Obesidade ocorre em 42% e sobrepeso em 30,7% dos adultos americanos e esses números continuam a aumentar. Diferentes intervenções são utilizadas na tentativa de reverter esse quadro e atualmente está em evidência o emprego de agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1, ou mais popularmente chamados de agonistas do receptor de GLP-1, incluindo semaglutida (nome comercial Ozempic, Rybelsus e Wegovy), terzepatida (Monjouro e Zepbound) e liraglutida (Victoza e Saxenda).
Essas drogas atuam no sistema nervoso central impactando a regulação do apetite e consequente perda de peso, aumentando sensação de saciedade, diminuindo velocidade de esvaziamento gástrico e diminuindo o chamado “food noise” ou sensação exagerada de fome não fisiológica.
A perda ponderal resultante do uso dessas medicações tem trazido à tona um novo desafio aos cirurgiões plásticos e de reconstrução facial designado nas mídias sociais como “Ozempic face” para as mudanças como diminuição de volume na região temporal, bochechas, sulcos lacrimais, linha da mandíbula e sulcos nasogenianos.
Apesar de amplamente divulgado na mídia não há estudos que objetivamente avaliaram a ocorrência dessas alterações relacionadas ao volume facial nesses pacientes.
O objetivo de um interessante e recente artigo publicado na Otolaryngology – Head and Neck Surgery, revista oficial da Academia Americana de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço agora em 2025, por Sharma et al, pesquisador da Vanderbilt University – Tennessee, EUA, foi avaliar tomografias computadorizadas (TC) e ressonâncias magnéticas (RM) incidentais da face de pacientes antes e depois do tratamento com agonistas do GLP-1 para avaliação objetiva dessas possíveis alterações faciais relacionadas a perda de peso ocasionada por essas medicações.

Materiais e Métodos
Estudo retrospectivo realizado por revisão de prontuários, de pacientes adultos, com prescrição de agonistas de GLP-1 e que foram submetidos a imagem da face por TC ou RM, entre 2017 e 2024 e sendo calculado o volume da região medial da face para cada paciente.
Foram excluídos pacientes com imagem com tempo superior a 5 anos da data da prescrição da medicação, presença de comorbidades associadas a rápida perda ponderal, não apresentaram perda ponderal ou intolerância durante o uso da medicação ou apresentaram imagens inadequadas para cálculo do volume da região medial da face.
O cálculo do volume da porção central da face foi feito do limite inferior da órbita até a porção inferior do palato duro, sendo avaliados volume total, volume superficial compreendido gordura infra-orbital, gordura da bochecha e nasolabial e volume profundo definido pelo tecido adiposo profundo/posterior ao arco zigomático, gordura sub-orbicular ocular e gordura bucal. As medidas de interesse do estudo foram calculadas em porcentagem em relação as medidas basais dos pacientes antes do uso da medicação.
Resultados
O estudo incluiu 20 pacientes na análise. A idade mediana foi 54 anos (Interquartile range – IQR, medida de intervalo entre o primeiro e o terceiro quartis, ou seja, onde se concentram 50% dos casos, foi de 48-61 anos), 14 eram mulheres (70%). A mediana de peso inicial foi 114kg (IQR 96-123 kg) e mediana de peso final foi 100kg (IQR 82-121 kg). A média de tempo de tratamento foi 321 dias (desvio-padrão DP = 291 dias), e a média de peso perdido foi 11kg (SD = 6,9 kg).
O estudo identificou que a mediana de porcentagem de diminuição de volume facial total foi de 9% (IQR 3%-15%), a de diminuição de volume superficial da face foi de 11% (IQR 6-16%) e de diminuição de volume facial profundo foi de 7% (IQR -20% a 17%).
O estudo também realizou correlação de Spearman sugerindo uma correlação positiva e estatisticamente significativa entre perda de peso e perda de volume facial superficial (rho = 0,590, P = 0,006) mas não para perda de volume facial profundo (r=0,115, P =0,629) e regressão linear demostrou uma perda de volume facial total de 7% para cada 10kg de perda de peso (r= 0,063, SE = 0,003, P =0,293),
Discussão
Esse pioneiro estudo, concebido para responder de forma objetiva uma dúvida prática bastante em evidência no momento, identificou que as mudanças faciais genericamente denominadas “Ozempic Face”, ocorrem mais superficialmente em oposição a mudanças mais profundas em relação a gordura facial e ocorrem a uma taxa de 7% – 10% de diminuição do volume facial a cada 10 kg de perda ponderal, permitindo adequada orientação aos pacientes em relação a possíveis mudanças da fisionomia facial resultantes da perda ponderal advinda do uso de agonistas do GLP-1.
Mensagem prática
Os achados também auxiliam aos médicos que irão realizar procedimentos faciais nesses pacientes a se atentarem que as alterações ocorrem mais superficialmente, portanto com maior benefício de abordagem mais superficial, inclusive técnicas de preenchimento e aplicação de toxina botulínica e não abordar os tecidos mais profundos da face.
Autoria

Gustavo Borges Manta
Cirurgião de Cabeça e Pescoço pela Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Associação Médica Brasileira • Assistente de Cirurgia de Cabeça e Pescoço no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo - ICESP - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP e no Hospital do Servidor Público Estadual HSPE-IAMSPE • Médico cirurgião do Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE • Pós-Graduação pelo Hospital Israelita Albert Einstein em Cirurgia Robótica em Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Pós-Graduação em Gestão da Qualidade e Segurança do Paciente em Saúde.
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