Em postagens anteriores neste portal já abordamos o uso dos novos anticoagulantes orais (NOACS) ou anticoagulantes orais diretos (DOACS) em pessoas portadoras de doença valvar. Em relação aos pacientes portadores de prótese valvar metálica a situação é mais delicada e complexa. Importante relembrar que o estudo RE-ALIGN (Dabigatran versus Warfarin in Patients with Mechanical Heart Valves) foi um ensaio multicêntrico, randomizado de fase II aberto que testou doses diferentes de dabigatrana (150 mg 2x/dia, 220 mg 2x/dia e 300 mg 2x/dia) em duas coortes de pacientes com PMEC: população de pacientes com cirurgia de troca valvar aórtica ou mitral nos últimos 7 dias ou àqueles com cirurgia há mais de três meses.
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Efeitos adversos no estudo anterior
Porém o estudo foi interrompido de forma prematura devido a um excesso de eventos tromboembólicos e sangramentos no grupo dabigatrana após a inclusão de 252 pacientes, sendo 168 no grupo dabigatrana e 84 no grupo da varfarina. 32% dos pacientes no grupo dabigatrana necessitaram de ajuste de dose ou suspensão da mesma. Ocorreu um total de 9 (5%) acidentes vasculares cerebrais isquêmicos no grupo dabigatrana contra nenhum no grupo varfarina e 4% de sangramentos maiores no grupo dabigatrana, contra 2% no grupo controle. E apesar destes resultados desanimadores e alarmantes (motivando a contraindicação absoluta expressa nos guidelines), ao se analisar de maneira minuciosa o estudo RE-ALIGN, observa-se que os eventos clínicos duros ocorridos (morte, avc, embolia sistêmica, sangramento maior) ocorreram exclusivamente no subgrupo de pacientes que estavam entre 7 dias e 3 meses de pós-operatório (população A).
Em relação aos outros anticoagulantes orais diretos (inibidores do Fator Xa) existiam até a publicação deste novo estudo, uma série com 7 pacientes (com seguimento de 3 meses e todos com prótese metálica na posição mitral) comparando o uso da varfarina com a rivaroxabana, num modelo antes e depois, tendo desfechos similares entre as duas drogas e outra série europeia com 10 pacientes (todos com prótese metálica na posição aórtica) também com resultados animadores.
Estudo Riwa
Durães e colaboradores publicaram desta vez o Riwa Study. Trata-se de um estudo randomizado fase II, prova-de-conceito, publicado no American Journal of Cardiovascular Drugs onde 44 pacientes foram randomizados (23 no grupo rivaroxabana e 21 no grupo varfarina). Todos tinham prótese metálica (mitral, aórtica e/ou mitroaórtica). Foram seguidos por 3 meses sendo constatado que 1 (4.3%) paciente no grupo rivaroxabana e 3 (14.3%) no grupo varfarina apresentaram desfecho primário (AVC/AIT/isquemia cerebral silenciosa/embolia sistêmica). Nenhum paciente apresentou sangramento maior.
O Riwa foi um estudo independente realizado no Brasil. Ele terá grande utilidade como gerador de hipótese para permitir que ensaios clínicos randomizados sejam conduzidos e possam testar a hipótese mínima de não inferiores dos inibidores do fator Xa em portadores de prótese metálica. Até lá, precisamos ter cautela na prescrição destas drogas neste subgrupo de pacientes.
Referências bibliográficas:
- Connolly SJ, Ezekowitz MD, Yusuf S, Eikelboom J, Oldgren J, Parekh A, et al. Dabigatran versus warfarin in patients with atrial fibrillation. N Engl J Med 2009;361:1139-51. Erratum in: N Engl J Med. 2010;363:1877.
- Eikelboom JW, Connolly SJ, Brueckmann M et al. Dabigatran versus warfarin in patients with mechanical heart valves. N Engl J Med. 2013;369(13):1206-14.
- Duraes, A. R., de Souza Lima Bitar, Y., Schonhofen, I. S., Travassos, K., Pereira, L. V., Filho, J., Neto, M. G., Junior, R. A., & Roever, L. Rivaroxaban Versus Warfarin in Patients with Mechanical Heart Valves: Open-Label, Proof-of-Concept trial-The RIWA study. American journal of cardiovascular drugs. 2020. doi: 1007/s40256-020-00449-3. Advance online publication.
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