Logotipo Afya
Anúncio
Endocrinologia6 fevereiro 2025

Combinação iSGLT-2 e antagonista de glucagon em pacientes com DM1

Estudo avaliou a combinação de um inibidor de SGLT2, a dapagliflozina, com o volagidemab (GRA) em pacientes com DM1

O manejo do diabetes tipo 1 (DM1) continua a ser um desafio, mesmo com os avanços em tecnologias como monitorização contínua da glicose (CGM) e sistemas híbridos de infusão de insulina. Uma área emergente de pesquisa é a adição de terapias não insulínicas para melhorar o controle glicêmico e reduzir a variabilidade da glicose. Entre essas opções, os inibidores do cotransportador de sódio-glicose tipo 2 (SGLT2) têm mostrado benefícios na redução da glicemia e da dose de insulina necessária. No entanto, seu uso no DM1 é limitado devido ao aumento significativo no risco de cetoacidose diabética (CAD), frequentemente mediada pela elevação de glucagon induzida pelo uso dos SGLT2. No momento, a American Diabetes Association (ADA) contraindica seu uso de forma isolada em pacientes com DM1. 

O glucagon é uma peça central na regulação metabólica e está envolvido diretamente na estimulação da produção de glicose e cetonas pelo fígado. Recentemente tem se aventado a hipótese de que o uso de um antagonista do receptor de glucagon (GRAs), como o volagidemab, possa contrabalançar os efeitos adversos do SGLT2, ao reduzir a produção hepática de glicose e cetogênese, permitindo maior segurança no uso dos iSGLT-2 em pacientes com DM1. 

Nesse contexto, foi publicado no mês de janeiro/2025 na Diabetes Care, revista da American Diabetes Association (ADA) um estudo avaliando justamente a combinação de um inibidor de SGLT2, a dapagliflozina, com o volagidemab (GRA) em pacientes com DM1, explorando sua eficácia e segurança em termos de controle glicêmico, redução da necessidade de insulina e mitigação do risco de CAD. Pela importância do tema, trazemos esse artigo para discussão no portal. 

Métodos 

O estudo foi um ensaio clínico randomizado, cross-over, duplo-cego e controlado por placebo, com 12 participantes adultos diagnosticados com DM1 há longa data (média de 24 anos), tratados com insulina intensiva por meio de sistemas híbridos de alça fechada (CLS) ou múltiplas injeções diárias (MDI). Os critérios de inclusão envolviam ter DM1, com HbA1c inicial: ≤ 9,0%. 

Quanto à população do estudo, a média de idade foi de 32 anos (24 a 48 anos), com DM1 de longa duração (média de 24 anos); a mediana de HbA1c no início era de 6,7%, com IMC médio de 26,2 kg/m². Todos os participantes utilizavam CGM e estavam familiarizados com estratégias avançadas de manejo do DM1. 

O protocolo incluiu dois períodos de tratamento de 4 semanas, intercalados por um washout de 6 semanas, para eliminar efeitos residuais das terapias. Durante os períodos de intervenção, os participantes receberam dapagliflozina (10 mg/dia) isolada ou combinada com volagidemab (70 mg/semana). As doses de insulina foram ajustadas de acordo com o protocolo para evitar hipoglicemia e otimizar a glicemia dentro do alvo. Os parâmetros avaliados incluíram o controle glicêmico (média de glicose, tempo na faixa alvo [TIR: 70–180 mg/dL], variabilidade glicêmica); necessidade diária de insulina; produção de corpos cetônicos, avaliada durante um teste de retirada de insulina (IWT) e critérios de segurança, incluindo avaliação de CAD e outros eventos adversos. 

Veja mais: DM1 além da insulina: Inibidores do SGLT2 + Antagonista do Receptor de Glucagon

Resultados 

Quanto ao controle glicêmico, a combinação dapagliflozina e volagidemab resultou em melhor controle glicêmico do que o baseline ou a dapagliflozina de forma isolada, tanto visto pela média de glicose como tempo no alvo: 

1) Média de glicose:

– Terapia combinada: 131 mg/dL. 

