As infecções do trato urinário (ITU) representam uma complicação frequente em pacientes com diabetes tipo 2 (DM2) e têm sido historicamente apontadas como motivo de preocupação entre usuários de inibidores de SGLT2, devido ao seu potencial efeito glucosúrico. Nesse contexto, estudo recente publicado no European Heart Journal teve como objetivo avaliar o impacto prognóstico da ITU em pacientes com DM2 em uso de inibidores de SGLT2 (iSGLT2), assim como determinar os efeitos da descontinuação versus continuidade da medicação após um episódio de ITU.

Métodos do estudo
Para isso, foi desenhado um estudo observacional retrospectivo, utilizando dados do Clinical Data Analysis and Reporting System (CDARS) de Hong Kong, abrangendo o período de 2015 a 2022. Foram incluídos 61.606 pacientes com DM2 em uso de iSGLT2. O desfecho primário cardiovascular consistiu em hospitalização por insuficiência cardíaca, infarto, AVC ou mortalidade por todas as causas; o desfecho primário renal incluiu declínio ≥50% na taxa de filtração glomerular, doença renal terminal ou morte. A ocorrência de ITU foi definida por urocultura.
Resultados
Entre os pacientes analisados, 3921 (6,36%) apresentaram pelo menos um episódio de ITU, cuja presença foi associada a risco significativamente maior de eventos adversos quando comparada à ausência de ITU, entre os quais: desfecho cardiovascular primário, desfecho renal primário, mortalidade cardiovascular e mortalidade por todas as causas.
Entre os pacientes que desenvolveram ITU, 32,31% descontinuaram o SGLT2 após o episódio. A descontinuação foi associada a pior desfecho cardiovascular primário, pior desfecho renal primário e maior mortalidade por todas as causas. Importante destacar que não houve diferença no risco de ITU recorrente entre descontinuar e continuar o SGLT2, indicando ausência de benefício em suspender a medicação com objetivo de reduzir recorrência da ITU.
Conclusão e mensagem prática
O estudo demonstra que a ITU em usuários de SGLT2 é um marcador importante de pior prognóstico, associada a aumento substancial no risco cardiovascular, renal e de mortalidade. Porém a descontinuação dos inibidores de SGLT2 após um episódio de ITU está relacionada a pior evolução clínica, sem redução no risco de ITU recorrente. Os achados reforçam a necessidade de cautela na suspensão indiscriminada desses fármacos após ITU e sugerem que a continuidade da terapia pode oferecer benefícios clínicos relevantes, merecendo ser avaliada em estudos randomizados futuros.
Autoria

Erik Trovão
Formado em Medicina pela UFCG •Residência em Clínica Médica pelo HBLSUS/PE •Residência em Endocrinologia e Metabologia pelo HAM-SUS/PE •Titulo de especialista em Endocrinologia e Metabologia pela SBEM •Mestre em neurociências pela UFPE •Preceptor da Residência de Endocrinologia do HC/UFPE
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