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Endocrinologia19 abril 2024

ACP 2024: Reposição de testosterona para o clínico

Veja os detalhes da discussão sobre a reposição de testosterona no ACP 2024.

O tratamento do hipogonadismo masculino pode trazer diversos benefícios, como melhora da saúde e sintomas sexuais (como libido, ereções), como historicamente é demonstrado seu impacto em ganhos como massa muscular, massa óssea e benefícios cardiovasculares.  

Por outro lado, é claro que indivíduos que não tenham hipogonadismo não se beneficiarão do tratamento, sendo que o uso recreativo e manutenção em níveis suprafisiológicos do hormônio podem acarretar diversos riscos para a saúde, levando a maior risco cardiovascular e de eventos tromboembólicos, por exemplo. 

Portanto, é fundamental realizarmos a diferenciação entre indivíduos verdadeiramente hipogonádicos, que se beneficiarão da terapia, daqueles que não terão qualquer impacto. 

Essa foi a tarefa atribuída ao Dr. Bradley Anawalt, MD (Washington University, EUA) em sua palestra no congresso da American College Of Physicians (ACP 2024). 

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Testosterona ou não? 

O primeiro conceito trazido na sua palestra é o de que existem níveis de hipogonadismo e diferentes pacientes terão benefícios distintos. Logo, é fundamental o diagnóstico adequado. Para ilustrar exemplos de considerações importantes na prescrição da testosterona e no diagnóstico do hipogonadismo, o Dr. trouxe alguns exemplos de casos clínicos para auxiliar no raciocínio, ilustrando casos como a Síndrome de Klinefelter, homem com sintomas do trato genitourinário inferior (LUTS), homens com osteopenia (inclusive para a importante discussão sobre o tratamento em homens com osteoporose) e possíveis efeitos colaterais/contraindicações à terapia. Por fim, foi abordado rapidamente o uso de testosterona em mulheres de acordo com as evidências científicas mais atuais. Organizamos os assuntos em tópicos para fins didáticos e para melhor aproveitamento dos dados transmitidos. 

Diagnóstico do hipogonadismo 

Em primeiro lugar, existem dados clínicos que são altamente sugestivos de hipogonadismo. É fundamental avaliar já na história clínica dados como perda de pelos corporais, presença de ginecomastia, ausência de puberdade ou atraso puberal. Sintomas sexuais como baixa libido, ereções de baixa qualidade, perda da ereção matinal são sugestivos, mas tem menor especificidade do que o imaginado. Um detalhe que vale comentar (adicional e complementar à palestra) é de que apenas sintomas como cansaço, alteração do humor, indisposição e baixa massa muscular não são sintomas que auxiliam no diagnóstico, dado sua baixa especificidade. 

Ao exame físico, é fundamental avaliar características testiculares, já que é esperado uma redução no volume testicular. Àqueles que não tem prática no exame, basta a medida do maior diâmetro com uma régua ou então o uso do orquidômetro. 

Dados laboratoriais e de exames complementares que são sugestivos incluem (além, claro, da testosterona baixa), o aumento de LH (nos casos de hipogonadismo hipergonadotrófico), baixa densidade mineral óssea e anemia inexplicável. Causas como a Sd. de Klinefelter (XXY) devem ter sua suspeita realizada já na atenção primária.  

 Causas primárias vs. secundárias 

O hipogonadismo masculino deve ter uma causa subjacente, como qualquer patologia. Portanto, é importante que o clínico reconheça as principais causas para o manejo inicial. 

Dentre as causas primárias (problemas testiculares, ou seja, que cursam com hipogonadismo hipergonadotrófico), destaque para orquiectomias prévias, radioterapia ou traumas testiculares e Sd de Klinefelter (que pode acometer até 1:500 indivíduos).  

Dentre as causas secundárias (alterações hipotálamo-hipofisárias e/ou funcionais, que cursam com FSH e LH baixos ou inapropriadamente normais), destaque para macroadenomas hipofisários, hiperprolactinemia, excesso de ferro (hemocromatose), uso de glicocorticóides, opióides, radioterapia de SNC, doenças sistêmicas graves ou apneia do sono grave. Lembrar sobretudo do hipogonadismo funcional de causa metabólica, associado a obesidade e diabetes, em indivíduos com as condições. 

