD25), biópsia com histopatológico e imuno-histoquímica do sítio acometido (medula óssea, linfonodo, pele, etc.) e exame de liquor (em caso de forma agressiva de leucemia de células T do adulto).
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