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Endocrinologia24 setembro 2025

Revisitando conceitos importantes sobre osteoporose: revisão JAMA 2025

Revisão JAMA 2025 atualiza diagnóstico e tratamento da osteoporose, com foco em risco individual e prevenção de fraturas.

A osteoporose é uma condição crônica, progressiva e silenciosa, caracterizada pela diminuição da densidade e da qualidade óssea, que resulta em aumento da fragilidade do esqueleto e risco elevado de fraturas. Estima-se que uma em cada três mulheres e um em cada cinco homens acima dos 50 anos sofram uma fratura osteoporótica ao longo da vida. Entre essas, a fratura de quadril se destaca como o evento mais temido, associando-se a mortalidade de até 24% no primeiro ano e a perda significativa da autonomia funcional. 

Apesar dessa alta carga de morbidade e mortalidade, a osteoporose ainda é largamente negligenciada na prática clínica, com baixas taxas de rastreio, tratamento e seguimento, mesmo após uma fratura. O desafio é ainda mais evidente em países em desenvolvimento, como o Brasil, onde o acesso à densitometria é limitado e as ferramentas preditivas de risco são subutilizadas, bem como a própria condição em si acaba sendo frequentemente ignorada tanto por médicos como por pacientes. 

Recentemente foi publicada no JAMA, em 2025, uma revisão acerca do tema que buscou reavaliar evidências de ensaios randomizados, metanálises e guidelines sobre osteoporose para trazer uma proposta de abordagem abrangente, atualizada e prática para o diagnóstico e o tratamento da osteoporose, centrada na avaliação individual do risco de fratura. Devido à suma importância do tema, exploramos no portal os principais tópicos abordados no artigo. 

Diagnosticando e estratificando a osteoporose 

O ponto de partida do raciocínio clínico deve ser a avaliação dos fatores de risco individuais, com atenção especial à presença de fraturas prévias, uso de glicocorticoides, tabagismo, alcoolismo, baixo peso (IMC < 20 kg/m²), doenças inflamatórias (como artrite reumatoide ou DII), menopausa precoce e história familiar de fratura de quadril. Episódios de quedas no último ano também devem ser valorizados, visto que aumentam significativamente o risco de fratura. 

O exame físico pode trazer pistas importantes. Pacientes com perda de estatura significativa ao longo dos anos ou que apresentam aumento da distância entre o occipício e a parede ao ficar em pé com os calcanhares encostados indicam provável cifose — o que deve levantar suspeita de fraturas vertebrais silenciosas, presentes em até dois terços dos casos e frequentemente subdiagnosticadas, comumente observadas apenas em exames de imagem realizadas por outros propósitos. 

A densitometria óssea (DXA) segue como pilar diagnóstico, mas deve ser usada de forma integrada. O valor do T-score (sobretudo do colo femoral) continua sendo uma variável importante, com T ≤ –2,5 confirmando o diagnóstico densitométrico de osteoporose. No entanto, sabemos que aproximadamente 70% das fraturas ocorrem em pacientes com T-score superior a –2,5, o que torna clara a necessidade de estratégias diagnósticas adicionais. 

Nesse sentido, a utilização de algoritmos de cálculo de risco, em especial o FRAX, ferramenta amplamente validada que estima o risco absoluto de fratura em dez anos (tanto para fraturas maiores quanto de quadril), pode ajudar. O FRAX pode ser utilizado com ou sem os dados da densitometria, e incorpora variáveis como idade, sexo, IMC, uso de corticoides, consumo de álcool, tabagismo, história de fratura prévia, entre outros. É fundamental atentar que o FRAX deve ser utilizado de acordo com a população avaliada. Em nosso país, há a ferramenta FRAX ABRASSO, validada para a população brasileira e que apresenta limiar de intervenção variável, um pouco diferente da utilizada nos Estados Unidos e contemplada na revisão. É possível acessar a ferramenta de forma gratuita no site da ABRASSO em https://abrasso.org.br/frax-brasil/ 

Para pacientes com risco limítrofe, a adição do escore trabecular da coluna lombar (TBS), quando disponível, pode aumentar a acurácia preditiva. 

Finalmente, vale reforçar que a osteoporose pode e deve ser diagnosticada mesmo na ausência de alterações densitométricas, desde que haja fratura de quadril, vertebral ou múltiplas fraturas típicas de fragilidade (sem trauma de alta energia). Esses casos são considerados de alto risco clínico e merecem intervenção. 

A recomendação de rastreio com densitometria óssea ainda é variada de acordo com diferentes guidelines, porém é sugerido realizar a mesma a partir dos 50 anos ou em mulheres após a menopausa com fatores de risco adicionais ou a partir dos 65 anos em mulheres sem fatores de risco e homens a partir dos 70 anos. A revisão chama a atenção para o fato de que um terço das fraturas osteoporóticas acontecem em homens. 

