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Endocrinologia14 novembro 2025

Terapia hormonal de afirmação de gênero e os fatores de risco cardiovascular

Publicada uma revisão sistemática que teve como objetivo atualizar e ampliar o conhecimento sobre os efeitos da terapia hormonal de afirmação de gênero.
Por Erik Trovão

Foi publicado no Endocrine Connections, em 2025, uma revisão sistemática que teve como objetivo atualizar e ampliar o conhecimento sobre os efeitos da terapia hormonal de afirmação de gênero (THAG) sobre o risco cardiovascular (CV) em pessoas transgênero. O tema é relevante, pois embora o uso da THAG seja fundamental para a afirmação de gênero e bem-estar psicossocial, ainda há incertezas sobre seu impacto na fisiologia vascular e nos fatores de risco metabólicos. Estudos prévios apresentavam resultados heterogêneos e muitas vezes contraditórios, o que justificou a necessidade de uma revisão sistemática. 

 

A revisão incluiu estudos publicados até julho de 2024, identificados em bases como PubMed, Embase, Scopus e LILACS. Foram considerados artigos envolvendo pessoas transgênero saudáveis, tratadas ou não com THAG, com avaliação de marcadores clínicos e laboratoriais de risco CV. Após a triagem inicial de 2.564 estudos, 69 preencheram os critérios de elegibilidade, totalizando mais de 14 mil indivíduos (aproximadamente metade mulheres trans e metade homens trans). A maioria dos trabalhos foi conduzida na Europa e nos Estados Unidos, com predomínio de amostras de etnia branca e heterogeneidade quanto ao desenho metodológico e tempo de acompanhamento. 

 

Os resultados demonstraram que, em mulheres transgênero, a THAG esteve associada predominantemente a mudanças benéficas ou neutras no perfil cardiovascular. Observou-se melhora em marcadores lipídicos (como redução de LDL e triglicerídeos e aumento de HDL em alguns estudos), alterações favoráveis na sensibilidade à insulina e redução de hemoglobina e hematócrito, refletindo adaptação fisiológica ao perfil hormonal feminino. Entretanto, alguns estudos relataram efeitos pró-coagulantes ou aumento da resistência insulínica, o que indica variação interindividual e incertezas quanto ao real efeito cardiovascular. 

 

Em contraste, nos homens transgênero, a exposição à testosterona foi associada a alterações potencialmente adversas ao sistema cardiovascular. Houve tendência a aumento de LDL, triglicerídeos e hematócrito, redução de HDL e elevação de marcadores de rigidez arterial e espessura íntima-média carotídea. Tais modificações podem representar um aumento do risco aterogênico subclínico, embora a magnitude clínica ainda não esteja claramente estabelecida. A análise integrada dos achados sugeriu que, enquanto mulheres transgênero tendem a apresentar um perfil mais favorável, os homens podem desenvolver características de risco similares às observadas em homens cisgênero. 

 

Os autores ressaltam que a interpretação dos dados deve considerar limitações importantes, como amostras pequenas, alta taxa de perdas no seguimento e falta de padronização nos desfechos avaliados. Além disso, a escassez de grupos controle adequados (particularmente de pessoas transgênero não expostas previamente à THAG) dificulta conclusões robustas sobre causalidade. A ausência de diversidade étnica e de estudos de longo prazo limita a generalização dos resultados. 

 

Em conclusão, a revisão indica que a THAG promove mudanças benéficas ou neutras no risco cardiovascular de mulheres trans, mas potencialmente negativas em homens trans, especialmente relacionadas à dislipidemia e aumento de hematócrito. No entanto, a literatura ainda apresenta inconsistências e lacunas significativas, como, por exemplo, o efeito sobre a pressão arterial. Os autores destacam a necessidade de estudos multicêntricos, padronizados e com maior diversidade populacional, para elucidar os mecanismos envolvidos e permitir metanálises futuras. Até que novas evidências estejam disponíveis, recomenda-se monitoramento clínico rigoroso e aconselhamento sobre modificações de estilo de vida, particularmente para homens transgênero, visando à prevenção de doenças cardiovasculares. 

Autoria

Foto de Erik Trovão

Erik Trovão

Formado em Medicina pela UFCG •Residência em Clínica Médica pelo HBLSUS/PE •Residência em Endocrinologia e Metabologia pelo HAM-SUS/PE •Titulo de especialista em Endocrinologia e Metabologia pela SBEM •Mestre em neurociências pela UFPE •Preceptor da Residência de Endocrinologia do HC/UFPE

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