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Clínica Médica16 setembro 2025

Endoscopia: Cuidados necessários na vigência de agonistas de GLP-1

Posicionamento da AGA questiona suspensão automática de GLP-1 antes da endoscopia. Entenda recomendações e riscos.
Por Leandro Lima

A dispersão do uso de agonistas do receptor GLP-1 (aGLP-1), como a liraglutida, semaglutida e tirzepatida, tem imposto uma preocupação crescente entre os endoscopistas, gastroenterologistas, anestesiologistas e população leiga.

O reconhecido atraso no esvaziamento gástrico imposto pelos aGLP-1 poderia incrementar o risco de broncoaspiração de conteúdo gástrico retido por ocasião da sedação, além de prejudicar a qualidade do exame.

Nesse escopo, um posicionamento de 2024 da American Gastroenterology Association (AGA), questiona a transferência automática das recomendações da American Society of Anesthesiologists (ASA) para o âmbito da endoscopia digestiva.

ASA
Deve-se considerar a interrupção dos aGLP-1 antecedendo procedimentos ou cirurgias em 1 ou 7 dias para os medicamentos de aplicação diária ou semanal, respectivamente.

Baseada em opinião de especialistas, tendo-se por contraponto a escassez de evidências sobre o tema, o conceito tem se arraigado na prática cotidiana, motivando suspensão de cirurgias ou adoção de precauções destinadas ao paciente com “estômago cheio”, incluindo a intubação orotraqueal em sequência rápida (IOT-SR), com incremento do tempo de exame, custos e riscos do procedimento.

O documento da AGA, por sua vez, traz uma conduta um pouco mais flexível. 

AGA
Segrega as indicações dos aGLP:

  • Obesidade: na ausência de quaisquer prejuízos previstos, a interrupção do aGLP-1 por 1 e 7 dias antes da endoscopia digestiva nas aplicações diárias e semanais, respectivamente, deve ser considerada (mas não considerada mandatória).
  • Diabetes: o risco de agravamento da hiperglicemia e as suas possíveis implicações negativas no procedimento endoscópico e ato anestésico devem levar à ponderação quanto à manutenção do aGLP-1.

Uma vez que a opção seja pela realização de endoscopia digestiva na vigência de aGLP-1, deve-se considerar a presença de sintomas de mau esvaziamento gástrico (náuseas, vômitos, dispepsia ou distensão abdominal):

  • Sintomas ausentes: jejum habitual de 8 horas para sólidos e 2 horas para líquidos;
  • Sintomas presentes: pode-se lançar mão da ultrassonografia transabdominal gástrica pré-procedimento para acessar possível conteúdo retido ou prosseguir diretamente com a endoscopia digestiva, considerando-se IOT-SR se o procedimento se configurar como urgência ou emergência.

Quando possível, uma alternativa mais razoável é a adoção de dieta líquida na véspera da endoscopia digestiva, seguida pelo jejum de 8 horas. 

O tom conciliador adotado pela AGA foi corroborado por uma meta-análise publicada em 2025 na Gastrointestinal Endoscopy, que plotou os dados de 23 estudos observacionais com N > 250.000. Apesar da associação entre o uso de aGLP-1 com o risco de conteúdo gástrico residual e interrupção precoce da endoscopia digestiva alta (OR 4,54, P < 0,00001), o risco evolutivo para pneumonia aspirativa não se alterou (OR 0,96, P = 0,9).   

Conclusão e Mensagens práticas

  • A recomendação obrigatória de suspender aGLP-1 antes de endoscopia digestiva, algo que tem se arraigado na prática cotidiana, não é apoiada em evidências, e traz o risco de agravamento de hiperglicemia entre os diabéticos.
  • A segurança do paciente deve sempre ser a prioridade, mas as decisões devem equilibrar os riscos e benefícios no contexto clínico individualizado.
  • Deve-se levar em conta para a tomada de decisão a indicação do aGLP-1 (diabetes ou obesidade), comorbidades (gastroparesia, obstrução do trato gastrointestinal superior e uso de opioides) e presença de sintomas gastrointestinais altos (náuseas, vômitos, saciedade precoce, plenitude pós-prandial ou bloating).
  • A estratégia conciliadora de dieta líquida restrita na véspera do exame, seguida pelo jejum de 8 horas, é preferível às suspensões indiscriminadas.

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Referências bibliográficas

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