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Infectologia23 novembro 2024

Urina infectada e paciente sem sintomas. Quais são as indicações de tratamento?

A bacteriúria assintomática (BA) é definida como a presença de bactérias na urina sem sintomas urinários associados
Por Ester Ribeiro

É comum, como nefrologista, lidar com represálias de pacientes que apresentam urina “infecciosa”, mas sem sintomas. Nesses casos, a melhor conduta é não tratar, conforme as diretrizes. No entanto, esses pacientes frequentemente chegam frustrados após passarem por outros especialistas que, ao analisarem o exame, dizem algo como: “Nossa! O nefrologista não viu essa infecção com mais de 1 milhão de leucócitos? Já que ele não passou antibiótico, pode deixar que eu passo!”. E assim, o paciente acaba utilizando uma quinolona sem qualquer indicação adequada.   

A situação é tão recorrente que passei a incluir uma observação em todos os exames de urina 1 que identificam bacteriúria assintomática e não têm indicação de tratamento:   

“Bacteriúria assintomática. Tratar apenas em gestantes ou antes de procedimentos urológicos invasivos.” 

Não se trata de preciosismo ou chatice do nefrologista. O tratamento inadequado dessa condição traz riscos reais ao paciente. Para refrescar a memória, segue um resumo dos principais pontos que justificam essa conduta baseada em evidências. 

Saiba mais: Bacteriúria assintomática: tratamento antibiótico é eficaz?

urina infecctada

O que é Bacteriúria Assintomática 

A bacteriúria assintomática (BA) é definida como a presença de bactérias na urina sem sintomas urinários associados. É uma condição comum que muitas vezes leva a decisões sobre a necessidade de tratamento antimicrobiano. No entanto, existem poucas indicações para tratar a bacteriúria assintomática, e o tratamento inadequado pode contribuir para o desenvolvimento de resistência antimicrobiana. 

Quando preciso tratar a BA? 

O tratamento da BA é recomendado em circunstâncias específicas, conforme as diretrizes atualizadas da Infectious Diseases Society of America (IDSA) e outras fontes. As principais situações em que o tratamento é indicado incluem: 

1. Gravidez: As mulheres grávidas devem ser rastreadas para BA no início do pré-natal e tratadas se o resultado for positivo. Isso se deve ao risco aumentado de pielonefrite e complicações associadas à gravidez, como parto prematuro e baixo peso ao nascer. 

2. Procedimentos Urológicos: Indivíduos que irão se submeter a procedimentos urológicos que envolvem trauma da mucosa devem ser rastreados e tratados para BA. Isso é para prevenir infecções pós-operatórias que podem ocorrer devido à presença de bactérias na urina. 

Fora dessas situações, o tratamento da BA não é recomendado, pois não há evidências de que o tratamento melhore os desfechos clínicos e pode, na verdade, contribuir para a resistência antimicrobiana. Isso inclui pacientes com diabetes, aqueles com cateteres de longa permanência, pacientes com lesão medular, e pacientes submetidos a cirurgias não urológicas, entre outros. 

Quais os riscos de tratar indevidamente a Bacteriúria Assintomática? 

1 – O tratamento desnecessário de BA pode levar ao aumento da resistência antimicrobiana.  

Estudos demonstram que mulheres tratadas para BA apresentam uma maior prevalência de cepas bacterianas resistentes a antibióticos, como Escherichia coli, em comparação com aquelas que não foram tratadas. Isso é particularmente preocupante em um contexto de crescente resistência antimicrobiana global. 

2 – O tratamento de BA pode resultar em um aumento na frequência de infecções. 

O número de infecções (realmente sintomáticas) a curto prazo após o tratamento da BA pode aumentar, sem oferecer benefícios clínicos significativos. Isso sugere que a intervenção pode, paradoxalmente, predispor os pacientes a infecções mais frequentes. 

3 – O aumento dos efeitos adversos relacionados ao uso de antibióticos. 

Efeitos adversos incluindo infecções por Clostridioides difficile podem ser graves e aumentar os custos de saúde. O uso inadequado de antibióticos também está associado a hospitalizações prolongadas, como observado em pacientes hospitalizados tratados para BA. Outros efeitos colaterais como alterações eletrolíticas, gastrite associada ao uso de antimicrobianos também devem ser considerados. 

Veja também: Saiba o que é bacteriúria assintomática e como combatê-la

Conclusão

As diretrizes atuais recomendam o rastreamento e tratamento da bacteriúria assintomática em mulheres grávidas e em indivíduos que irão se submeter a procedimentos urológicos com risco de trauma mucoso. Portanto, a abordagem ao tratamento da BA deve ser cuidadosa e baseada em evidências, limitando-se às situações em que há um benefício claro e documentado. 

O tratamento inadequado da bacteriúria assintomática pode levar a consequências indesejadas, como resistência antimicrobiana e infecções por Clostridium difficile, além de aumentar os custos de saúde. Portanto, é importante reduzir o tratamento desnecessário dessa condição. 

Autoria

Foto de Ester Ribeiro

Ester Ribeiro

Graduada em Medicina pela PUC  de Campinas. Médica Nefrologista pelo Hospital Santa Marcelina de Itaquera. Título em Nefrologia pela Sociedade Brasileira de Nefrologia.

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