A multidisciplinaridade é incorporada avidamente aos currículos modernos, baluarte de excelência institucional, onde o conceito é belíssimo. Desde os mais tenros anos de formação, sonhamos estar naquelas rodas de gente inteligente, oferecendo insights preciosos, trocando experiências solidárias em prol de um objetivo em comum.
Tantas vezes o que se vê na realidade, no entanto, não poderia estar mais distante dessa nobre aspiração acadêmica. Reuniões a toque de caixa, meras formalidades restritas ao checklist de metas corporativas e a roda se desfaz num piscar de olhos.
Mas o que fazer então com essa tal multidisciplinaridade? Afinal, como manter a sua essência nobre de trocas de experiências? Foi pensando nisso que separamos alguns aspectos fundamentais para a sua existência:
Pontos importantes na multidisciplinaridade
I – Lembre-se do porquê ela existe
A complexidade dos sistemas de saúde contemporâneos é assombrosa. É absolutamente impossível agregar tantas atribuições em um único profissional, o próprio desenho da cadeia assistencial depende do vínculo multidisciplinar. Inclusive, é pela falha em realizá-lo que nos deparamos com erros que não eram vistos sequer nos serviços de saúde mais primitivos.
Se não houver troca efetiva entre os diferentes profissionais envolvidos no cuidado, a assistência se converte num fenômeno aleatório e atordoante, sobretudo para o maior interessado de todos: o paciente, que entra e sai do hospital sem compreender quase nada do que lhe ocorreu.
A multidisciplinaridade existe porque as técnicas precisam ser coordenadas e porque não temos aptidão – e nem tempo! – para aplicá-las todas por nossa conta.
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II – Esteja presente – presente mesmo!
De fato, temos crescentes demandas a serem atendidas como profissionais de saúde. Prontuários, formulários e protocolos nos afastam do ato assistencial em si. Não raro utilizamos o espaço multidisciplinar para tratar de outras questões, mais ou menos importantes, dispersando nossa atenção daquele momento que deveria direcionar todo o esforço assistencial das horas e dias de trabalho porvir.
Se não como convicção, ao menos como exercício de disciplina: desligue o celular e esteja por inteiro naquele momento, você certamente aprenderá alguma coisa.
III – Seja simples, claro e objetivo
Se tantos nos perdemos em divagações e espiadinhas ao celular, a culpa também recai sobre os interlocutores que se derramam em discursos e desabafos fora de hora.
O poder de síntese, o apreço por este precioso ativo que chamamos de tempo, é um ato de respeito ao próximo. A multidisciplinaridade requer simplicidade, clareza e objetividade na comunicação.
Precisamos falar a mesma língua, precisamos adequar nosso discurso ao que o momento exige.
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IV – Conheça seu papel
Quais as suas atribuições dentro da rede multidisciplinar? O que se espera da posição que você ocupa atualmente? Sabemos que toda troca de experiências depende de alguma flexibilidade e liberdade para e se posicionar, mas – e aqui um sonoro mas – precisamos antes estar atentos ao nosso papel dentro daquele sistema.
Pelo que eu, na figura de médico/enfermeiro/psicólogo/nutricionista/fisioterapeuta/farmacêutico/assistente social, devo prezar? Quais habilidades e conhecimentos eu possuo que servem àquela situação em particular?
Se isso não estiver claro para você, saiba que está navegando sem bússola. Reflita e converse com seus colegas e superiores a respeito.
V – Seja sincero
O ambiente multidisciplinar saudável exige sinceridade antes de qualquer outra coisa. Só não confundamos com o famigerado “sincericídio”, sinceridade não é dizer qualquer coisa que lhe vem à mente, é antes um movimento interior de honestidade e – por que não dizer logo? – amor, que resulta inevitavelmente numa postura mais cordial e afetuosa.
Se não somos sinceros em nossa tentativa de compreender o que o colega está a nos dizer, ao invés de simplesmente projetarmos nossas impressões pré-concebidas, colocar palavras em sua boca; se não somos sinceros conosco em aferir nossas limitações e nosso próprio grau de comprometimento, antes de esperar por qualquer feedback polido para tomar providências, nada vai funcionar, nem no hospital, nem fora dele.
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