Estratégias terapêuticas baseadas em risco 

Uma das principais contribuições da revisão é a racionalização do tratamento a partir do risco estimado de fratura, organizando os pacientes em três categorias: baixo risco, alto risco e muito alto risco. Essa classificação, que leva em consideração tanto a DMO quanto a presença de fraturas e os escores de risco, orienta a escolha terapêutica de forma individualizada e racional. 

Para indivíduos com baixo risco de fratura — isto é, sem fraturas prévias, com T-score > –2,5 e com escores de FRAX abaixo dos limiares estabelecidos (geralmente <20% para fraturas maiores e <3% para quadril ou abaixo do limiar no FRAX ABRASSO) — a conduta deve se concentrar em intervenções não farmacológicas. Isso inclui prática regular de exercícios de resistência e equilíbrio, cessação do tabagismo, moderação do consumo de álcool e adequação da ingestão de cálcio (1000 mg/dia a 1200 mg/dia) e vitamina D (600 UI/dia a 800 UI/dia). Em pacientes com risco nutricional ou doenças que comprometam a absorção, a suplementação deve ser considerada de forma personalizada. 

Nos pacientes de alto risco, o início de tratamento farmacológico é indicado. Os bisfosfonatos são a primeira escolha, por sua eficácia, custo-benefício e perfil de segurança. Estudos demonstram redução relativa de fraturas vertebrais da ordem de 50% e de fraturas de quadril de cerca de 20%. O alendronato e o risedronato (via oral), bem como o ácido zoledrônico (IV anual), são opções consagradas. Para pacientes com contraindicação ou intolerância aos bisfosfonatos, o denosumabe surge como alternativa potente e eficaz, embora sua interrupção deva ser sempre acompanhada da introdução de um bisfosfonato, devido ao risco de perda óssea acelerada e fraturas vertebrais múltiplas. 

Em indivíduos classificados como de muito alto risco — especialmente aqueles com fraturas vertebrais recentes ou múltipla, fratura recente de fêmur associada a T score < -2,5 — a conduta ideal é iniciar com agentes anabólicos, como teriparatida, abaloparatida ou romosozumabe. Essas drogas estimulam diretamente a formação óssea e promovem ganhos densitométricos superiores, com maior eficácia na redução precoce de fraturas vertebrais. Após 12 a 24 meses, esses agentes devem obrigatoriamente ser seguidos de um anti-reabsortivo, para manutenção da massa óssea adquirida (12 para o romosozumabe e 24 para teriparatida e abaloparatida). 

O tempo de uso dos fármacos anti-reabsortivos também deve ser individualizado. Para os bisfosfonatos, recomenda-se reavaliação após 3 anos de uso intravenoso ou 5 anos de uso oral, com possibilidade de pausa (“drug holiday”) em pacientes que não tenham tido fraturas recentes e cujo risco esteja controlado. Já o denosumabe não permite pausas abruptas: se houver necessidade de interrupção, deve-se iniciar imediatamente um bisfosfonato, preferencialmente zoledronato IV, para evitar o risco rebote de fraturas, sobretudo de fraturas vertebrais. 

Outro ponto de atenção deve ser a sequência dos tratamentos. Estudos demonstram que iniciar com um agente anabólico e, em seguida, introduzir um anti-reabsortivo resulta em maior ganho ósseo e redução de fraturas do que a sequência inversa. Já a transição direta de denosumabe para agentes anabólicos pode acarretar perda transitória de massa óssea e deve ser evitada. 

Monitorando o tratamento 

Uma vez iniciado o tratamento, o paciente deve ser acompanhado com avaliações clínicas periódicas (queda, dor, fratura, perda de altura, adesão) e com nova densitometria a cada 2–3 anos, para avaliação da resposta terapêutica, de acordo com os autores da revisão. A elevação da DMO acima do erro do equipamento DXA está associada à redução do risco de fraturas subsequentes. Em pacientes sem tratamento, a reavaliação do FRAX pode ser feita em intervalos de três a dez anos, conforme o risco basal. 

Apesar da disponibilidade terapêutica, as taxas de adesão permanecem baixas. Apenas 17% dos pacientes com fratura osteoporótica iniciam ou mantêm tratamento adequado. Programas estruturados — ainda incipientes no Brasil — podem aumentar a taxa de início de tratamento para 38% e melhorar a adesão em até 22%, podendo reduzir significativamente o risco de fraturas subsequentes. 

Conclusão e mensagem prática 

O tratamento da osteoporose deve ser guiado por uma estimativa individualizada de risco de fratura, e não apenas pela densitometria óssea. Isso muda radicalmente a abordagem clínica tradicional, permitindo que pacientes com osteopenia e alto risco estimado recebam intervenções eficazes. 

No Brasil, isso implica na adoção sistemática do FRAX ABRASSO na rotina ambulatorial, na ampliação da indicação de tratamento para além do T-score na densitometria e no reconhecimento da osteoporose clínica, diagnosticada pela presença de fraturas osteoporóticas. 

Revisar um assunto de extrema importância como a osteoporose pode e deve nos deixar mais atentos à esta condição subtratada e de morbimortalidade muito subestimada.

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Referências bibliográficas

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