O sangramento gastrointestinal obscuro (SGIO) representa, aproximadamente, 5% de todos os casos de hemorragia digestiva e caracteriza-se pela impossibilidade de identificar a fonte das perdas sanguíneas, a despeito de propedêutica adequada, que inclui:
- Endoscopia digestiva alta e ileocolonoscopia – recomenda-se repeti-las, visando surpreender sangramentos intermitentes, uma estratégia de sucesso em 25% dos casos;
- Cápsula endoscópica;
- Push enteroscopia, que avalia o duodeno e jejuno proximal, bem como a enteroscopia anterógrada e retrógrada por balão ou espiral, que pode alcançar o jejuno distal e íleo distal, respectivamente;
- E exames radiológicos, como a enterotomografia e a enteroressonância, bem como a cintilografia com hemácias marcadas e a angiografia.
A apresentação clínica contempla hematêmese, melena e anemia ferropênica sem exteriorização, frequentemente motivando internações hospitalares.
As três etiologias mais comumente implicadas são as seguintes:
- Lesões de Dieulafoy;
- Angiodisplasias;
- Neoplasias.
Em uma seção publicada em março de 2025 no American Journal of Gastroenterology, os autores destacaram que o rendimento da cápsula endoscópica gira em torno de 65% se realizada nas primeiras 48 horas do evento, reduzindo drasticamente após a segunda semana do ictus. Na ausência de um exame conclusivo, a repetição da passagem da cápsula pode ser frutífera, em termos diagnósticos, em até metade dos casos. Uma vez identificada a fonte do sangramento, o próximo passo geralmente é a enteroscopia.
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Enteroscopia com balão e perioperatória
A enteroscopia com balão — seja duplo, único ou espiral — oferece uma maior acurácia diagnóstica e a oportunidade terapêutica, especialmente se for guiada por achados da cápsula endoscópica ou exames imaginológicos prévios que possam orientar espacialmente o endoscopista. Contudo, é um exame mais invasivo, com tempo de sedação prolongado, além de menos disponível e costumeiramente mais oneroso do que a cápsula endoscópica.
A enteroscopia perioperatória, realizada em simultaneidade à laparotomia, com inserção do endoscópio pela boca ou via enterotomia, deve ser reservada como última opção, em virtude de sua elevada morbidade.
Em termos terapêuticos, os dois principais destaques do artigo foram as opções farmacológicas dedicadas às angiodisplasias: o octreotide e a talidomida.
O octreotide, um vasoconstritor esplâncnico, reduziu pela metade a demanda transfusional em 80% dos indivíduos com angiodisplasias, segundo uma metanálise de 11 estudos.
Já o estudo OCEAN demonstrou que o octreotide 40 mg intramuscular de 4/4 semanas reduziu significativamente o número médio de transfusões (11 vs. 21,2; p = 0,012), com impressionante número necessário para tratar (NNT) de 2.
A talidomida, por meio de seus efeitos antiangiogênicos, também demonstrou benefício, com redução superior a 50% nos episódios de sangramento em quase três quartos dos pacientes com sangramento recorrente por angiodisplasias, fato alcançado por apenas 4% dos indivíduos do grupo placebo. Os resultados são mais expressivos com a dose diária de 100 mg do que 50 mg. O seu perfil de segurança, entretanto, é mais estreito, e envolve complicações sérias, como teratogenicidade, neuropatia periférica, tromboembolismo e supressão medular, exigindo maior vigilância clínica.
Conclusão e mensagens práticas
- O manejo do SGIO exige uma abordagem escalonada, combinando recursos endoscópicos, radiológicos e farmacológicos, de uma forma individualizada conforme o caso clínico e a disponibilidade local.
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