O hipoparatireoidismo é uma condição endócrina caracterizada por baixos níveis de cálcio e paratôrmonio (PTH) baixos ou inapropriadamente normais. Trata-se de uma desordem rara, cujo manejo clínico constitui grande desafio na área médica.
Sua prevalência gira em torno de 6,4 a 38 casos/100.000 sendo a maioria deles decorrente de pós-operatório de cirurgias cervicais a exemplo da tireoide e das paratireoides.
Recentemente, foi publicado um guideline revisado pela Sociedade Europeia de Endocrinologia para diagnóstico e manejo terapêutico do hipoparatireoidismo (hipoPT) crônico em adultos.
Vamos discorrer sobre as principais recomendações.

Quanto ao diagnóstico:
O guideline recomenda que o diagnóstico de hipoparatireoidismo crônico seja feito em pacientes com hipocalcemia persistente e níveis de PTH baixos ou inapropriadamente normais. Além disso, testes genéticos devem ser realizados quando a causa cirúrgica ou demais causas mais óbvias sejam excluídas.
O guideline define como hipoPT cirúrgico persistente quando ele ocorre por mais de 12 meses depois da cirurgia, diferente do guideline de 2015 que definia acima de 6 meses.
As principais comorbidades que estão associadas ao hipoPT crônico são: declínio de função renal, nefrolitíase, nefrocalcinose; aumento de infecções, desordens neuropsiquiátricas como ansiedade e depressão; fadiga muscular; dores articulares; aumento do risco cardiovascular como arritmias, insuficiência cardíaca e ICC e catarata.
Quanto aos alvos do manejo:
Para o manejo clínico do HipoPT crônico, é recomendado que o paciente seja absorvido em centro médico experiente e focado no bem-estar do paciente, visando melhorar sua qualidade de vida, minimizar os sintomas da hipocalcemia, otimizar o prognóstico e manter os níveis de cálcio no limite inferior da normalidade. Sendo assim, é importante orientar e educar os pacientes para reconhecer os sinais e sintomas de hipo ou hipercalcemia.
As principais metas do manejo clínico são: calciúria de 24h normal, níveis de fosfato e magnésio dentro dos valores de referência e níveis de vitamina D (25-OH-Vitamina D)> 30ng/mL.
Quanto ao tratamento:
É recomendado o tratamento para todos os pacientes com HipoPT crônico que apresentem sintomas de hipocalcemia e/ou cálcio ajustado pela albumina < 8mg/dL ou cálcio iônico < 1mmol/L.
Mesmo para os pacientes assintomáticos, o tratamento também é recomendado para pacientes com cálcio ajustado pela albumina entre 8 mg/dL e o limite inferior de referência ou cálcio iônico entre 1mmol/L e o limite inferior de referência.
É recomendado que os pacientes recebam análogos de vitamina D ativa sempre que possível (alfacalcidol 0,5-4g/dia ou calcitriol – 0,25-2ug/dia). Caso não seja possível, utilizar doses suprafisiológicas de colecalciferol (800-2000I/dia). Tais medidas visam reduzir os sintomas de hipocalcemia e manter os níveis séricos de cálcio dentro dos limites recomendados.
De modo análogo, a ingesta de cálcio diária também deve ser adequada para 800-1000mg/dia. Os suplementos de cálcio são recomendados quando a ingesta diária dietética é insuficiente ou os níveis de cálcio não atingiram os valores recomendados com o tratamento apenas com vitamina D.
A suplementação com cálcio elementar deve ser feita com 500mg/dia ou mais, fracionados em pequenas doses ao longo do dia. O carbonato de cálcio é o mais utilizado por ser mais rentável, porém necessita de acidez gástrica para ser bem absorvido. Já citrato malato de cálcio pode ser utilizado em situações de acloridria e está associado a menor risco de nefrolitíase.
A recomendação de reposição de PTH deve ser feita para pacientes com hipoPT crônico com persistência dos sintomas apesar do tratamento otimizado com suplementação de vitamina D e cálcio. As principais indicações são: flutuações nos níveis séricos de cálcio ou hipocalcemia sintomática, prejuízo na qualidade de vida atribuída ao hipoPT crônico, redução da função renal (TFG < 60mL/min/1,73m2), hipercalciúria (300mg/24h para homens ou 250/mg/24h para mulheres) e/ou hiperfosfatemia. Em casos de hipercalciúria, é recomendado que medidas sejam adotadas para reduzir o cálcio na urina a exemplo dos diuréicos tiazídicos. Caso a reposição de PTH seja iniciada, é recomendada uma reavaliação após 6-12 meses.
Quanto à monitorização:
Quanto ao monitoramento, o guideline recomenda dosagem de PTH pelo menos 1x ao ano, dosagem de cálcio ajustada pelos níveis de albumina, cálcio iônico, fósforo, magnésio, creatinina e cálculo de taxa de filtração glomerular a cada 3-6 meses, bem como monitoramento dos sinais e sintomas de hipo e hipercalcemia.
Para cada alteração no tratamento, é recomendado uma reavaliação a cada 1-2 semanas. O guideline também sugere a dosagem de calciúria de 24h 1x a cada 1-2 anos. Exames de imagem não são recomendados de forma rotineira a não ser que haja suspeita de nefrolitíase, nefrocalcinose ou declínio de função renal.
Por fim, o guideline alerta para rastreio de comorbidades, bem como o risco de fraturas de forma similar à população geral.
Autoria

Juliane Braziliano
Médica graduada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Residência de Endocrinologia e Metabologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Residência de Clínica Médica pelo Hospital Federal dos Servidores do Estado (HFSE). Editora-médica de Endocrinologia do Portal Afya.
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