Causas reversíveis vs. irreversíveis 

Importante também lembrar que algumas situações, quando tratadas, podem levar a reversão do hipogonadismo, como no caso da obesidade ou após o tratamento da hiperprolactinemia. Contudo, mesmo causas reversíveis, se mantidas por longo prazo, podem implicar num hipogonadismo permanente. 

Sintomas do trato genitourinário inferior (LUTS)

Um destaque da palestra foi a abordagem específica da presença de sintomas do trato genitourinário inferior. A mera presença dos sintomas não deve contraindicar a terapia de reposição hormonal com testosterona, uma vez que a TRT não está associada a piora de LUTS se sintomas leves a moderados. 

Contudo, vale lembrar que caso haja presença de sintomas intensos (IPSS 19 ou mais), nódulo na próstata não investigado ou PSA elevado sem esclarecimento da causa (PSA acima de 4,0) devem ser avaliados por urologista antes do início da TRT, pois comumente são contraindicações ao uso. 

Saúde óssea e terapia de reposição de testosterona (TRT) 

A saúde óssea foi outro ponto importante abordado na palestra, já que temos novas evidências sobre o tema. A testosterona classicamente vem sendo associada a ganho em massa óssea e é sabido que indivíduos do sexo masculino, hipogonádicos, estão mais sujeitos à osteoporose e maior risco de fraturas. No entanto, carecemos de evidências que demonstrem o papel da testosterona na prevenção de fraturas. 

Nesse contexto foi publicado em janeiro de 2024 no New England Journal of Medicine um subestudo do TRAVERSE trial, um estudo de fase 4, randomizado e duplo cego que buscou avaliar o impacto da reposição de testosterona gel na redução do risco de fraturas em indivíduos com hipogonadismo. 

O estudo acabou demonstrando não haver redução do risco de fraturas e até mesmo havendo maior risco de fraturas clínicas no grupo TRT (HR 1.43; IC 95%; 1.04 – 1.97). Mas vale a pena destacar que, apesar do desenho, o Dr. Anawalt destaca que não houve uma diferença quando olhamos especificamente fraturas osteoporóticas maiores, sendo que foi incluído na análise dados como fratura de costela e tornozelo, que podem se relacionar a traumas e/ou atividade física (foram excluídas fraturas faciais, de crânio, dedos e esterno). Ainda, a diferença do nível de testosterona atingido entre os grupos foi baixa, podendo ter sido insuficiente para se gerar conclusões sobre o efeito específico da intervenção. A conclusão na palestra é de que não há razão para considerar testo como terapia anti fratura no momento, mas também não há motivos/evidências suficientes para contraindicar o  utilizar testo em pacientes com alto risco de fraturas. 

Efeitos adversos e cuidados na prescrição e monitorização 

A eritrocitose é o efeito adverso mais comum no uso da TRT, acometendo sobretudo idosos. Aumenta conforme a dose e também com o pico, algo que é possível contornar com as formulações de uso transdérmico, onde o pico é menor. Normalmente recomenda-se não iniciar se HT > 48%. Devemos avaliar o hematócrito em 3-6 meses após o início da terapia e se ao longo do seguimento o paciente apresentar HT > 52%, é necessário considerar espaçar doses ou trocar para via transdérmica. 

Vale lembrar também sobre a necessidade de reavaliação e encaminhamento para urologista se houver elevação do PSA em 1,4 ng/dl, valor > 4 ng/dl em qualquer momento, alteração ao toque retal ou novos sintomas graves de LUTS. 

Reposição de testosterona em mulheres 

Bem brevemente, o Dr. Anawalt mencionou que não há formulações amplamente disponíveis de TRT para mulheres nos Estados Unidos. Na Austrália, existe formulação em patch que foi estudada em ensaios clínicos randomizados, de forma que no país, é possível considerar a terapia para desejo sexual hipoativo, com bons resultados (aumento da satisfação sexual).  

Adicionalmente, não há estudos robustos sobre o tema ou formulações aprovadas para uso em mulheres no Brasil.

Confira todas os destaques do ACP 2024!

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