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Endocrinologia24 março 2025

Impacto da perda de peso na remissão do diabetes tipo 2

Estudo buscou quantificar a magnitude da perda de peso necessária para induzir a remissão do diabetes tipo 2

O diabetes mellitus tipo 2 (DM2) é uma condição crônica que afeta mais de 537 milhões de adultos mundialmente, com projeções indicando que esse número pode atingir 783 milhões até 2045, sendo uma das condições crônicas mais importantes da prática médica. Apesar do avanço terapêutico na última década, ainda carecemos de terapias capazes por si só de levar à cura da condição. 

Contudo, com o surgimento de novos tratamentos capazes de levar a uma eperda de peso antes vista apenas com a cirurgia bariátrica, como os agonistas de GLP-1 e agonistas duplos GIP/GLP-1, a remissão da doença, definida como HbA1c < 6,5% (ou glicemia de jejum <126 mg/dL quando HbA1c não for confiável) sem uso de medicamentos hipoglicemiantes por pelo menos três meses, tem se tornado possível, visto a íntima relação entre sobrepeso/obesidade e a resistência insulínica. 

Estudos prévios demonstraram que a perda ponderal pode restaurar a função da célula beta pancreática e reduzir a resistência insulínica, promovendo a normalização da homeostase glicêmica. No entanto, a magnitude da perda de peso necessária para induzir a remissão ainda é motivo de debate. Visando preencher esta lacuna do conhecimento médico e endocrinológico, foi elaborada uma metanálise que buscou quantificar essa relação, analisando dados de ensaios clínicos randomizados (ECRs) e identificando fatores que impactam no sucesso da remissão. A revisão sistemática foi publicada recentemente no Lancet e trazemos para discussão no portal. 

Saiba mais: Nova diretriz brasileira sobre diagnóstico de diabetes mellitus tipo 2

Métodos do estudo 

O estudo consistiu em uma revisão sistemática com metanálise, utilizando meta regressão para controle de fatores confundidores, conforme diretrizes Cochrane e PRISMA, incluindo 22 ECRs com mais de 12.000 participantes. Foram analisadas intervenções baseadas em mudanças no estilo de vida, uso de medicamentos anti-obesidade e cirurgia bariátrica. O objetivo principal foi avaliar a proporção de pacientes que atingiram remissão parcial ou completa do DM2. Neste estudo, a remissão completa de diabetes foi definida como HbA1c < 6,0% e/ou glicemia de jejum < 100 mg/dL sem uso de hipoglicemiantes e parcial como HbA1c < 6,5% e/ou glicemia de jejum < 126 mg/dL, pelo menos um ano após a intervenção para perda de peso. 

A amostra englobou indivíduos com sobrepeso ou obesidade (IMC ≥25 kg/m², ou ≥23 kg/m² para populações asiáticas) com DM2. A média de idade dos participantes foi de 50 anos, com distribuição variada entre faixas etárias: 10% dos participantes tinham menos de 45 anos, 12% entre 45 e 49 anos, e 78% tinham 50 anos ou mais. Aproximadamente 60% eram do sexo feminino, e a população não branca representou 30% dos participantes. 

A duração do diabetes variou amplamente, com 45% dos participantes tendo a doença há menos de 5 anos e 55% há mais tempo. O controle glicêmico inicial também apresentou variações, com HbA1c médio superior a 8% em 40% dos pacientes. Além disso, 25% dos participantes faziam uso de insulina, enquanto os demais estavam sob outras terapias hipoglicemiantes​. 

Resultados 

Os resultados, como esperado, demonstraram uma forte relação contínua entre perda de peso e remissão do DM2. Dos indivíduos que apresentaram uma perda de peso menor que 10%, apenas 0,7% dos participantes atingiram remissão completa e 5,4% alcançaram remissão parcial. Contudo, uma perda de 10–19% do peso corporal resultou em remissão parcial em 48,4% dos pacientes (os estudos não reportaram dados sobre remissão completa nessa faixa de perda de peso). Maiores perdas de peso foram mais associadas à remissão do DM: 

  • Perda de 20–29% do peso corporal: Remissão completa em 49,6% dos casos e remissão parcial em 69,3%. 
  • Perda ≥30% do peso corporal: Remissão completa em 79,1% e parcial em 89,5%​. 

A análise de meta-regressão revelou que, para cada 1% de perda de peso, a chance de remissão completa aumentou em 2,17 pontos percentuais, e a probabilidade de remissão parcial cresceu 2,74 pontos percentuais. 

NÃO FORAM OBSERVADOS OUTROS FATORES QUE INFLUENCIAM NA REMISSÃO DO DIABETES 

 Nem tempo de duração do diabetes, nem idade, sexo, etnia ou uso de insulina foram fatores determinantes na resposta à perda de peso, sugerindo que o impacto da redução ponderal é independente de outras características clínicas. Mesmo o tratamento que levou à perda de peso, após regressão com análise multivariada, não teve impacto (ou seja, neste modelo de análise estatística, a cirurgia bariátrica não foi superior à perda de peso por outras intervenções). 

Outro aspecto importante foi a sustentabilidade da remissão, abordada no apêndice do artigo. Após um ano, 48% dos pacientes mantiveram a remissão, mas esse número caiu para 14% em 5 anos, enquanto a proporção de pacientes com remissão parcial caiu de 39% após um ano para 19% após 5 anos, evidenciando a necessidade de estratégias para manutenção do peso perdido​, que deve impactar diretamente no sucesso do controle glicêmico a longo prazo. 

Leia também: Perda de peso para prevenção e controle do diabetes

Perspectivas e conclusões 

Este estudo reforçou a importância da perda de peso como pilar central no manejo do DM2, especialmente considerando que cerca de 85% dos brasileiros com diabetes apresentam sobrepeso ou obesidade. O impacto desses dados para a realidade nacional é substancial, pois o Brasil enfrenta desafios relacionados ao aumento da obesidade e ao difícil acesso a terapias avançadas para perda de peso, sobretudo pelo custo atrelado a tais terapias. 

A principal mensagem do estudo é que a perda de peso, independentemente do método, pode levar à remissão do diabetes, sendo uma meta terapêutica viável para muitos pacientes. A evidência sugere que intervenções intensivas precoces são mais eficazes e que a manutenção da perda de peso deve ser igualmente endereçada para evitar o reganho de peso e recidiva do diabetes.  

 

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Referências bibliográficas

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