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Clínica Médica24 setembro 2025

Adoçantes não nutritivos (ANN) e seu impacto na microbiota humana

Revisão 2025 mostra que adoçantes não nutritivos podem alterar microbiota intestinal, com impacto variável no metabolismo.

Os adoçantes não nutritivos (ANN) também chamados de adoçantes não calóricos (ANC) dão sabor doce a alimentos e bebidas sem acrescentar calorias e sem provocar picos glicêmicos. Por isso, costumam ser considerados aliados em dietas de restrição calórica e no controle de peso. 

Por outro lado, o consumo crescente de produtos com ANN tem sido associado a síndrome metabólica e a outras doenças crônicas. Uma síntese recente de ensaios clínicos randomizados indica que, quando comparados a adoçantes calóricos (p. ex., açúcar), os ANN se relacionam a pequena perda ponderal de curto prazo (−0,14 kg/m²; baixa certeza da evidência) e nenhuma alteração mensurável para melhor ou pior na composição corporal, pressão arterial, perfil lipídico e marcadores de diabetes tipo 2. 

Em 2025, uma revisão publicada na Immunometabolism reuniu o que se sabe até aqui sobre como os ANN podem afetar a saúde por meio da modulação do microbioma intestinal. 

Veja também: Adoçante pode aumentar o risco cardiovascular?

Métodos 

Trata-se de uma revisão de estudos em humanos, combinando ensaios intervencionais e observacionais que avaliaram ANN, microbioma e desfechos cardiometabólicos. Os autores também consideraram experimentos ex vivo com comunidades microbianas derivadas do intestino humano expostas a ANN. 

Foram compiladas evidências publicadas até 2024 contemplando diferentes adoçantes (sacarina, sucralose, aspartame, acesulfame-potássio, estévia, entre outros). 

Resultados 

Foram identificados nove ensaios com 14 braços de intervenção desta revisão, o N variou de 7 a 27 (média de 16,6 participantes por braço). O panorama é heterogêneo: oito braços detectaram mudanças na microbiota após o uso de ANN; um encontrou efeito limitado; cinco não observaram diferenças relevantes. 

Comparando sacarina, sucralose e estévia, não houve consenso quanto ao efeito de cada composto sobre o microbioma. Ainda assim, a direção dos achados metabólicos e microbianos caminhou, em geral, lado a lado: em três braços houve alteração da homeostase da glicose; em três, verificou-se correlação entre microbioma e parâmetros metabólicos; um estudo descreveu mudanças de expressão em vias inflamatórias do tecido adiposo; outro não reportou desfechos metabólicos além do peso, que não mudou de forma significativa. 

Sete estudos coorte/transversais sugerem que o uso regular de ANN se associa a mudanças de composição microbiana e a maior frequência de síndrome metabólica, HbA1c elevada e alterações de enzimas hepáticas. Em alguns trabalhos, consumidores de ANN apresentaram assinaturas taxonômicas distintas, com maior prevalência de Proteobacteria e de Enterobacteriaceae/Escherichia sobretudo E. coli em grupos com diabetes tipo 2. 

Modelos com microbiota fecal humana cultivada em biorreatores (ambiente que tenta mimetizar o intestino) reforçam parte do quadro: há estudos relatando aumento de Enterobacteriaceae e, em vários casos, elevação de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) acetato, propionato e butirato embora esse último achado oscile entre trabalhos. 

Convém temperar a leitura: são sistemas artificiais, sujeitos a diferenças de dose, meio de cultivo, pH e fluxo de metabólitos, além da ausência do hospedeiro (sem o qual parte do crosstalkmicrobiano não aparece). Mesmo assim, esses modelos ajudam a explicar mecanismos e dialogam com observações em humanos. 

Considerações 

O conjunto das evidências humanas, observacionais e pré-clínicas aponta que ANN podem alterar a microbiota intestinal; se isso ajuda ou atrapalha o metabolismo depende do contexto. Muitos ensaios foram pequenos (27 participantes), de curta duração (1–12 semanas) e incluíram usuários habituais de adoçantes, o que pode diluir efeitos. Em estudos que excluíram consumidores regulares, as mudanças microbianas tendem a ser mais nítidas. 

Não parece haver um culpado únicopor tipo de adoçante. O efeito varia conforme dose, padrão alimentar, tempo de uso e, sobretudo, o perfil individual do microbioma. Dada essa variabilidade, faz sentido individualizar a recomendação: considerar composição e função da microbiota e o estado metabólico do paciente. Existem ainda hipóteses de modulação de paladar e de vias neurometabólicas pelos ANN; são plausíveis, mas carecem de confirmação. 

Conclusão e mensagem prática 

Em resumo: os ANN podem modificar a microbiota intestinal em humanos, porém os resultados são irregulares e sensíveis ao desenho do estudo, à dose, à forma de apresentação (sachê, gota, cápsula) e ao microbioma de base. Em linhas gerais, quando não há efeito microbiano detectável, tampouco se veem pioras metabólicas; já em observacionais, consumidores habituais aparecem com HbA1c e enzimas hepáticas mais altas com maior frequência. 

A OMS atualmente não recomenda ANN para perda de peso ou prevenção de doenças. Até que surjam ensaios maiores e mais longos, a prática mais sensata é a moderação, avaliação caso a caso e atenção ao padrão alimentar e a sintomas gastrointestinais. 

É importante ressaltar também a quantidade reduzida de estudos que foram analisados, sendo necessários novos comparativos com uma amostra maior para mais embasamento. Para o futuro, o ideal são estudos robustos, com estratificação por microbiota e por exposição prévia/prolongada, para sabermos quem se beneficia e quem se prejudica abrindo espaço a recomendações personalizadas em vez de diretrizes genéricas.  

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Referências bibliográficas

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