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Infectologia24 novembro 2023

Hepatite C na população negra dos EUA

Análise americana avaliou 65 artigos publicados entre os anos de 2015 e 2023 para analisar as desigualdades em desfechos da infecção por HCV.

O vírus da hepatite C (HCV) é a principal infecção crônica transmitida por via sanguínea nos Estados Unidos da América, sendo a principal causa de morte por doença infecciosa, primariamente devido à progressão de cirrose, insuficiência hepática e carcinoma hepatocelular (CHC).

Ouça também: Hepatite C: diagnóstico e tratamento [podcast]

As estimativas norte-americanas apontam, além de uma alta prevalência da infecção, uma grande desigualdade: entre os negros americanos, a prevalência de HCV entre os anos de 2013 e 2016 era de 1,8%, enquanto, entre todas as outras minorias étnicas combinadas, a prevalência era de 0,8%. Essa diferença também está presente quando se avalia mortalidade, com números absolutos de mortes entre os negros americanos maiores do que entre outras etnias.

Uma revisão sistemática publicada na JAMA procurou sintetizar as evidências publicadas em relação às desigualdades em desfechos da infecção por HCV.

Hepatite C na população negra dos EUA

Metodologia

Foram avaliados estudos publicados em inglês, entre os anos de 2015 e 2023, com prioridade para revisões sistemáticas e ensaios clínicos randomizados. Foram identificados 593 artigos, dos quais 65 foram incluídos: 36 estudos observacionais, 1 ensaio clínico não randomizado, 4 ensaios clínicos randomizados, 5 revisões sistemáticas, 6 revisões, 5 guidelines, 5 relatos e 3 editoriais.

Epidemiologia de HCV

A principal via de transmissão de HCV é exposição percutânea ao sangue contaminado. Nos EUA, a maioria (57%) das infecções está associada ao uso de drogas injetáveis. A infecção pelo vírus também está associada a práticas sexuais de risco, principalmente em homens que fazem sexo com homens (HSH) que vivem com HIV. A transmissão vertical é outra forma de infecção, ocorrendo em 5,8% das crianças nascidas de mulheres com HCV e em 10,8% das crianças nascidas de mulheres com coinfecção HCV-HIV.

Entre os indivíduos infectados com HCV, de 15 a 45% conseguem fazer clearance espontâneo na fase aguda, isto é, eliminam o vírus e mantêm-se sem replicação viral nos primeiros 6 meses de infecção. Aqueles que permanecem com evidências de replicação do HCV – detecção de RNA HCV no sangue — após esse período são classificados como tendo infecção crônica.

A história natural da doença é influenciada por fatores do hospedeiro, do vírus e do ambiente. A progressão de doença hepática para cirrose ocorre em 20 a 30% das pessoas com infecção crônica ao longo de 25 a 30 anos. O desenvolvimento de cirrose está associado ao aumento de risco de CHC, descompensação hepática e óbito.

Nos EUA, a incidência de infecção por HCV apresentou um aumento importante entre as avaliações de 2015 e 2021. Embora esse aumento tenha sido observado em todas as etnias, a população negra foi a que apresentou maior aumento percentual, de 367%, em comparação com aumentos de 50%, 200% e 78% entre populações indígenas, hispânicos e brancos, respectivamente.

A prevalência estimada de infecção por HCV em negros norte-americanos foi maior do que a encontrada entre outras etnias, em todos os estados dos EUA, exceto Mississipi. Os autores da revisão destacam que diferenças genéticas podem ser uma das causas desse achado, com algumas variantes do locus do gene de interferon lambda — menos frequentemente presentes em indivíduos com ascendência africana — estariam associadas a maiores taxas de cura espontânea.

Outros fatores que podem contribuir para essas diferenças incluem o isolamento racial decorrente de leis estaduais e nacionais com caráter segregatício que estiveram em vigor no país dos anos 1900 a 1968 e que resultaram em comunidades isoladas com população predominantemente negra. O isolamento racial está associado com altas taxas de desemprego, pobreza, violência e uso de drogas injetáveis. Além disso, as taxas de encarceramento — que está associada com um aumento de 62% de risco de aquisição de HCV — são maiores entre negros do que entre brancos nos EUA.

Tratamento de HCV

Atualmente, o tratamento recomendado para HCV é feito com antivirais de ação direta (DAA), que podem ser administrados por via oral, por 8 a 12 semanas. Os DAAs apresentam altas taxas de cura (≥ 95%), com eventos adversos leves, como fadiga, cefaleia e náuseas, ocorrendo em menos de 25% dos indivíduos tratados.

Resposta virológica sustentada (RVS) — carga viral sérica de HCV indetectável mais de 12 semanas após o término do tratamento — está associada à redução na incidência de CHC e em mortalidade, redução no risco de desenvolvimento de diabetes, doença renal crônica e doença cardiovascular. Altas taxas de RVS foram encontradas em pessoas negras (95%) e não negras (97%) que completam o tratamento.

Apesar de a recomendação para eliminação do HCV ser iniciar tratamento após o diagnóstico, as evidências mostram desigualdade racial no acesso à terapia nos EUA. Os dados mostram menores números de início de tratamento com DAAs na população negra quando em comparação com a população branca. Fatores associados a menores taxas de início de tratamento para HCV incluem etnia negra, uso recente de drogas injetáveis, viver em situação de rua e encarceramento recente.

Estratégias para eliminar a desigualdade racial nos desfechos de infecção por HCV

Diante das evidências de maior prevalência e piores desfechos entre negros, a revisão relacionou algumas possíveis estratégias para diminuir a desigualdade nos desfechos de indivíduos infectados pelo HCV:

  • Aumentar o conhecimento sobre a doença.
  • Aumentar as taxas de rastreio de HCV e diagnóstico de infecção.
  • Aumentar o acesso ao tratamento.
  • Aumentar as taxas de tratamento do HCV.
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Referências bibliográficas

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