Na cobertura do 18° Congresso Brasileiro de Clínica Médica, realizado em Olinda/PE, entre 09 e 11 de outubro de 2025, destacamos o “Round Clínico: Hemato em Foco”, moderado pela Dra. Amanda Mota.
O Dr. José Luiz Bonamigo Filho, médico hematologista e supervisor do programa de residência em Clínica Médica do Hospital Israelita Albert Einstein, nos presenteou com a palestra: “Sangrei usando anticoagulante oral, e agora?”.
O histórico recente da terapia anticoagulante foi retomado:
- Hirudina: isolada de sanguessugas em 1884, utilizada empiricamente no século XIX, mas sem uso clínico amplo somente no final do século XX.
- Heparina: descoberta em 1916 por Jay McLean, com uso clínico estabelecido a partir de 1930.
- Antagonistas da vitamina K: dicumarol foi identificado em 1939 e usado clinicamente em 1941; a varfarina foi sintetizada em 1944 e aprovada para uso humano em 1954. A varfarina ainda tem seu nicho preservado em condições de risco trombótico muito elevado, como a fibrilação atrial valvar e síndrome antifosfolípides.
- Heparinas de baixo peso molecular (HBPM): desenvolvidas na década de 1980, com uso clínico difundido a partir dos anos 1990.
- Fondaparinux: pentassacarídeo sintético aprovado em 2001.
- Inibidores diretos da trombina (dabigatrana): dabigatrana foi aprovada pela FDA em 2010.
- Inibidores do fator Xa: rivaroxabana foi aprovada pela FDA em 2011, apixabana em 2012 e edoxabana em 2014.
- Novos inibidores de FXIa/FXIIa: em desenvolvimento clínico desde 2020, ainda não disponíveis para uso clínico amplo.
Uma das referências indicadas para consultas foi o site do North American Thrombosis Forum (NATF), que resume as indicações aprovadas de cada uma dos anticoagulantes orais de ação direta (DOACs), as apresentações disponíveis e os agentes de reversão indicados.
https://thrombosis.org/healthcare-professionals/resource-center/anticoagulant-comparison-chart
Nos sangramentos menores, a conduta mais aceita é aguardar o decaimento do nível sérico da droga e a adoção de medidas suportivas e hemostáticas locais. Entretanto, para sangramentos graves ameaçadores à vida os antídotos são indicados:
- Varfarina: complexo protrombínico ativado de 4 fatores (alternativas são o plasma fresco congelado e a vitamina K, sendo que a utilidade da última é muito limitada pelo tempo médio de 5 dias que leva para mobilizar a produção hepática de fatores de coagulação);
- Dabigatrana: Idarucizumabe;
- Apixabana e Rivaroxabana: Andexanet alfa.
Por exceção do plasma fresco congelado, os demais agentes de reversão têm disponibilidade limitada no Brasil, sendo mais comum a presença, em alguns hospitais, do complexo protrombínico ativado. Dessa forma, o anticoagulante varfarina é aquele que dispõem de métodos de reversão mais disseminados, o que traz uma maior segurança nesse aspecto.
Em casos de sangramento maior em usuários de DOACs, na ausência de agentes de reversão específicos e considerando a relação custo-benefício questionável, o complexo protrombínico ativado ou complexo protrombínico de 4 fatores pode ser considerado para reversão do efeito anticoagulante, com evidências de eficácia hemostática semelhante à dos agentes específicos, com possível menor risco de eventos tromboembólicos em relação ao andexanet alfa.
O plasma fresco congelado é menos eficaz e não é recomendado rotineiramente para reversão de DOACs, pois não repõe adequadamente os fatores inibidos e não há evidência robusta de benefício. Da mesma forma, o ácido tranexâmico não tem benefício comprovado para reversão de sangramento grave relacionado a DOACs e pode aumentar o risco trombótico, especialmente em sangramento gastrointestinal, de forma que o seu uso não é recomendado rotineiramente nesse contexto.
Conclusão e Mensagens práticas
- A revolução da terapia anticoagulante que temos testemunhado nos últimos anos tem facilitado o cotidiano dos médicos prescritores. Os riscos da anticoagulação não deve ser negligenciado: o risco de sangramento com DOACs é cerca de 40% menor do que com a varfarina nas populações recrutadas nos estudos pivotais. Entretanto, sangramentos graves ainda são possíveis e preocupantes. Ademais, deve-se manter atenção às interações medicamentosas dos DOACs, a exemplo da amiodarona, claritromicina, inibidores seletivos da recaptação de serotonina e anticonvulsivantes, por exemplo. A capacidade de mensurar os efeitos da varfarina por meio do RNI e a maior disponibilidade dos métodos de reversão para esse fármaco ainda são grandes vantagens.
Confira a cobertura completa do Congresso Brasileiro de Clínica Médica 2025!
Autoria

Leandro Lima
Editor de Clínica Médica da Afya ⦁ Residência em Clínica Médica (2016) e Gastroenterologia (2018) pelo Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG) ⦁ Residência em Endoscopia digestiva pelo HU-UFJF (2019) ⦁ Preceptor do Serviço de Medicina Interna do HU-UFJF (2019) ⦁ Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)
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