Foi publicada recentemente, na revista Vaccine, uma revisão de escopo que analisa intervenções voltadas ao aumento da cobertura vacinal contra o papilomavírus humano (HPV) em populações historicamente menos alcançadas pelos programas de imunização. O artigo, assinado por Kate Roux e colaboradores, está disponível em acesso aberto e reúne evidências sobre estratégias aplicadas em diferentes países e contextos.
A Vaccine é uma revista científica reconhecida na área de imunizações e costuma publicar estudos relevantes sobre efetividade de vacinas, implementação de programas e acesso em saúde. A revisão se concentra em adolescentes e adultos jovens de grupos considerados prioritários do ponto de vista da equidade.
A motivação do estudo é o reconhecimento de que, apesar da incorporação da vacina contra o HPV em programas nacionais de vários países, ainda há desigualdade importante no acesso e na adesão. Os autores buscaram compreender quais estratégias vêm sendo adotadas para reduzir essa lacuna e quais mostraram bons resultados em termos de cobertura vacinal nesses grupos.
Portanto, o artigo tem como objetivo destacar as estratégias utilizadas em intervenções para aumentar a vacinação contra o HPV em populações de adolescentes e adultos jovens provenientes de áreas rurais, com baixo nível socioeconômico, indígenas, pertencentes a minorias étnicas e migrantes. Seus objetivos são identificar os contextos em que essas intervenções foram realizadas e determinar as estratégias mais frequentemente empregadas.
Metodologia
Esta revisão de escopo realizou buscas em seis bases de dados por estudos de intervenção que mediram a adesão à vacinação contra o HPV em adolescentes e adultos jovens de populações rurais, de baixo nível socioeconômico, pertencentes a minorias étnicas, indígenas ou migrantes. As estratégias foram categorizadas de acordo com o local de aplicação: ambiente clínico, escolar, comunitário ou uma combinação de um ou mais desses contextos.
Os principais desfechos buscados por esta revisão foram, em primeiro lugar, identificar as estratégias utilizadas nas intervenções e, em segundo, determinar a efetividade dessas estratégias, medida pela adesão à vacinação contra o HPV, com base no número de indivíduos vacinados.
A iniciação foi considerada como a administração da primeira dose, e a conclusão, como o esquema completo de duas ou três doses, conforme indicado. A efetividade das estratégias foi avaliada com base no impacto da intervenção sobre a adesão vacinal, conforme relatado pelos estudos incluídos, por meio de valores de p, razões de chances (odds ratio) ou razões de risco (risk ratio).
Principais achados
A revisão incluiu 46 estudos publicados entre 2006 e 2024, realizados em sete países, com predominância dos Estados Unidos. Os estudos analisaram intervenções voltadas à ampliação da cobertura vacinal contra o HPV entre adolescentes e adultos jovens pertencentes a grupos historicamente vulneráveis.
As intervenções foram implementadas em quatro principais cenários:
- Serviços de saúde (clínicas) – 25 estudos
- Escolas – 6 estudos
- Ambiente comunitário – 4 estudos
- Combinação de cenários – 11 estudos
Apesar das diferenças nos contextos, a revisão identificou cinco estratégias recorrentes associadas ao aumento da equidade na vacinação:
- Disseminação de informações sobre o HPV e a vacinação: Ações educativas por meio de folhetos, vídeos, conversas durante atendimentos, materiais em diversos idiomas e abordagens entre pares mostraram bons resultados. Estratégias que combinaram diferentes formas de comunicação foram mais efetivas. Em uma das intervenções, o uso de materiais bilíngues (inglês e chinês) resultou em aumento superior a 60% na cobertura vacinal em comparação ao grupo controle.
- Lembretes e avisos (prompting): O envio de mensagens de texto, ligações, cartões-postais ou alertas nos prontuários eletrônicos foi eficaz para lembrar os usuários da vacinação. Em intervenções que usaram essa estratégia isoladamente ou combinada com outras (como educação ou capacitação de profissionais), os aumentos na cobertura variaram entre 12,5% e 65,5%.
- Capacitação de profissionais de saúde: Diversas intervenções incluíram treinamentos com foco em melhorar a comunicação sobre o HPV, abordagens para lidar com dúvidas e hesitação vacinal, e incentivo à recomendação ativa. A presença de profissionais de foi especialmente eficaz, com aumento de mais de 30% na conclusão do esquema vacinal em alguns estudos.
- Programas escolares: A vacinação no ambiente escolar associada a eventos de engajamento (como feiras e campanhas) mostrou impacto positivo na cobertura. Um dos estudos apontou que escolas que promoveram atividades educativas junto à vacinação tiveram taxa 3,6 vezes maior de início da imunização e 3,8 vezes maior de conclusão da série vacinal, em comparação àquelas que apenas distribuíram materiais informativos.
- Cuidados centrados na família: Algumas estratégias aproveitaram a presença de mães em consultas de rastreamento ginecológico para ofertar a vacinação contra o HPV aos filhos. Essa abordagem resultou em taxas de início vacinal de até 98% e de conclusão em torno de 65%, sugerindo que o contexto familiar pode ser um facilitador importante para a decisão de vacinar.
Mensagem prática
A revisão mostra que é possível ampliar significativamente a cobertura vacinal contra o HPV em populações vulneráveis por meio de estratégias relativamente simples, mas bem-organizadas. A disseminação de informações claras e acessíveis, o uso de lembretes ativos, a capacitação das equipes de saúde, a integração com escolas e a valorização do cuidado centrado na família são medidas que, quando combinadas, podem reduzir desigualdades históricas no acesso à vacinação.
Para os médicos, a principal mensagem é que a recomendação ativa da vacina durante as consultas, especialmente com linguagem segura e direta, continua sendo uma das ações mais eficazes para promover a adesão.
Incorporar o tema da vacinação às rotinas do atendimento clínico, aproveitar oportunidades como o acompanhamento ginecológico das mães ou as consultas pediátricas e utilizar sistemas de alerta no prontuário eletrônico são exemplos práticos de como contribuir diretamente para a prevenção do câncer relacionado ao HPV.
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