As infecções por germes multirresistentes têm desafiado, cada vez mais, os médicos dedicados ao exercício da Medicina Interna ou Terapia Intensiva.
Nesse escopo, um patógeno de destaque é o enterococo, um coco gram positivo comensal do trato gastrointestinal e urinário.
As duas espécies mais proeminentes, no que concerne às infecções em humanos, são o Enterococcus faecalis e E. faecium, costumeiramente implicados em infecção do trato urinário, bacteremia, endocardite infecciosa, infecção intra-abdominal e do sistema nervoso central. As suas principais diferenças podem ser assim sintetizadas:
Espécies | E. faecalis | E. faecium |
Virulência |
Maior |
Menor |
Risco de endocardite infecciosa | ||
Susceptibilidade à ampicilina |
Enterococo sensível à ampicilina
A ampicilina, uma aminopenicilina, é a primeira escolha para o tratamento das infecções por Enterococo multissensível, seguida pela penicilina G cristalina. Nenhuma das duas deve ser substituída, sem uma justificativa plausível, pela vancomicina, que é reconhecidamente menos bactericida do que os beta-lactâmicos.
Uma condição que vale a pena ser destacada é referente ao escalonamento de antibioticoterapia.
Para quem lida com a Medicina Interna, uma mudança corriqueira é a substituição de piperacilina-tazobactam por meropenem diante de quadros infecciosos estagnados ou em progressão. Apesar da conduta ampliar o espectro para os gram negativos produtores de beta-lactamase de espectro ampliado (ESBL), perde-se, em muito, a potência direcionada ao enterococo. O imipenem, contudo, é um carbapenêmico que conserva uma melhor ação geral contra os germes gram positivos, entre os quais o enterococo.
Enterococo resistente à ampicilina
A resistência à ampicilina foi descrita primeiramente em 1970 e é medida por modificações da proteína ligadora de penicilina (PBP).
A opção mais pertinente nesse cenário é a vancomicina. Todavia, pode-se lançar mão da teicoplanina, daptomicina ou linezolida, principalmente quando há maior vulnerabilidade à nefrotoxicidade.
Enterococo resistente à vancomicina (VRE)
A emergência da resistência à vancomicina (VRE) foi identificada pela primeira vez na Inglaterra e França na década de 1980, estando associada a internações mais prolongadas, aumento dos custos hospitalares e das taxas de mortalidade.
O mecanismo é de mediação plasmidial, tendo como carreadores os gene van, especialmente vanA e vanB.
Os redutos terapêuticos incluem a daptomicina, que não se presta ao tratamento de infecções pulmonares por ser inativada pelo surfactante; e linezolida, que apresenta como efeitos colaterais mais proeminentes as citopenias e risco de síndrome serotoninérgica.
A teicoplanina, à semelhança da vancomicina, também é um glicopeptídeo. Dessa forma, não é a melhor opção para o tratamento do VRE, embora mantenha a atividade no genótipo vanB e possa ser utilizada na indisponibilidade ou intolerância às duas primeiras opções.
VRE e os seus fatores de risco |
Colonização:
Infecções invasivas:
|
A síntese do tratamento
O tratamento escalonado das infecções enterocócicas, baseado no perfil de sensibilidade, pode ser assim sintetizado:
Tratamento das infecções por enterococos | |
Enterococo multissensível | |
Categorias |
Primeiras escolhas |
Infecções habituais |
|
Bacteremia ou endocardite infecciosa |
|
Meningite |
Ampicilina 2-3 g 4/4h + Ceftriaxona 2g 12/12h + Gentamicina 5 mg/kg/dia. |
Enterococo resistente à ampicilina | |
| |
Enterococo resistente à vancomicina | |
|
Por fim, é sempre pertinente a monitorização dos níveis séricos das drogas, saneamento de focos infecciosos mantidos e a remoção de dispositivos invasivos infectados, como acessos venosos centrais, cateteres urinários ou próteses articulares.
Conclusão e Mensagens práticas
- As infecções por germes multirresistentes constituem-se em problema de saúde pública mundial.
- Em relação aos germes gram positivos, um grande destaque é o enterococo, sendo duas as principais espécies: E. faecalis, mais virulento; e o E. faecium, menos susceptível à ampicilina.
- A seleção de antibioticoterapia, de uma forma simplificada, pode ser assim realizada: enterococo multissensível, ampicilina; enterococo resistente à ampicilina, vancomicina; enterococo resistente à vancomicina, linezolida ou daptomicina.
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.