Em dezembro de 2020, a Food and drug Administration (FDA) dos Estados Unidos da América (EUA) autorizou o uso emergencial da vacina Pfizer-BioNTech (BNT162b2) para o tratamento da Covid-19, vacina a base de mRNA (ácido ribonucleico mensageiro) modificado e encapsulado em nanopartículas lipídicas que codifica a proteína Spike (S) do SARS-CoV-2. A administração ocorre em duas doses com intervalo de 21 dias, garantindo eficácia de aproximadamente 95% na prevenção da Covid-19.
Em relação aos grupos de risco com elevada mortalidade durante a pandemia, estão os pacientes nefropatas crônicos que realizam hemodiálise ao menos três vezes por semana. Esses pacientes têm um risco aumentado em ao menos cinco vezes de se infectar pelo SARS-CoV-2 quando comparados à população geral, sendo internados em 63% das vezes e com mortalidade em torno de 29% (dados de Ontário, Canadá).
Estudo sobre a vacina da Pfizer
Os pacientes dialíticos apresentam uma resposta imunológica reduzida à vacinação quando comparados à população geral (dados anteriores à pandemia), sendo assim, um trabalho recente publicado no JAMA (Journal of the American Medical Association) se propôs a definir qual a imunogenicidade da vacina Pfizer-BioNTech (BNT162b2) nessa população de alto risco.
Foi realizado um ensaio de coorte prospectivo, unicêntrico, com o objetivo de avaliar a resposta humoral conferida após a primeira e segunda doses da vacina em paciente com doença renal crônica dialítica. Foram recrutados 142 pacientes (grupo intervenção) entre fevereiro e março de 2021, com conclusão dos trabalhos em abril do mesmo ano. Havia dois subgrupos: o primeiro (n = 76) recebeu as duas doses da vacina com intervalo médio de 21 dias; o segundo subgrupo (n = 66) recebeu apenas a primeira dose da vacina (na época do estudo ocorreu uma mudança na política de vacinação no Canadá, sendo priorizada a vacinação da primeira dose no maior número de pessoas, em detrimento da aplicação da segunda dose). O grupo controle era constituído por profissionais de saúde que receberam as duas doses da vacina (n = 35).
Para medida da resposta humoral nos grupos de pacientes foram utilizados três exames laboratoriais (todos baseados em anticorpos da classe das imunoglobulinas G [IgG]):
Exame |
Observação |
Anticorpo anti-spike (anti-S) | Utilizado para medir a resposta humoral à vacinação e/ou infecção natural pelo SARS-CoV-2 |
Anticorpo antidomínio de ligação ao receptor (anti-RBD) | Utilizado para medir a resposta humoral à vacinação e/ou infecção natural pelo SARS-CoV-2 |
Anticorpo antinucleocapsídeo (anti-NP) | Utilizado para detectar a infecção natural pelo SARS-CoV-2, já que a vacina testada não aumenta a produção deste antígeno |
O subgrupo de pacientes que recebeu duas doses da vacina teve os anticorpos testados antes da aplicação da segunda dose, sendo testados novamente na primeira e na segunda semana após a vacinação. O subgrupo que recebeu apenas uma dose teve seus anticorpos dosados antes da vacinação e 28 dias após. O grupo controle recebeu as duas doses da vacina com anticorpos medidos duas e quatro semanas após a vacinação.
Para definição de viragem sorológica/soroconversão os resultados dos exames dos pacientes deste estudo foram comparados com os resultados dos mesmos exames no plasma de pacientes com Covid-19 anterior.
Resultados
Dos pacientes que receberam apenas uma dose da vacina (n = 66) houve 80% de soroconversão (n = 53), mas apenas 23% destes mantiveram a elevação do anti-spike após quatro semanas. Nos 76 pacientes que receberam as duas doses da vacina, a primeira dose da vacina elevou os níveis de anti-spike em 86% (n = 65), com 23% (15 pacientes) permanecendo assim após quatro semanas. Após a segunda dose da vacina, a resposta imunológica foi de 57% (n = 43) após a primeira semana, 72% (n = 52) na segunda semana e 96% (n = 69) após a terceira semana. Resultados semelhantes, porém com soroconversão menor foram encontrados após a dosagem de anti-RBD (boa correlação com a presença de anticorpos neutralizantes).
Os pacientes do grupo controle apresentaram soroconversão de 100% (n = 35) nas dosagens de anti-spike e anti-RBD após duas e quatro semanas da vacinação. Indivíduos que apresentaram elevação do anti-NP basal foram excluídos do estudo.
Dois pacientes do estudo foram infectados com Covid-19 após terem recebido as duas doses da vacina. Ambos tiveram a resposta de produção do anti-RBD antes da soroconversão do anti-NP, sendo hospitalizados e não evoluindo para doença grave.
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Mensagem prática
A soroconversão para níveis de anticorpos circulantes iguais ou maiores aos de pacientes infectados posteriormente pela Covid-19 é fator indicativo da capacidade de proteção que a vacina da Pfizer-BioNTech (BNT162b2) confere aos pacientes com doença renal crônica dialítica. Entretanto, trata-se de uma resposta menos efetiva quando comparada a indivíduos sem comorbidade. Este achado verdadeiro é encontrado em outros grupos de risco como pacientes oncológicos e transplantados que receberam órgãos sólidos, sendo de suma importância a imunização destes grupos de risco com as doses completas do esquema vacinal.
Neste estudo, por exemplo, o grupo que recebeu apenas uma dose da vacina foi tratado devido a uma mudança na política de vacinação do Canadá que priorizou a aplicação da primeira dose em todas as pessoas e, posteriormente, a segunda dose seria aplicada, devido à escassez de recursos.
Referência bibliográfica:
- Yau K, Abe KT, Naimark D et al. Evaluation of the SARS-CoV-2 Antibody Response to the BNT162b2 Vaccine in Patients Undergoing Hemodialysis. JAMA Network Open. 2021;4(9):e2123622. doi: 10.1001/jamanetworkopen.2021.23622
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