O Espectro da Placenta Acreta (EPA) é definido como a adesão anômala ou patológica da placenta no miométrio. O EPA engloba a placenta acreta, increta e percreta e é condição de importante morbidade e mortalidade perinatal.
O tratamento considerado padrão-ouro para essa condição é o parto cesárea seguido por histerectomia no mesmo ato cirúrgico, sem a remoção da placenta.
Durante um debate no segundo dia do congresso ACOG2023, dois especialistas na área defenderam pontos de vista diferentes sobre a possibilidade de manejo conservador do EPA.
O debate aconteceu entre o Professor Shainker (Harvard Medical School) defensor do tratamento padrão-ouro e a Professora Zuckerwise (Venderbilt University Medical Center) que acredita que em casos selecionados o tratamento conservador tem seu lugar.
O Professor Shainker argumentou que a histerectomia no mesmo ato da cesárea apresenta benefícios em comparação com o tratamento conservador, uma vez que é o tratamento definitivo, reduz riscos de sangramento e reduz necessidade de cirurgias de emergência. Para apoiar seus argumentos, trouxe entre outros trabalhos o consenso ACOG de 2018.
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ACOG Care Obstetric Consensus: Placenta Accreta Spectrum
Em 2018, o ACOG publicou seu consenso sobre definição, diagnóstico e tratamento do EPA. Nesse consenso, estão destacados alguns pontos:
- O diagnóstico pré-natal é de suma importância, pois permite um planejamento terapêutico adequado
- A optimização do tratamento deve envolver um time multidisciplinar especializado nessa patologia
- A resolução dessa gestação deveria acontecer em centros de alto riso
- A resolução da gestação deve ser discutida com o casal se será imediatamente após o diagnóstico ou após a viabilidade fetal
- O tratamento de melhor resultado parece ser a cesárea e histerectomia no mesmo ato de 34 a 36 semanas
- O tratamento conservador considerado como a preservação do útero e a remoção da placenta e o tratamento expectante considerado como a manutenção parcial ou total da placenta após o parto não devem ser o tratamento de escolha e deve ser reservado e individualizado
A Professora Zuckerwise frisou que o manejo conservador ou expectante pode ser considerado para o acretismo placentário. Entretanto, deve ser restrito a centros especializados e com equipe treinada. Situações em que essa questão pode ser ponderada inclui casos de desejo de preservação da fertilidade, alto risco para a realização de histerectomia e necessidade de transferência de paciente para grandes centros.
Para apoiar seus argumentos apresentou alguns de seus artigos e o estudo PACCRETA publicado em junho de 2022.
PACCRETA Study
Trata-se de um estudo de coorte observacional. Foram avaliadas mulheres com EPA, sendo 86 mulheres com tratamento conservador e 62 mulheres submetidas a cesárea e histerectomia. O desfecho primário (transfusão de mais de 4 bolsas de sangue em 6 meses de observação) ocorreu em 14 de 86 mulheres no grupo de tratamento conservador (16,3%) e 36 de 61 (59,0%) no grupo de histerectomia/cesariana (taxa de risco 0,29; intervalo de confiança de 95%, 0,19–0,45). As taxas de histerectomia, perda total estimada de sangue superior a 3.000 mL, qualquer transfusão de hemoderivados, lesão de órgão adjacente e morbidade materna grave não relacionada à hemorragia pós-parto foram menores com tratamento conservador do que com histerectomia cesariana (P≤,02); porém, as taxas de embolização arterial, endometrite e reinternação dentro de 6 meses após a alta foram maiores com o tratamento conservador do que com a histerectomia cesariana.
Por fim, o debate foi uma ótima oportunidade de discutir aspectos positivos e negativos de um assunto ainda com tantas controvérsias e sem consenso para responder a pergunta que dá título a esse artigo.
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