Os efeitos deletérios da sedação profunda e seu impacto em desfechos desfavoráveis é bem conhecido e estudado. A sedação profunda ainda é amplamente usada em pacientes críticos na terapia intensiva, em parte devido a premissa antiga de que a mesma era necessária para a adaptação dos pacientes aos ventiladores mecânicos.
Com o avanço das tecnologias, no entanto, a necessidade de sedação profunda se tornou cada vez menor, sendo possível hoje iniciar regimes de sedação leve desde o início da terapêutica, com consequente impacto positivo no tratamento e recuperação do paciente.
Pensando nisso, um grupo de intensivistas da Universidade de Bruxelas, liderados por ninguém menos que Jean-Louis Vincent MD PhD, desenvolveu diretrizes de abordagem integrada e adaptável de analgesia, sedação e cuidados, de início precoce no manejo de pacientes críticos: o eCASH (Early Comfort using Analgesia, minimal Sedatives and maximal Humane care).
Dividimos esta discussão em 3 partes a serem publicadas durante esta semana. Começamos hoje introduzindo o conceito e pormenorizando o manejo da dor:
O eCASH segue os seguintes princípios:
- Ênfase na implementação precoce. O tempo de início do protocolo é o conceito central na abordagem, seguindo a máxima: “quanto mais cedo nos preocuparmos com a sedação, melhores serão os desfechos”;
- Generalização: Trata-se de um protocolo aplicável a todos os pacientes críticos;
- Promoção e facilitação do cuidado centrado no paciente.
Com a implementação do eCASH, se a analgesia e sedação leve não resultarem em um paciente calmo e cooperativo, a causa da falha deve ser identificada e corrigida, antes de considerarmos a sedação profunda.
- Manejo da Dor:
Uma abordagem sistemática antecipando a necessidade analgésica do paciente e optando pela estratégia ideal para cada, conforme exposto na tabela abaixo:
Tipo de Dor | Abordagem | Principais Drogas |
Portadores de síndromes de dor crônica | Manter medicamentos de uso crônico | Gabapentina, Pregabalina, Amitriptilina |
Dependência de opioides | Manter ou iniciar agente de ação prolongada | Metadona |
Considerar poupador de opioide | Paracetamol | |
Dor relacionada à doença aguda: Trauma musculoesquelético; Cirurgia; Dor visceral ou inflamatória | Opioide intermitente ou contínuo (analgesia controlada pelo paciente) | Quetamina |
Considerar poupador de opioide e analgésicos adjuvantes | Paracetamol | |
Agentes analgésicos e sedativos | Dexmedetomidina | |
Dor relacionada ao cuidado intensivo (tolerância ao tubo endotraqueal, ventilação mecânica, decúbito, rigidez articular) | Opioide intermitente ou contínuo | Quetamina |
Poupador de opioide e outros agentes anago-sedativos | Dexmedetomidina | |
Dor relacionada a procedimento (inserção de dreno, fisioterapia, traqueostomia) | Bolus de opioide + Anestesia local |
Como observado na tabela acima, o uso de opioides continua sendo o ponto central da abordagem. No entanto, deve-se considerar sempre o uso das menores doses efetivas e a introdução de medicamentos poupadores e de analgesia adjuvante, para diminuir a carga de opioides e seus efeitos adversos. Pacientes com necessidade crescente de opioides podem receber baixa dose de quetamina ou dexmedetomidina para diminuir a necessidade da droga. Lembrando que, a quetamina em dose baixa apresenta como principal efeito analgesia
O manejo da dor deve ser contínuo durante a estadia no CTI e correto monitoramento da dor deve ser realizado. Em pacientes conscientes, pode-se utilizar uma escala numérica simples para quantificar e acompanhar evolutivamente a dor. Em pacientes inconscientes ou com sequela neurológica, escalas como a Behavioral Pain Scale (BPS) e a Critical-Care Pain Observation Tool (CPOT) podem ser utilizadas.
Fiquem de olho em nossa próxima postagem, detalhando o manejo da sedação dentro do eCASH.
Leia também: eCASH: Atualização em Analgesia e Sedação (Parte 2)
Referências Bibliográficas:
- Jean-Louis Vincent et al. Comfort and patient-centred care without excessive sedation: the eCASH concept. Intensive Care Med (2016) 42:962–971. DOI: 10.1007/s00134-016-4297-4.
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.