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Gastroenterologia9 novembro 2022

Microbiota intestinal no paciente cirúrgico do aparelho digestivo

A microbiota intestinal exerce papel importante atuando nas complicações infecciosas em cirurgias gastrointestinais. Saiba mais!

Por Jôbert Neves

Este conteúdo foi produzido pela Afya em parceria com Cellera Farma de acordo com a Política Editorial e de Publicidade do Portal Afya.

Após mais de dez anos da publicação do Projeto do Microbioma Humano, ainda é crescente o número de novas informações sobre o papel da microbiota intestinal em diversas doenças.  Sendo esse um tema desafiador por envolver processos imunológicos, bioquímicos, metabólicos e microbiológicos, a modulação de diversas condições clínico-cirúrgicas por agentes probióticos potencialmente contribui para melhorias no cuidado oferecido aos pacientes1,2. 

No contexto cirúrgico, nos últimos anos houve progresso das técnicas cirúrgicas e dos cuidados clínicos associados, com uma significativa diminuição de complicações pós-operatórias, como infecção, dificuldades de reabilitação e mortalidade. Apesar disso, há sempre uma preocupação coletiva em reduzir ao máximo qualquer possível intercorrência, sendo as infecções as mais prevalentes delas2.  

Cada vez evidências surgem sobre a contribuição de uma microbiota intestinal saudável para a saúde global dos pacientes. No cenário de infecções cirúrgicas não é diferente: pesquisas mostram o papel importante da microbiota intestinal atuando nas complicações infecciosas em cirurgias gastrointestinais, como infecções de sítio cirúrgico, abscessos intra-abdominais e na resposta inflamatória do pós-operatório. Acredita-se que o preparo pré-cirúrgico e a descontaminação antes do procedimento contribuam para tal resultado. No entanto, uma total erradicação dos microrganismos pode levar a desfechos graves, tornando essa conduta inviável, já que um microbioma menos diverso é mais propenso a desenvolver doenças quando comparado a um mais diversificado. Logo, pensar na microbiota como uma ferramenta de auxílio na recuperação dos pacientes submetidos à cirurgia através da sua modulação e consequente garantia do equilíbrio da microbiota é fundamental2,3,6. 

Variadas evidências mostram que há na própria cirurgia a capacidade de mudança significativa da composição da microbiota. Estudos realizados em laboratórios com camundongos avaliaram a composição da microbiota após uma colectomia, resultando em um aumento significativo de bactérias no lúmen intestinal, com destaque para Escherichia e Enterococcus. Alterações também foram encontradas em pacientes submetidos a transplante de intestino delgado, incluindo um aumento de Enterobacteriaceae e Lactobacillus e o esgotamento de anaeróbios obrigatórios2.  

São diversas as condições que podem resultar em indicação cirúrgica gastrointestinal, como retocolite ulcerativa (RCU) grave não responsiva ao tratamento medicamentoso ou que evoluiu com complicações e a polipose adenomatosa familiar, quadros que frequentemente podem evoluir como um colectomia seguida de anastomose íleo-anal. Já o bypass gástrico em Y de Roux é uma alternativa de tratamento cirúrgico para a obesidade. Todas essas grandes reconstruções intestinais alteram consideravelmente a composição da microbiota, podendo contribuir para o desenvolvimento de complicações pós-cirúrgicas2,4. 

 Manejo da microbiota intestinal em pacientes: o papel dos probióticos  

 Nos últimos doze anos, diversos estudos estabeleceram a importância dos probióticos nas complicações pós-operatórias de cirurgias gastrointestinais. Neles, os probióticos provaram ser relevantes na redução de complicações pós-operatórias, como infecção do sítio cirúrgico, diarreia, septicemia, translocação bacteriana, abscesso intra-abdominal. Além disso, os pacientes tratados com probióticos tiveram menos dias de internação pós-operatória em comparação com pacientes não tratados com probiótico2,5. Metanálise de estudos randomizados realizada por Tang e colaboradores demonstrou mostrou que a suplementação perioperatória de probióticos ou simbióticos pode efetivamente promover a recuperação da função gastrointestinal após cirurgia de câncer gastrointestinal, incluindo a redução do tempo para eliminação dos primeiros flatos, tempo para primeira dejeção, dias para primeira dieta sólida, dias para primeira dieta líquida e duração da internação pós-operatória, reduzindo ainda a incidência de distensão abdominal pós-operatória e íleo pós-operatório7. Outra metanálise do mesmo grupo, incluindo pacientes com neoplasia hepatopancreatobiliar, a suplementação com probióticos ou simbióticos reduziu significativamente a incidência de infecção pós-operatória, e tanto os probióticos quanto os simbióticos foram eficazes na redução da incidência de infecção pós-operatória8 

A experiência do uso de probióticos em pacientes submetidos à gastrectomia e cirurgia reconstrutiva com bypass gástrico em Y de Roux mostrou que a ingestão de Lactobacillus sp. reduz a frequência de supercrescimento bacteriano e melhora a síntese de vitamina B1210. Recentemente, Folwarski e colaboradores demonstraram benefício do uso de L. rhamnosus GG em ensaio clínico randomizado com pacientes submetidos a pancreatoduodenectomia, especialmente na retomada de evacuações pós-operatórias, liberação de gases e melhora do apetite9.  

A segurança do paciente é primordial, sendo a modulação pós-cirúrgica da microbiota uma alternativa quando as indicações são individualizadas e a escolha da cepa é avaliada.  Assim, os riscos e benefícios do tratamento com probióticos devem ser calculados com precisão em pacientes após cirurgia gastrointestinal e requer mais estudos2,6.  

 

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