Logotipo Afya
Anúncio
Infectologia7 novembro 2025

Reemergência do vírus H5N1 no Camboja 

Surto reforça a importância da vigilância ativa para possíveis infecções humanas por vírus da influenza aviária (H5N1)
Por Raissa Moraes

Após uma década sem registros de casos humanos, o Camboja enfrenta uma nova onda de infecções pelo vírus da influenza aviária altamente patogênica (HPAI) A(H5N1), com taxa de mortalidade geral de 38%. A maioria dos casos ocorreu em crianças e adolescentes expostos a aves domésticas infectadas. Entre fevereiro de 2023 e agosto de 2024, foram detectadas 16 infecções por meio dos sistemas nacionais de vigilância de síndrome gripal e de infecção respiratória aguda grave, ambos fortalecidos com a ampliação da capacidade laboratorial desenvolvida durante a pandemia de covid-19.  

Os casos   

Todos os 16 pacientes relataram contato com aves doentes ou mortas, e as investigações epidemiológicas identificaram vírus geneticamente semelhantes em aves coletadas nas proximidades das residências dos casos, bem como em mercados de aves vivas monitorados. O sequenciamento genômico revelou origem aviária para todas as infecções humanas. 

Embora a maioria dos casos tenha ocorrido em domicílios distintos, houve múltiplas infecções em quatro residências. Em 27 de março de 2023, dois casos humanos de infecção pelo vírus A(H5N1) foram confirmados no Camboja. O primeiro caso, relatado em 23 de fevereiro, envolveu uma criança com evolução fatal; o segundo, notificado em 24 de fevereiro, correspondeu ao pai da paciente, que apresentou quadro leve. Inicialmente, esse caso levantou a hipótese de transmissão interpessoal; no entanto, investigações conduzidas pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) demonstraram início simultâneo dos sintomas e exposição direta a aves domésticas infectadas, confirmando a exposição aviária como principal via de infecção. 

Os primeiros casos, registrados em fevereiro de 2023, foram causados pelo vírus endêmico regional A(H5N1) do clado 2.3.2.1e (anteriormente classificado como 2.3.2.1c segundo a nomenclatura da OMS). Casos subsequentes, entretanto, estiveram associados a um novo vírus recombinante resultante da aquisição, pelo clado local 2.3.2.1e, de genes provenientes do clado 2.3.4.4b e de vírus aviários de baixa patogenicidade. Essa recombinação provavelmente ocorreu por meio de aves silvestres ou de transmissão não detectada entre aves domésticas. O vírus recombinante disseminou-se pela região do Grande Mekong, substituindo cepas anteriores, e apresenta assinaturas genômicas (como PB2:E627K) associadas a maior atividade da polimerase, virulência e capacidade replicativa em aves e mamíferos — fatores que ampliam o risco tanto para a indústria avícola quanto para a transmissão zoonótica.  

Reemergência do vírus H5N1 no Camboja 

Vírus H5N1 sob microscópio eletrônico. Imagem de CDC/Cynthia Goldsmith; Jacqueline Katz; Sherif R. Zaki

Alerta sobre a infecção humana por gripe aviária  

A emergência desse novo genótipo e a reemergência de infecções humanas ressaltam o caráter dinâmico e imprevisível da evolução do vírus HPAI A(H5N1), especialmente em regiões com elevada interface entre humanos e aves domésticas. Desde 2021, observou-se expansão desse vírus em termos de hospedeiros e áreas geográficas, aumentando o risco de transbordamento zoonótico. O surto no Camboja reforça a necessidade de que os países mantenham vigilância ativa para possíveis infecções humanas por vírus da influenza aviária, em especial por meio dos Centros Nacionais de Influenza (NICs) e dos sistemas de vigilância vinculados à Rede Global de Vigilância e Resposta à Influenza (GISRS). Amostras humanas positivas para influenza A, mas negativas para os subtipos sazonais, devem ser rapidamente encaminhadas a um Centro Colaborador da OMS.  

Medidas de proteção e prevenção 

Considerando a circulação persistente do vírus no Camboja, recomenda-se a manutenção sistemática da vigilância epidemiológica e virológica, bem como o acompanhamento de casos suspeitos em humanos e animais. A colaboração entre os setores de saúde animal e humana é essencial, e devem ser implementadas medidas de redução da exposição humana a aves potencialmente infectadas. A FAO, a WOAH, a OMS e a rede OFFLU seguem atuando conjuntamente no monitoramento da situação, avaliando a detecção, a dispersão geográfica e a evolução dos vírus da influenza aviária, além de fornecer atualizações e avaliações de risco em tempo oportuno. 

Autoria

Foto de Raissa Moraes

Raissa Moraes

Editora médica de Infectologia da Afya ⦁ Médica do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/FIOCRUZ ⦁ Mestrado em Pesquisa Clínica pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/FIOCRUZ ⦁ Infectologista pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/FIOCRUZ ⦁ Graduação em Medicina pela Universidade Federal Fluminense

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Compartilhar artigo

Referências bibliográficas

Newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Anúncio

Leia também em Infectologia