A hospitalização é considerada o fator de risco mais importante para o desenvolvimento tromboembolismo venoso (TEV) e o risco continua mesmo após a internação, especialmente nas primeiras seis semanas depois da alta.
Dados de estudos retrospectivos também revelam que o uso estendido de uma dose profilática de um anticoagulante oral em pacientes medicamente doentes pode reduzir o risco de morte fatal e tromboembolismo arterial maiores em 30% a 50%.
No texto de hoje, vamos compartilhar os resultados de um artigo publicado no American College of Cardiology que avaliou o uso de rivaroxabana na prevenção de eventos tromboembólicos maiores, após a alta.
O estudo MARINER: rivaroxabana na profilaxia de TEV
Primeiro, vamos retornar ao trial original. O estudo MARINER, multicêntrico, prospectivo, randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, publicado anteriormente randomizou pacientes clínicos com fatores de risco adicionais para TEV para três grupos, após excluir aqueles com alto risco de sangramento.
- Rivaroxabana de duração prolongada (10 mg uma vez ao dia por 45 dias) ou
- Rivaroxabana 7,5 mg uma vez ao dia (pessoas com clearance de creatinina entre 30 e 50 mL/min) ou
- Placebo
A hipótese primária era que a rivaroxabana era superior ao placebo na prevenção do composto de TEV sintomático (trombose venosa profunda em membros inferiores e embolia pulmonar não fatal) e morte relacionada ao TEV (morte por embolia pulmonar ou morte em qual esta não pode ser descartada). Foram incluídos pacientes > 40 anos com fatores de risco para TEV.
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Resultados
Embora o estudo não tenha demonstrado uma redução no desfecho primário de TEV sintomático e morte relacionada a TEV, desfechos secundários de eficácia revelaram 56% de redução do TEV sintomático e de 27% redução do TEV sintomático e mortalidade por todas as causas.
Estudo MARINER com foco em eventos tromboembólicos venosos e arteriais fatais
Neste segundo estudo, um desfecho secundário pré-especificado foi a ocorrência de eventos tromboembólicos venosos e arteriais fatais. Então, a ideia era analisar se a rivaroxabana poderia reduzir a incidência de eventos tromboembólicos fatais e graves em pacientes tratados com 10 mg por dia de rivaroxabana comparado ao placebo quando administrado a pacientes agudos no momento da alta por 45 dias.
As análises de eficácia exploratória foram realizadas com a população com intenção de tratar, incluindo todos os dados até o dia 45. Um comitê independente cego julgou todos os eventos clínicos.
A hipótese primária desta análise foi a de que a rivaroxabana era superior ao placebo na prevenção de composto pré-especificado de TEV sintomático, infarto do miocárdio (IM), acidente vascular cerebral não-hemorrágico, e morte cardiovascular (CV) em pacientes com CrCl basal de maior que 50 mL/min, recebendo a dose de 10 mg de rivaroxabana.
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Resultados
Foi um estudo grande. No total, 4.909 pacientes foram designados para rivaroxabana e 4.913 pacientes para placebo.
O composto de desfecho de eficácia pré-especificado (TEV sintomático, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e morte cardiovascular) ocorreu em 1,28% do grupo rivaroxabana e em 1,77% do grupo placebo (HR: 0,72; intervalo de confiança de 95%: 0,52 a 1,00; p = 0,049), enquanto o sangramento maior ocorreu em 0,27% e 0,18% dos pacientes nos grupos rivaroxabana e placebo, respectivamente (HR: 1,44; 95% de confiança intervalo: 0,62 a 3,37; p = 0,398).
Esta análise mostra que, em comparação com o placebo, a tromboprofilaxia de duração prolongada com rivaroxabana em baixa dose (10 mg por dia) iniciado após alta hospitalar leva a uma redução significativa de 28% no risco combinado de eventos tromboembólicos fatais e graves, sem aumento significativo sangramento grave em pacientes hospitalizados. Esse benefício parece começar após a primeira semana de tratamento e continua até o final do estudo em 45 dias. Houve uma redução absoluta de 0,49% no risco de eventos de eficácia e um aumento absoluto de 0,09% no risco de sangramento maior, sugerindo um quadro clínico beneficiar.
Os autores sugerem que as descobertas podem ter implicações importantes para os pacientes agora que a rivaroxabana é aprovada para tromboprofilaxia em uso prolongado pós alta hospitalar nos Estados Unidos. Vale ressaltar que o estudo tem limitações, principalmente porque o MARINER falhou em atingir seu objetivo primário de eficácia. Além disso, o editorial do JAAC a respeito do artigo, trouxe outras questões, como o fato de o medicamento ter sido aprovado com muitos critérios de exclusão no FDA ( úlcera gastroduodenal ativa; sangramento recente; câncer ativo; história de bronquiectasia grave ou doença pulmonar cavitária; e terapia antiplaquetária dupla), o que dificultaria sua prescrição.
No Brasil, a rivaroxabana tem as seguintes indicações em bula: prevenir a formação de trombos, após cirurgia de substituição da articulação de joelhos ou quadril; tratamento de trombose venosa profunda e embolia pulmonar; além de prevenção destas patologias em casos de recorrência.
Mensagem prática
> O estudo sugere que, em comparação com o placebo, a tromboprofilaxia de duração prolongada com rivaroxabana em baixa dose (10 mg por dia), iniciado após alta hospitalar leva a uma redução no risco combinado de eventos tromboembólicos fatais e graves, sem aumento significativo sangramento grave em pacientes medicamente hospitalizados.
> Tendo em vista as limitações do estudo, ainda parece que não temos dados suficientes para adotarmos a rivaroxabana nos pacientes clínicos, como profilaxia de eventos tromboembólicos após a alta, na prática.
Referências bibliográficas:
- Alex C. Spyropoulos et al.Post-Discharge Prophylaxis With Rivaroxaban Reduces Fatal and
Major Thromboembolic Events in Medically Ill Patients. JOURNAL OF THE AMERICAN COLLEGE OF CARDIOLOGY. 2020 Doi - Spyropoulos AC, Ageno W, Albers GW, et al. Rivaroxaban for Thromboprophylaxis after Hospitalization for Medical Illness. N Engl J Med. 2018;379(12):1118-1127. doi:10.1056/NEJMoa1805090
- https://www.vasculardiseasemanagement.com/content/us-fda-approves-xarelto-rivaroxaban-help-prevent-blood-clots-acutely-ill-medical-patients
- Samuel Z. Goldhaber, MDa,Thromboembolism Prophylaxis for Patients Discharged From the Hospital
Easier Said Than Done. EDITORIAL COMMENT. https://doi.org/10.1016/j.jacc.2020.05.023
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