Mordeduras em crianças no plantão: o que fazer?
Mordeduras, tanto humanas, quanto de animais, são causas frequentes de atendimentos no pronto-socorro. Dados históricos referem necessidade de amputação em um terço dos casos caso o atendimento fosse procurado após 24h desde a lesão inicial. Entretanto, a morbidade diminuiu muito devido a melhor compressão da epidemiologia e microbiologia dessas lesões.
Dados
Os dados estadunidenses estimam a ocorrência de 250.000 mordidas humanas, 400.000 mordidas de gato e 4,5 milhões de mordidas de cachorro ocorram a cada ano em adultos e crianças. As crianças são mais propensas do que os adultos a sofrer mordidas de animais. Embora apenas 10% de todas as feridas por mordida ocorram na face, dois terços dessas feridas ocorrem em crianças com menos de 10 anos de idade. Ferimentos nas extremidades são responsáveis por pelo menos três quartos de todas as mordidas, sendo a mão o local mais comum. As feridas nas mãos têm maior probabilidade de infeccionar e as feridas no rosto têm menor probabilidade de infeccionar. Além disso, as feridas profundas têm maior probabilidade de serem infectadas do que as feridas superficiais, lacerações ou feridas com defeitos óbvios na pele e nos tecidos moles.
As mordidas de animais são um risco significativo de transmissão da raiva. Os seres humanos são reservatórios acidentais da raiva, que é principalmente uma infecção de outros animais. O tétano é outra infecção potencialmente causada por uma mordida animal ou humana. Clostridium tetani é onipresente no meio ambiente e está comumente presente no solo e nos intestinos de humanos e animais. Quando presente em uma ferida, o organismo pode se replicar e produzir toxinas que são responsáveis pela infecção característica do tétano.
Microbiologia
As infecções de feridas causadas após qualquer tipo de mordida são geralmente de natureza polimicrobiana. Bactérias mistas aeróbicas e anaeróbicas da flora bucal do animal que morde e da flora da vítima são comumente isoladas em infecções de feridas por mordida. Uma média de cinco isolados bacterianos diferentes por cultura foram relatados em uma série de feridas infectadas causadas por mordidas de cães e gatos.
A tabela a seguir ilustra a microbiologia das mordeduras:
Apresentação clínica
Os sinais e sintomas relacionados às infecções de mordeduras de animais podem aparecer após horas ou dias da lesão inicial. Manifestações sugestivas de infecção incluem dor, edema e eritema no local da ferida, porém são inespecíficas no contexto de uma mordedura. A drenagem de secreção serossanguinolenta ou purulenta pode ou não estar presente. A maior parte dos pacientes encontra-se afebril no momento da avaliação. E linfadenite e/ou linfangite podem aparecer em até 20% dos pacientes.
Quiz: paciente mordida por animal doméstico apresenta febre, dor e edema.
Manejo
- Obtenha uma história clínica pertinente para auxiliar na tomada de decisões
– Tipo de animal; Saúde do animal; Ataque provocado versus não provocado; Estado de saúde da pessoa que morde, quando mordida humana, principalmente sorologias para HIV, HBV e HCV; Paciente de alto risco (imunocomprometido ou asplênico); Estado de imunização do paciente (Tétano, HBV);
- Avalie o paciente com ênfase em seu estado geral, localização, extensão (incluindo presença de corpo estranho), características (tipos de ferida: punção, abrasão, avulsão ou laceração) e gravidade da ferida (incluindo exame neurovascular);
- Obtenha exames de imagem, quando necessários para visualizar as estruturas que tem risco de serem afetadas pela mordedura ou presença de corpos estranhos;
- Realize a limpeza adequada das feridas e identifique as indicações para fechamento imediato ou tardio
– Não utilize iodopovidona; não irrigue feridas puntiformes (para os outros tipos de feridas use aproximadamente 250 ml de solução salina para irrigação)
– Realizar desbridamento e remoção de corpos estranhos
– Fechamento precoce deverá ser realizado para feridas de face e pescoço
– Feridas de mordeduras de animais deverão ser fechadas se não houver nenhuma destas condições: feridas nas mãos; feridas com sinais de infecção; feridas ocorrias a mais de oito horas
– Suturas subcutâneas não devem ser utilizadas;
- Obtenha culturas, quando a avaliação ocorrer após oito horas após a lesão inicial ou se a ferida apresentar sinais de infecção;
- Siga as indicações para imunizações ativas e/ou passivas com base na história da criança;
- Escolha antibióticos apropriados para cobertura empírica quando indicado para profilaxia (tempo de tratamento: três a cinco dias) ou tratamento de infecção (curso de sete a dez dias)
– Para mordeduras de cães, gatos ou humanos, tanto para profilaxia, quanto para tratamento, o antimicrobiano oral de escolha é Amoxicilina-clavulanato, sendo Ampicilina-sulbactam a escolha endovenosa;
– Pacientes alérgicos à penicilina podem fazer uso de cefalosporina de espectro estendido ou Sulfametoxazol-trimetoprim associados à Clindamicina;
- Determine a necessidade de acompanhamento ambulatorial ou internação hospitalar do paciente (a inspeção da ferida deve ocorrer após 48h do atendimento inicial).
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