– Dapagliflozina isolada: 138 mg/dL. 

– Baseline: 150 mg/dL 

*Redução significativa com a combinação em comparação ao baseline (p<0,001) e ao SGLT2 isolado (p=0,01). 

2) Tempo na faixa alvo de glicose (TIR): 

– Terapia combinada: 86%. 

– Dapagliflozina isolada: 78%. 

– Baseline: 70%. 

*Aumento significativo com ambas as intervenções, com superioridade da combinação (p<0,001). 

Vale destacar que os participantes incluídos no estudo estavam bem controlados glicêmicamente (HbA1c mediana de 6,7%) e utilizavam tecnologia avançada para manejo do DM1, como CGM e bombas híbridas. A duração média do DM1 de 24 anos destaca também uma população com longo histórico da doença e alto risco de complicações metabólicas. 

A combinação também resultou em melhora na variabilidade glicêmica, checada pela redução no desvio padrão da glicose (terapia combinada: 36 mg/dl vs baseline: 52 mg/dL (p<0,001). 

Quanto à dose total de insulina utilizada, houve uma redução de 27% com a combinação (0,41 U/kg/dia) em comparação ao baseline (0,56 U/kg/dia; p<0,001) e em 21% em relação ao SGLT2 isolado (0,52 U/kg/dia; p=0,002). A combinação reduziu de forma proporcional tanto a insulina basal quanto os bolus prandiais. 

Informações importantes de cetoacidose 

A principal preocupação no uso dos inibidores de SGLT-2 é o risco de cetoacidose ligado à medicação. Para avaliar o impacto da combinação com o uso do GRA, foi realizada uma monitorização de cetoácidos em um teste de retirada de insulina.  

Durante o teste (IWT), os níveis de β-hidroxibutirato (BHB) foram significativamente mais baixos com a terapia combinada (2,0 mmol/L) em comparação ao SGLT2 isolado (2,4 mmol/L; p=0,048). O índice de cetogênese (IKet), que mede a taxa de produção de cetonas, também foi significativamente menor com a combinação (46 vs. 73; p=0,01), apontando para uma redução no risco de cetogênese com a combinação relativamente ao uso isolado de iSGLT-2. 

Com relação a desfechos clinicamente significativos, não foram observados episódios de CAD durante o estudo. A combinação foi bem tolerada, com eventos adversos leves, incluindo desconforto gastrointestinal e elevações transitórias de transaminases hepáticas, sem relevância clínica. 

Considerações 

Os resultados destacam o potencial da combinação de iSGLT2 com GRA como uma estratégia promissora para o manejo do DM1. A combinação demonstrou benefícios significativos no controle glicêmico, na redução da necessidade de insulina e na mitigação do risco de CAD, apresentando uma possível solução para a principal limitação dos SGLT2 no DM1. A modulação do glucagon pelo volagidemab foi fundamental para atenuar a cetogênese induzida pela dapagliflozina, representando um avanço terapêutico importante. 

No entanto, algumas limitações devem ser consideradas. A pequena amostra (n=12) e o curto período de intervenção (4 semanas) limitam a generalização dos resultados. Estudos maiores, com duração mais longa, são necessários para confirmar a segurança e eficácia da terapia combinada em populações mais amplas e diversificadas. Além disso, investigações adicionais devem avaliar os impactos em desfechos cardiovasculares e renais, bem como explorar biomarcadores que possam identificar os pacientes mais adequados para essa abordagem. 

Se implementada clinicamente, essa combinação pode preencher uma lacuna significativa no manejo do DM1, oferecendo uma solução para pacientes que não conseguem alcançar o controle glicêmico desejado ou que apresentam risco aumentado de complicações metabólicas. 

 

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Compartilhar artigo

Referências bibliográficas

Newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Anúncio

Leia também em Endocrinologia